De novo, uso político do ONS
Este site estampa duas matérias sobre posicionamentos do ONS sobre a crise hídrica que são aparentemente antagônicos, embora não o sejam.
Em um texto, o ONS revela aquilo que todos já sabem: reservatórios da região Sudeste estão em situação crítica, com pouca água devido à intensidade da seca. No outro, logo em seguida, o Operador apenas diz que não haverá racionamento e que o suprimento de energia elétrica está garantido para este ano.
O Operador não explicou porque teve que vir ao público para negar que haverá um racionamento neste ano. Este site não tem como provar, mas é possível que alguém importante na Esplanada dos Ministérios talvez tenha dado um chega prá lá no ONS e exigiu que o Operador fosse mais claro no seu posicionamento, levando-o a endossar o discurso oficial.
Esse fato é preocupante. Em primeiro lugar, porque a Nota Técnica divulgada nesta sexta-feira não falava nada sobre racionamento. Apenas alertava para a situação crítica dos reservatórios. Em segundo lugar, porque ao publicar um comunicado, logo em seguida, garantindo que não haverá racionamento, o Operador passa a impressão que está se desmentindo. Alguém na estrutura burocrática provavelmente teria sido mais realista do que o rei.
Este episódio deixa claro que, 20 anos depois do racionamento durante o Governo do PSDB, o Governo atual não aprendeu nada em relação ao ONS, que não é uma organização 100% estatal. Em 2001, foi sobretudo lamentável a forma como o Governo Federal envolveu o ONS e a Aneel em posicionamentos públicos que simplesmente não correspondiam a verdade na época. O País já marchava firme em direção ao racionamento e os responsáveis pelo ONS e a Aneel saíam de reuniões no Palácio Alvorada, com o presidente da República, garantindo à população aquilo que não podiam garantir, ou seja, que não haveria apagão. Vergonhoso, mas aconteceu.
Está claro na segunda nota, oficializada nesta sexta-feira, mas divulgada neste sábado, que o Operador fez uma ginástica mental para se adaptar ao discurso oficial da Esplanada dos Ministérios. Um posicionamento absolutamente dispensável, até porque o ONS não disse que ia faltar energia elétrica.
O que preocupa neste episódio é o uso político do ONS. Este site fica à vontade para falar sobre a questão, mesmo porque todo mundo sabe que o “Paranoá Energia” tem sido um crítico do Operador no que diz respeito ao uso de modelos computacionais na formação dos preços da energia elétrica. Mas, tirando isso, o site reconhece integralmente a qualificação do pessoal do ONS e o serviço que o Operador realiza, de altíssimo nível técnico. Poucos países no mundo tem uma operação do setor elétrico tão complexa e ao mesmo tempo tão eficiente e sofisticada quanto o Brasil.
Talvez o ONS não tenha que falar se haverá racionamento ou não. Tem apenas que executar a operação do SEB, que é a sua função institucional, e deixar para os arautos do Governo, no MME ou no Palácio do Planalto, o ônus de se manifestar se haverá crise no suprimento. O que não se pode aceitar é alguém em função política jogar essa responsabilidade para cima do ONS. Além de injusto, é uma covardia política. Coisas que normalmente acontecem quando a classe política se vê imprensada por fatos que eventualmente poderão provocar dificuldades nas urnas.