O setor elétrico pede licença
Luísa Braga Cançado Ferreira (*)
O Brasil precisa de reformas estruturantes e urgentes para atrair investimentos e retomar o caminho do crescimento. Uma dessas reformas diz respeito ao licenciamento ambiental de empreendimentos do setor elétrico.
Atualmente os processos de licenciamento de obras estratégicas para o país – como usinas hidrelétricas e linhas de transmissão de energia – são penalizados com excessiva burocracia, regras pouco transparentes, diálogos ideológicos e condicionantes abusivas.
Essas dificuldades e riscos ambientais ocasionam a morosidade da emissão de licenças, geram atrasos nos cronogramas de implantação dos empreendimentos e prejuízos ao planejamento setorial. Também contribuem para o aumento não previsto de custos que oneram a concessão e impactam a viabilidade econômico-financeira dos projetos, levando à deterioração do ambiente de negócios. Na ponta, vemos a matriz elétrica brasileira, o preço da eletricidade e a competitividade da indústria serem profundamente afetados.
Para ganhar mais objetividade e tecnicidade, é necessário que o licenciamento ambiental seja conduzido a partir de regras mais claras e estáveis e esteja focado na melhoria da performance ambiental dos projetos. É igualmente importante que as salvaguardas ambientais sejam antecipadas para a fase de planejamento, de modo que as decisões de Governo sejam tomadas tempestivamente.
Não por outras razões, tramitam no Congresso Nacional e no Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama) iniciativas para reformular o licenciamento ambiental federal. As principais são:
* Projeto de Lei no 3729/2004 – “Dispõe sobre o licenciamento ambiental, regulamenta o inciso IV do § 1º do art. 225 da Constituição Federal, e dá outras providências”. De autoria do Deputado Luciano Zica e outros, atualmente encontra- se na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados sob a relatoria do Deputado Mauro Pereira.
* Projeto de Lei do Senado no 654/2015 – “Dispõe sobre o procedimento de licenciamento ambiental especial para empreendimentos de infraestrutura considerados estratégicos e de interesse nacional.”. De autoria do Senador Romero Jucá, atualmente encontra-se na Comissão Especial sob a relatoria do Senador Blairo Maggi.
* Projeto de Lei do Senado no 602/2015 – “Dispõe sobre a criação do Balcão Único de Licenciamento Ambiental, estabelece procedimento para o processo de licenciamento ambiental dos empreendimentos considerados estratégicos e prioritários para o Estado e dá outras providências.” De autoria do Senador Delcídio do Amaral, atualmente encontra-se na Comissão de Infraestrutura do Senado Federal sob a relatoria do Senador Flexa Ribeiro.
* Projeto de Lei do Senado no 603/2015 – “Disciplina o licenciamento ambiental dos aproveitamentos de potenciais hidroenergéticos considerados estratégicos e estruturantes e dá outras providências.” De autoria do Senador Delcídio do Amaral, atualmente encontra-se na Comissão de Infraestrutura do Senado Federal sob a relatoria do Senador Fernando Bezerra Coelho.
* Proposta Conama para revisão das Resoluções 01/86 e 237/97 – “Dispõe sobre os critérios gerais para o licenciamento ambiental, disciplina suas modalidades, estudos ambientais, bem como seus procedimentos, e dá outras providências.” De autoria da Associação Brasileira de Entidades Estaduais de Meio Ambiente (Abema), atualmente é apreciada na Câmara Técnica de Controle Ambiental do Conama, da qual fazem parte representantes do Governo Federal, dos Governos Estaduais, dos Governos Municipais, das Entidades Empresariais e das Entidades de Trabalhadores e da Sociedade Civil.
Nesse contexto, chama atenção a “Proposta da Indústria para o Aprimoramento do Licenciamento Ambiental: Setor Elétrico”, que a Confederação Nacional da Indústria (CNI) e o Fórum de Meio Ambiente do Setor Elétrico (Fmase) entregaram a representantes do Governo Federal em dezembro de 2015.
O documento analisa os principais desafios para a viabilização de hidrelétricas no Brasil e elenca 19 propostas de solução, refletindo os principais pleitos do setor elétrico para o licenciamento ambiental dessa tipologia de empreendimento. Merecem destaque as seguintes sugestões:
1. Elaboração e integração das ferramentas de planejamento pelo Poder Público antes do início do processo de licenciamento ambiental, sendo utilizadas como “inputs” ao processo, e não requisitos obrigatórios dele.
2. Atuação prévia do Poder Público nas áreas onde serão implantadas as hidrelétricas, para o atendimento das necessidades básicas da população, capacitação da mão de obra existente e preparo da comunidade.
3. Destinação obrigatória de parcela da Compensação Financeira por Uso dos Recursos Hídricos em ações socioambientais, para garantir a manutenção das obras e dos serviços implantados pelo concessionário de energia.
4. Fast-track para licenciamento ambiental de projetos considerados estratégicos e estruturantes para o país.
5. Criação de um balcão único virtual de licenciamento para reunir todos os entes envolvidos, a ser coordenado pelo órgão licenciador, responsável por emitir pareceres e manifestações únicos sobre os estudos e documentos apresentados.
6. Obrigatoriedade de realização de EIA/Rima apenas para as hidrelétricas cuja capacidade instalada seja superior a 50 MW.
7. Regulamentação das regras que tratam das Certidões Municipais, para que se limitem a informar se a implantação dos empreendimentos está ou não em conformidade com a legislação de uso e ocupação do solo e para que sejam apresentadas somente quando da emissão da primeira licença ambiental.
8. Elaboração de Termos de Referência para os estudos ambientais padronizados, de conteúdo mínimo e por tipologia de empreendimento, a serem refinados em cada caso concreto.
9. Obrigatoriedade de as condicionantes ambientais guardarem relação direta com os impactos verificados nos estudos ambientais, devendo ser acompanhadas de justificativa técnica.
10. Estipulação de prazos de validade (mínimos e máximos) mais elásticos para as licenças ambientais, e possibilidade de renovação automática da Licença de Operação.
Essas iniciativas – se efetivadas – poderão contribuir para superação dos gargalos do licenciamento ambiental de empreendimentos do setor elétrico, conferindo-lhe mais eficiência e qualidade, além de fortalecer as competências dos órgãos ambientais e dos órgãos intervenientes. Também irão auxiliar na questão da previsibilidade de custos e na redução da judicialização do processo de licenciamento, que se tornou cada vez mais comum, mas pouco contribui para solucionar os desafios existentes.
Com segurança jurídica e financeira, haverá mais condições para assegurar a otimização do binômio modicidade tarifária e confiabilidade do sistema elétrico, bem como garantir o atendimento à demanda nacional de energia, considerando o planejamento de longo, médio e curto prazos.
(*) Luisa Braga Cançado Ferreira é formada em Engenharia Ambiental e em Direito, e está concluindo o MBA Executivo pela Fundação Dom Cabral. Atualmente é Coordenadora Socioambiental na Associação Brasileira de Investidores em Autoprodução de Energia – Abiape e uma das responsáveis pela coordenação do Grupo de Trabalho Licenciamento Ambiental do Fórum de Meio Ambiente de Setor Elétrico – Fmase.