Senado debate uso do “fracking”
Da Redação, de Brasília (com apoio da Coesus/350.org) —
Desdenhados pelas autoridades federais e pelas associações empresariais, os ambientalistas que trabalham há anos contra a adoção da tecnologia conhecida como “fracking” romperam os seus próprios limites — que até agora eram praticamente estaduais, fizeram um gol de bicicleta e levaram a discussão sobre o tema para dentro do Congresso Nacional.
“Estamos falando de uma ameaça ao futuro do Brasil”. Foi desta forma que o fundador da Coalizão Não Fracking Brasil, Juliano Bueno de Araújo, colocou a técnica de fraturamento hidráulico (fracking) em pauta durante uma audiência pública sobre os impactos da exploração de gás de xisto no Brasil, promovida pelas comissões de Agricultura e Reforma Agrária e do Meio Ambiente do Senado Federal, nesta quarta-feira, 14 de agosto, em Brasília.
A reunião, presidida pela senadora Soraya Thronicke (PSL), contou com a participação de diversas autoridades, inclusive uma senadora do Uruguai, Carol Aviaga, a qual apontou o “fracking” como um dos maiores problemas em pauta no Uruguai e em diversos outros países atualmente, visto que as áreas disponíveis para leilão geralmente não contam com transparência por parte dos governos e empresas.
“Esta é uma forma corrupta de conceder nosso território. Temos uma matriz produtiva muito rica, uma cultura agropecuária, uma cultura de trabalhar a terra que é a base de nossa economia”, ressaltou Carol.
O “fracking” é uma técnica utilizada para a extração de gás de xisto, porém é vista por muitos como um método atrasado – visto que degrada o solo, a água e causa diversos impactos negativos na saúde e no meio ambiente. “Precisamos contar com uma percepção de mercado ao analisar todos esses danos. Nós precisamos de qualidade de vida, segurança alimentar. Não há necessidade de termos mais um risco à agricultura e ao meio ambiente brasileiro”, explica Araújo.
O diretor da Coesus, inclusive, destacou a insegurança da população brasileira acerca desses problemas, que hoje são acompanhados em países como Estados Unidos e Argentina. “A cada 10 mil operações de fraturamento hidráulico nos Estados Unidos, 4 mil apresentam severos danos ambientais. Portanto, aceitar isso dentro do nosso território, é algo que já dissemos não há seis anos”.
Neste caso, Araújo cita o tempo em que vem trabalhando em conjunto com a Coesus em busca de banir o “fracking “no País. A Campanha Não Fracking Brasil foi iniciada em 2013, com parceria da 350.org Brasil e do Instituto Internacional Arayara, e passou por mais de 18 estados para levar informações sobre o método à população. Recentemente, a campanha alcançou duas grandes vitórias, com a sanção de leis estaduais proibitivas no Paraná e em Santa Catarina – fatos que foram amplamente discutidos e celebrados durante as discussões no Plenário.
O deputado federal José Carlos Schiavinato acompanhou as exposições e ressaltou que tem a “obrigação, como paranaense e brasileiro, de ajudar o País”. Schiavinato foi um dos autores do projeto de lei nº 873/2015 que, ao ser sancionado, em 2016, estabeleceu uma moratória que proibiu a exploração de gás de xisto por meio do fraturamento hidráulico no Paraná durante 10 anos. A moratória foi substituída pela lei de proibição total, de autoria do deputado estadual Evandro Araújo, também presente no debate. Schiavinato é autor do projeto que tramita desde abril na Câmara Federal que visa proibir a técnica a nível federal.
A Constituição também entrou em debate, visto que, para o consultor para políticas públicas, iniciativas de desenvolvimento sustentável e diretor interino da 350.org Brasil, Rubens Harry Born, defender o solo, os recursos naturais, garantir a qualidade da água e prevenir riscos à saúde da população são deveres do Poder Público estabelecidos na Constituição Federal.
“Proibir o fracking no País é, consequentemente, um ato mandatório para cumprir o dever constitucional de precaução e prevenção de riscos à vida, à qualidade de vida e ao meio ambiente”, reforçou. A constatação de Born se dá, pois, a prática do faturamento hidráulico e suas consequências poderia violar o Art. 170, de que a ordem econômica deve observar a defesa do meio ambiente; o Art. 196, do dever do Estado de adotar políticas econômicas e sociais para redução do risco de doenças, e o Art. 225, sobre o direito ao meio ambiente equilibrado, essencial à sadia qualidade de vida.
A discussão foi vista pelos 11 expositores como um ato de responsabilidade do Senado Federal e deve seguir em pauta pelos próximos meses, visto que a sessão abordou a possibilidade de uma lei nacional para a proibição do “fracking” – permeando a conversa dos especialistas e parlamentares em diversos momentos. Ao encerrar a mesa, a senadora Soraya frisou que o próximo passo é ouvir o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, sobre a questão.