O MME e o novo Governo
A atual gestão do presidente Jair Bolsonaro termina no dia 31 de dezembro. Não há muitas hipóteses sobre o que vai acontecer depois. Ele poderá simplesmente ser reeleito ou então cederá a cadeira no Palácio do Planalto para o ex-presidente Lula. Pelo menos é o que dizem as pesquisas de opinião que vêm sendo realizadas.
É oportuno fazer uma reflexão sobre o Ministério de Minas e Energia a partir de janeiro, ganhando Bolsonaro ou ganhando Lula, principalmente depois da atual gestão do ministro Adolfo Sachsida. Este, em pouco tempo, conseguiu imprimir uma gestão diferenciada na Pasta.
Mesmo se Bolsonaro for reeleito, não há qualquer garantia que Sachsida será mantido à frente do MME. Portanto, tudo aqui é mera especulação. Jornalismo também vive de especulação, não apenas de fatos concretos.
Um ponto que sem dúvida a gestão de Sachsida deixa em aberto é que está sendo positivo ter um tecnocrata à frente do MME, mesmo não sendo um especialista de carreira do setor elétrico. O país tem tido a oportunidade de contar com uma visão diferente sobre o MME.
Embora o ministério seja de Minas e Energia, ninguém pode negar que a parte de Energia sempre prevaleceu sobre a parte de Mineração. Há poucos dias, numa demonstração muito rara nessa Pasta, Sachsida manifestou que é extremamente relevante para o País prestar mais atenção nos recursos minerais.
Em poucos meses à frente da Pasta, ele já entendeu que é possível apostar numa maior participação da Mineração no PIB brasileiro. E na sua visão sobre a área de Energia, ele, que não é originário do SEB, compreendeu rapidamente como a coisa funciona.
Sachsida foi recebido com frieza na Pasta. O SEB é altamente corporativo e sempre teve uma visão ultrapassada e atrasada de que o MME “pertence” aos engenheiros eletricistas.
Quando se olha para o passado do MME, nos últimos 50 anos, observa-se que curiosamente o MME nunca foi uma prioridade dos presidentes da República e sempre foi oferecido como moeda de troca aos políticos ou simplesmente como um presente aos amigos.
Shigeaki Ueki, que foi um bom ministro, foi indicado porque era amigo de confiança do general Geisel, com quem tinha trabalhado na Petrobras. César Cals era militar e ponto final. Aureliano Chaves era um engenheiro eletricista respeitado no SEB. Vicente Fialho, ao contrário, era um político provinciano do Nordeste quando foi indicado pelo presidente Sarney, de quem era amigo.
Pratini de Morais tinha sido um ministro jovem no regime militar e depois fez carreira política. Paulino Cícero também teve cargos na política. Alexis Stepanenko, indicado por Itamar Franco, talvez tenha sido a figura menos a vontade no Ministério de Minas e Energia. Era um professor de Sociologia, amigo de Itamar Franco em Juiz de Fora, e não entendia absolutamente nada sobre a Pasta. Quando saiu, todo mundo respirou aliviado.
No Governo FHC, quem deu as cartas no MME foi o manda-chuva da Bahia, Antônio Carlos Magalhães, que simplesmente indicava o titular da Pasta. Um deles, Raimundo Brito, foi um bom ministro.
Depois, nos governos do PT, houve uma mistura de políticos da coalizão governista ou então de especialistas do PT em energia elétrica, que souberam aparelhar a Pasta.
O ponto fora da curva foi Dilma Rousseff, que não era uma coisa e nem outra, também tinha um conhecimento bastante limitado, mas achava que entendia tudo. Não passava de uma farsante, que tinha sido secretária no Rio Grande do Sul e que nessa época não sabia a diferença entre etanol e metanol. Sabe-se lá como acabou virando presidente da República.
No Governo Temer, predominaram os políticos à frente do MME, até se chegar ao Governo Bolsonaro. Durante três anos, quem mandou na Pasta foi o almirante Bento Albuquerque, até que cedeu o espaço para Sachsida em maio deste ano. Pode-se discordar em tudo de Bolsonaro, mas ele se recusou a entregar o MME ao controle dos partidos políticos, como acontecia antes.
Sachsida é um ministro discreto e logicamente envolvido de corpo e alma no apoio ao presidente da República. Não é simples defini-lo. Tecnocrata? Professor? Advogado? Economista? Tem títulos para várias opções, mas o fato é que fez carreira no Ipea. Tentou — sem êxito, em 2014 — virar deputado distrital em Brasília (o equivalente a deputado estadual nas demais unidades da Federação).
Olavista de carteirinha, engajou-se na campanha de Jair Bolsonaro em 2018 e virou secretário de Política Econômica do Ministério da Economia. Depois foi chefe da Assessoria Especial de Assuntos Estratégicos do mesmo ministério, até se transferir para o MME com a saída de Albuquerque.
Este é o diferencial de Sachsida em relação a outros ministros. Talvez Pratini de Morais tenha tido alguma semelhança no perfil tecnocrático. É relevante notar que a experiência de Sachsida no Ministério da Economia abriu uma enorme perspectiva para ele e, quando se transfere ao MME, o ministro consegue ver a Pasta não mais como uma peça isolada no Governo, como a maioria dos seus antecessores, mas como algo muito mais amplo que se encaixa de variadas formas na estratégia global do Governo.
A sua própria visão a respeito da Mineração reflete esse ângulo mais aberto de olhar para os assuntos do MME. Sachsida não se deixa engessar pelos limites da energia elétrica, como muitos que passaram pela Pasta, e tenta enxergar um pouco mais além, vendo enorme potencial econômico nos recursos minerais. Algo, aliás, que o Brasil nunca soube explorar de forma racional, objetiva e moderna. O próprio Bolsonaro dá corda e suporte governamental numa atividade atrasada e historicamente insustentável como o garimpo. Como se diz em algumas igrejas, Deus Pai.
Portanto, escolhido o novo presidente, agora em outubro, será interessante verificar o que vai acontecer com o MME. Qualquer que seja o novo ocupante do Palácio do Planalto, não poderá desconhecer que a experiência de poucos meses de Sachsida à frente da Pasta introduziu uma diferença, que não pode ser simplesmente jogada fora. Seria um desperdício ter alguém com uma visão limitada a megawatts numa Pasta tão estratégica.