Abegás se retira do Programa “Gás para Crescer”
Maurício Corrêa, de Brasília —
A temperatura ferveu no Programa “Gás para Crescer”, uma iniciativa do Ministério de Minas e Energia que vem sendo tocada em conjunto com várias associações empresariais com interesse na área de gás natural. Na segunda-feira passada, dia 17 de abril, o presidente executivo da Associação Brasileira das Empresas Distribuidoras de Gás Canalizado (Abegás), Augusto Salomon, encaminhou um seco comunicado a dirigentes de sete outras associações e de algumas empresas, informando que “por não concordarmos com as propostas e a forma com que os trabalhos estão sendo desenvolvidos no âmbito dos subcomitês”, a Abegás estava se desligando do programa.
Nesta quinta-feira, este site entrou em contato com Salomon, mas ele não quis detalhar as razões pelas quais a Abegás deixou o “Gás para Crescer”. “Simplesmente não concordamos com algumas coisas que estão sendo feitas no “Gás para Crescer”. Conversei com o ministro Fernando Coelho Filho e disse que vamos entregar as nossas propostas diretamente para ele”, limitou-se a dizer Salomon. Através de outras fontes, o “Paranoá Energia” identificou que a Abegás se sentiu isolada no âmbito do Subcomitê de Distribuição, onde todos os demais participantes se uniram para detonar os argumentos dos distribuidores de gás canalizado.
Curiosamente, nesta quinta-feira, o relatório que a Abraceel semanalmente distribui aos seus associados, ao qual este site teve acesso através de uma outra associação, praticamente comemorou o desligamento da Abegás do Programa “Gás para Crescer”. “Saída da Abegás do Gás para Crescer une setor” foi o título de uma nota do relatório dos comercializadores, esclarecendo que houve uma reunião nesta terça-feira, com o secretário de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis do MME, Márcio Félix, além da diretora do Departamento de Gás Natural, Symone Araújo, e do coordenador-geral de Processamento, Infraestrutura e Logística, Aldo Barroso.
Também participaram representantes de nove organizações empresariais (Abraceel, Abiape, Abrace, Anace, Abiquim, Apine, Abraget, CNI e IBP), além da Petrobras. “Tendo como pano de fundo a saída da Abegás do projeto Gás para Crescer, o objetivo do encontro com o secretário Márcio Félix foi apresentar o apoio das instituições ao programa Gás para Crescer do MME e a forma democrática e transparente em que são promovidas as discussões, demonstrando a grande convergência dos diversos segmentos da indústria do gás nas propostas para a alteração do modelo setorial”, diz o relatório da associação dos comercializadores.
Augusto Salomon também preferiu não fazer comentários sobre o texto do relatório da Abraceel. Mais à frente, a Abraceel salientou que “na visão das instituições, as mudanças em discussão para o setor de gás são fundamentais para desenvolver o mercado e atrair novos investimentos para o setor, dando maior competitividade à indústria e gerando emprego e renda para o país. O secretário Márcio Félix agradeceu o apoio ao programa Gás para Crescer e destacou a janela de oportunidades para promover as alterações no setor de gás, cuja implementação dependerá de mudanças na legislação em vigor”.
A próxima reunião do Comitê Técnico para o Desenvolvimento da Indústria do Gás Natural no Brasil está marcada para o dia 10 de maio, mas, até lá, deverá reverberar a iniciativa tomada pela Abegás. De qualquer forma, o MME tem uma situação complicada para arbitrar, pois não se pode ignorar o poder político da associação dos distribuidores de gás canalizado. No atual arcabouço legal do gás, as empresas de gás canalizado são estaduais, enquanto a regulação é federal.
Como têm apoio dos respectivos governos estaduais, essas empresas vinculadas à Abegás também contam com expressivo apoio de deputados federais e senadores. A questão é simples e esbarra na lei número um da política: ninguém que seja eleito trabalha contra os interesses do próprio estado. Uma fonte lembrou a este site que o Governo Federal, que necessita desesperadamente de votos no âmbito do Congresso, precisará de muita habilidade política para contornar os eventuais choques com o MME envolvendo envolvendo os interesses da empresas vinculadas à Abegás.
A questão da comercialização do gás natural, na futura arquitetura do modelo de GN para o Brasil, é onde as divergências estão pegando. Na visão da Abegás, a comercialização faz parte das legislações estaduais que regem o segmento do gás canalizado, enquanto no entendimento das demais entidades que participam do “Gás para Crescer”, esse item é integralmente de responsabilidade do Governo Federal.
Da mesma forma que a Abegás tinha sido indicada para coordenar o Subcomitê de Distribuição, à Abraceel coube a tarefa de coordenar o Subcomitê de Comercialização do “Gás para Crescer”. No mesmo grupo, a Abiape (associação dos autoprodutores de energia elétrica) tem atuado como relator. Nesse subcomitê, houve dois ambientes a serem avaliados pelos integrantes: 1. a arquitetura de mercado; 2. a questão da competitividade.
Nesse sentido, todas as associações (mais a Petrobras), que se posicionaram contrariamente à Abegás, têm defendido a formação de um mercado livre e nacional de gás natural, compreendendo inclusive uma entidade independente para efetuar a liquidação das diferenças e mecanismos para a formação de preços. Nesse contexto, surgiria uma entidade neutra, que reuniria características que hoje são desempenhadas, no setor elétrico, pelo ONS e pela CCEE. Logicamente, esses itens tiram poder de fogo da Abegás e das empresas estaduais de gás canalizado.