‘Safra de ventos’ dá alívio à crise hídrica
Os ventos têm indicado o caminho para que o Brasil atravesse uma das estiagens mais severas da história e drible o risco de racionamento. Entre junho e novembro, uma média de 20% do abastecimento elétrico nacional será suprido com a geração eólica. Esse volume recorde é resultado da “safra dos ventos”, como é conhecido este período do ano, quando as rajadas se tornam mais constantes e fortes, em contraposição à redução das chuvas que afeta boa parte do País. Se falta água nos reservatórios das hidrelétricas do Sudeste e Centro-Oeste, sobra vento nas costas do Rio Grande do Norte, da Bahia e do Rio Grande do Sul. É isso que tem ajudado a equilibrar a geração de energia.
No início desta semana, 16% do consumo diário de energia em todo o País foi suprido pelos parques eólicos. Os aerogeradores já chegam a alimentar o consumo de um dia inteiro da região Nordeste, como ocorreu em 22 de julho, conforme os dados do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS). A tendência é de crescimento. As estimativas apontam que, em horários de pico, as eólicas vão atender cerca de 23% do mercado total de energia do Brasil. Como o sistema de transmissão interliga todo o País, essa geração ajuda a reduzir a pressão sobre os reservatórios de hidrelétricas, que podem guardar mais água para tentar reduzir os impactos da pior crise hídrica dos últimos 91 anos.
“Atualmente, as eólicas já abastecem, em média anual, cerca de 13% da demanda de energia no Brasil e, neste segundo semestre, essa média saltará para 20% de abastecimento. E não é só no Nordeste que os recordes são registrados. Embora tenhamos cerca de 80% da capacidade instalada nessa região, o Sul do Brasil também tem uma capacidade instalada importante”, diz Elbia Gannoum, presidente da Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeólica).
Essa capacidade de colheita dos ventos é resultado dos investimentos pesados que o setor recebeu nos últimos anos. Há dez anos, a fonte eólica não passava de uma experiência dentro da matriz elétrica, com pouco mais de 900 megawatts de capacidade instalada em algumas dezenas de parques eólicos. Uma década depois, esse volume se multiplicou por 20 e já chega a 19 mil megawatts. São mais de 720 parques que, diariamente, colocam para girar 8.550 cataventos nos principais corredores de vento do território nacional.
No ano passado, o Brasil foi o terceiro país do mundo que mais ampliou sua capacidade de geração, com 2.297 megawatts adicionados, ficando só atrás da China e dos Estados Unidos. O setor recebeu cerca US$ 4 bilhões (aproximadamente R$ 21 bilhões) em investimentos em 2020. Considerado o período de 2010 a 2020, foram US$ 37,3 bilhões injetados nos parques eólicos.
“Neste período do ano, os ventos ficam mais fortes que a média, tendo um comportamento oposto às chuvas. Devido à seca, os ventos ficam mais fortes. Para produzir energia eólica, são necessários ventos estáveis, com a intensidade certa e sem mudanças bruscas de velocidade ou de direção”, diz Elbia. “O Brasil tem a sorte de ter uma quantidade enorme deste tipo de vento, o que explica o sucesso da eólica no País nos últimos anos.”