Hora de Jair rezar para São Pedro
Se a situação hídrica se agravar, o Governo precisará tomar duas decisões politicamente complicadas. Uma consistirá em aumentar os valores das contas de luz pagas pelos consumidores em geral, devido ao uso intenso da energia térmica em substituição à hidreletricidade. A outra será a constituição de uma espécie de uma nova Câmara de Gestão da Crise de Energia Elétrica, nos moldes da que existiu em 2001, para gerenciar esse momento.
Do ponto de vista de um presidente que está em franca campanha para a reeleição, embora a próxima eleição só esteja marcada para outubro de 2022, um apagão, agora, seria absolutamente desastroso.
Em primeiro lugar, devido ao inevitável aproveitamento político da situação por seus opositores. O que se pensa é o seguinte, de forma cartesiana: como um apagão no Brasil, se a economia está estagnada e a pandemia levou a forte queda no consumo de energia elétrica? O presidente Bolsonaro não precisa pensar duas vezes: isso será uma arma de campanha em 22 e será utilizado sob o rótulo de incompetência. O mesmo rótulo, aliás, que já é usado contra ele em relação à pandemia.
É bom lembrar que o PT, espertamente, demoliu o projeto político do PSDB, na campanha de 2002, utilizando a bandeira do apagão de 2001. Foi incompetência mesmo do PSDB (que botou para mandar no Ministério de Minas e Energia dois ministros do PFL, hoje, DEM, que não entendiam patavina de energia elétrica). Todo mundo sabe que o PT estava politicamente certo em aproveitar a chance na campanha. Bobo seria se não o tivesse feito.
Bolsonaro tem vários defeitos, mas é um político esperto que apenas se finge de idiota. É um populista matreiro, dotado de forte intuição. Tanto que virou presidente, embora tenha sido muito ajudado pela famosa facada que quase o matou. Ele sabe que não pode ter um apagão em seu governo, pois isso seria a mesma coisa que convidar o ex-presidente Lula para se sentar novamente na cadeira do Palácio do Planalto antes da hora da eleição.
Só que há outra situação, que também tem consequência direta na eleição pois fala sem piedade no bolso dos consumidores. Se a crise hídrica se agravar, será necessário utilizar todo o arsenal térmico construído nos últimos anos, a fim de evitar a falta de energia. A energia térmica serve exatamente para isso. Funciona como uma espécie de seguro para a energia hídrica. Faltou água no sistema, botam-se as térmicas para rodar. Só que tem consequência e isso custará muito caro. No final, será bancado pelos consumidores.
Se hoje todo mundo reclama que o Brasil tem geração barata e conta de luz cara, é possível imaginar o efeito eleitoral do uso intensivo de térmicas. O pior de tudo para Bolsonaro é que o Tesouro está quebrado, como não se cansa de dizer o ministro Paulo Guedes, e o Governo não terá caixa suficiente para subsidiar contas de luz turbinadas pela energia térmica.
O segundo problema é a tal Câmara de Gestão, da qual já se começa a falar. Em 2001, o presidente Fernando Henrique teve a sorte de ter ao seu lado no Palácio do Planalto um servidor que, naquele momento, era provavelmente o que mais conhecia o setor público no Brasil: o então ministro da Casa Civil, Pedro Parente. Sem ambição política, enérgico, preparado, trabalhador, um engenheiro qualificado e dotado de múltiplas experiências profissionais, Parente foi indicado para coordenar a Câmara de Gestão e se transformou no servidor público com maior poder de decisão que houve no Brasil, em tempos de paz.
Parente se cercou de pessoas competentes e passou por cima de todo mundo para dar eficiência à Câmara. Atropelou inclusive o então ministro de Minas e Energia, José Jorge, que era apenas um senador especialista em assuntos paroquiais da política de Pernambuco e que teve o azar de, na sua gestão, enfrentar o maior racionamento de energia elétrica que já existiu no País. Jorge, um bonachão que gostava de organizar festas para os amigos, quase infartou quando o destino lhe pregou essa peça.
Por ironia, a história se repete agora, 20 anos depois. Se houver um apagão, o MME tem como ministro um almirante sem dúvida preparado, mas que também será o homem errado no momento errado, pois é um especialista …em submarinos. Ademais, o ministro Bento sequer poderá contar com o apoio técnico da sua secretária-executiva, Marisete Dadald, que é apenas uma burocrata, cujo conhecimento maior está na parte contábil e financeira do ministério.
Ou seja, se houver um novo apagão, a cúpula do MME estará literalmente no escuro. A pergunta que não quer calar, então, é a seguinte: quem, nesse caso, será o Pedro Parente de Jair Bolsonaro? Não se pode adivinhar, até porque não existem muitas opções e o mundo político é cheio de caprichos e surpresas. Entretanto, este site se arrisca em dar um palpite e dizer que a única pessoa no Governo que se aproxime do figurino talvez seja o atual ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas.
Se indicar qualquer outro nome do primeiro escalão, um militar, por exemplo, a tendência é que será um fracasso absoluto, igual foi a atribuição dada ao general Braga Neto, no início da pandemia, para coordenar uma comissão de gestão da saúde que nunca funcionou. Braga Neto era o ministro da Casa Civil, não entendia nada de saúde pública, e fez exatamente o que já se imaginava que faria, ou seja, nada. Hoje, tem tido a sorte de hoje estar sendo poupado pela CPI do Covid.
O fato concreto é que o presidente Bolsonaro e sua equipe não têm outra opção. Precisarão descartar o apoio espiritual dos seus fanáticos apoiadores evangélicos e rezar alto e em bom som para o velho São Pedro, dos católicos, para que ele mande água em grande quantidade para este País, principalmente para as montanhas centrais de Minas Gerais, de onde ela escorre para as principais bacias que abastecem os reservatórios e que no final se transforma em energia elétrica.
O SEB promete fortes emoções nas próximas semanas.