Câmara quer ampliar benefícios do varejista
Da Redação, de Brasília (com apoio da CCEE) —
Em discussão com a sociedade na Consulta Pública nº 76/19, o comercializador varejista é a principal figura para o crescimento organizado do mercado livre na visão da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica – CCEE. Durante o 16º Encontro Nacional de Agentes do Setor Elétrico – Enase, a vice-presidente do Conselho de Administração da instituição, Solange David, destacou as vantagens para os consumidores e a tendência de expansão das negociações neste segmento de comercialização.
Com 15 empresas habilitadas para representação varejista na Câmara de Comercialização, a atuação destes players ainda é tímida. São 130 ativos representados, sendo 109 de consumo e 21 de geração, representando 92,6 MW e 418,6 MW, respectivamente. No entanto, após estudo de modelos internacionais e a percepção de erros operacionais nos últimos anos, a CCEE apresentou uma nota técnica recomendando a obrigatoriedade de cargas abaixo de 1 MW estarem no mercado sob os varejistas.
“Queremos oferecer as vantagens econômicas do mercado livre para os consumidores e manter a simplicidade de operação que eles já estão acostumados no mercado regulado. O aumento de penalidades e processos de desligamento de pequenos consumidores nos últimos anos demonstra a dificuldade de atuação direta”, ressaltou Solange, que apresentou dados demonstrando que 5.700 consumidores já são representados por comercializadoras ou varejistas.
Em 2019, já foram instaurados 80 processos de desligamento de consumidores especiais por inadimplência, sendo muitas delas por erros operacionais. 35% dos casos, por exemplo, foram empresas que não pagaram valores até R$ 3 mil. Na última reunião do Conselho de Administração da CCEE, foram deliberadas as aberturas de 35 processos de desligamento por inadimplência.
Para fortalecer a atuação do varejista, a CCEE propõe o estabelecimento do fornecedor de última instância, que atenderia os consumidores no caso de problemas financeiros dos varejistas e durante o processo de desligamento no caso de rompimento de contrato. A instituição também vislumbra novas oportunidades de negócio como a criação do agregador de dados de medição.
Tendência de crescimento
Em julho de 2019, a CCEE registrou 6.492 agentes na categoria de consumo, que representam 12.061 cargas de consumidores especiais e 2.272 cargas de consumidores livres. Com média de 111 migrações por mês no ano, há um aumento de 63% em relação à média do ano passado. Alinhada com essa tendência, 344 cargas já foram beneficiadas com a redução dos requisitos estabelecida pela Portaria 514/18, sendo que mais 510 cargas modeladas na Câmara de Comercialização passarão a ser livres em janeiro de 2020.
“Ao deixar de ser consumidor especial e ser classificado como consumidor livre, estes consumidores têm mais liberdade na contratação de energia, uma vez que podem comprar qualquer tipo de energia. Antes eles estavam limitados a energia incentivada”, destaca Solange.
O crescimento constante do mercado livre impulsionado pelos consumidores especiais sempre desperta a preocupação com a oferta de energia incentivada para atender a demanda. Em fase final do estudo sobre a disponibilidade deste tipo de energia, a CCEE apresentou uma prévia do montante disponível para os próximos meses.
Após a realização das rodadas do Mecanismo de Venda de Excedentes – MVE e de outros mecanismos de descontratação, houve um aumento de 49% de energia incentivada desde o último levantamento realizado pela CCEE. Estima-se o excedente de 320 MW médios para negociação em 2019.
Modernização da comercialização de energia elétrica
Na abertura do Enase, a CCEE destacou a importância de avançar em temas regulatórios para atrair investidores e mitigar o aumento de custos ao consumidor.
O presidente do Conselho de Administração, Rui Altieri, assinalou que a prioridade da Câmara ainda é a solução do risco hidrológico no mercado livre, que mantém cerca de R$ 7 bilhões em aberto na judicialização do GSF. Enquanto aguarda o desdobramento da análise do projeto de lei que tramita no Senado, a instituição propõe que o setor elétrico se atente a seis questões cruciais para a evolução do segmento.
O primeiro passo na modernização da comercialização de energia está no fortalecimento da figura do varejista, que ainda tem pouca representatividade no mercado. Altieri enfatizou a importância de delimitar a fronteira entre o atacado e o varejo com a obrigatoriedade de cargas com demanda abaixo de 1 MW serem representadas por estes players de mercado.
“O objetivo da CCEE é dar liberdade para o consumidor, mas sem impactá-lo com a complexidade do setor elétrico. O varejista garante às empresas a simplicidade operacional do mercado regulado com o benefício econômico do mercado livre. Também temos que discutir de forma estruturada os custos, a alocação de riscos e os benefícios”, ressaltou o presidente do Conselho de Administração.
Na sequência, Altieri demonstrou os impactos financeiros que usinas térmicas contratadas nos primeiros leilões provocam ao consumidor. Exemplos demonstraram operações com CVUs de até R$ 1.670, enquanto há novas usinas trabalhando com CVU de R$ 198. Como os contratos de 32 empreendimentos terminam em 2023, há uma janela de oportunidades para contratação de projetos modernos e mais econômicos, revitalizando a matriz elétrica.
A terceira adequação fundamental para curto e médio prazo é o aprimoramento do Mecanismo de Realocação de Energia – MRE. Coordenando uma das frentes do Grupo de Trabalho de Modernização do Setor Elétrico, instituído pelo Ministério de Minas e Energia, a CCEE propôs no Enase do ano passado a aplicação eficaz do saneamento do risco hidrológico, que consiste na desconsideração da Geração Fora da Ordem de Mérito, da importação de energia, do atraso das linhas de transmissão e da antecipação das garantias físicas dos projetos estruturantes.
A instituição trouxe para discussão na edição deste mais um elemento na adequação do MRE: a energia de reserva. Estudo realizado pela CCEE, em parceria com a EPE, indica que os contratos oriundos deste tipo de leilão provocam um deslocamento de cerca de 5% do GSF. Somados com a interferência dos outros quatros fatores exógenos ao risco hidrológico, há uma diferença de 8% nos índices do mecanismo.
“Temos que tratar a questão da energia de reserva no MRE. Não é um deslocamento provocado pelo tipo de fonte, mas pelo tipo de contrato. Nossa sugestão é que este montante de energia seja gradualmente transformado em contratação que dá lastro para distribuidoras. Isso aconteceria lentamente para garantir a expansão do parque gerador”, explica Altieri.
O quarto tópico da apresentação da CCEE foi a contratação de energia pelas distribuidoras. A ausência de gestão do portfólio por parte destas empresas lhe confere um caráter de sorte na participação de leilões. Para piorar, o modelo de contratação provoca exposições financeiras volumosas em decorrência da diferença de submercado, por exemplo. No primeiro semestre de 2019, por exemplo, as distribuidoras já arcaram com R$ 3,6 bilhões em exposições negativas.
Por fim, dois itens debatidos frequentemente pela CCEE concluíram as prioridades da instituição para modernização da comercialização: a formação de preço e aprimoramentos de mercado, como a chamada de margem semanal. Altieri destacou a importância de os agentes debaterem as propostas que estão na mesa e aproveitarem o período de operação sombra do preço horário para analisarem os impactos e prepararem suas estratégias comerciais e operacionais