Papai Noel, o fogo amigo e o ML
A enorme quantidade de acessos ao site “Paranoá Energia”, para ler a manchete disponibilizada nesta terça-feira, 29 de novembro (“Estudo da CCEE mostra que mercado livre está desacelerando”) é uma prova inquestionável que tem muita gente preocupada com o futuro do segmento.
A matéria cita um estudo da CCEE, revelando que “entre janeiro e setembro deste ano, migraram para o mercado livre 3.064 unidades consumidoras, uma redução de 24% na comparação com o mesmo período de 2021 e um declínio de 17% frente a 2020. A instituição também nota que as cargas que têm optado por sair do segmento das distribuidoras estão cada vez menores, aproximando-se ou mesmo ficando abaixo do limite mínimo de 500 kW de demanda contratada, previsto nas regras atuais do setor”.
Ou seja, o mercado livre está devagar, quase parando, e quem está envolvido com o segmento está naturalmente preocupado com o futuro. O estudo da CCEE é um banho de água gelada no ML. É uma realidade do mercado. Não é culpa da CCEE.
O mais incrível nesta história é que trata-se de um enorme paradoxo, pois o mercado prepara-se justamente para dar aquele que talvez será o maior salto na sua história de poucos mais de 20 anos.
Passou-se da euforia à quase depressão em pouco tempo graças ao fogo amigo disparado por um executivo. O nome dessa pessoa é de conhecimento exclusivo de um jornalista, que, sendo um profissional de primeira linha, recebeu uma informação em off e respeita a confiança que lhe foi dada.
Mas as especulações comem solta e convergem para alguém que talvez não tenha tido o objetivo de detonar o mercado livre, mas que acabou, de forma desastrada, implodindo a aprovação do PL 414 no final do primeiro semestre deste ano, o que era o objeto do desejo número zero dos seus apoiadores. Esse é o verdadeiro fogo amigo. Um tiro que vem de dentro da sua própria trincheira e o atinge pelas costas.
Este site sempre apoiou a expansão do mercado livre e lamenta toda essa confusão e falta de perspectivas no ML.
Aprovar o PL 414 ainda neste ano é teoricamente possível, pois tudo no Congresso é possível desde que exista vontade política.
Mas é muito difícil, até porque já existe uma espécie de acordo entre o governo que sai e o governo que entra, no sentido que propostas estruturais não serão aprovadas no restante da atual gestão. E o PL sem dúvida é um projeto que é de natureza estrutural, pois vira o mercado de energia elétrica pelo avesso.
Isso nos leva em direção a 2023. Os defensores do ML passaram vários anos dentro do Congresso Nacional, praticamente doutrinando senadores e deputados quanto às vantagens da energia livre. Enfrentaram muita dificuldade, mas souberam vencer as resistências, convencendo com argumentos.
Em janeiro, assume um novo Congresso, com ampla renovação. Muitos dos congressistas que estavam fechados com o ML sequer foram reeleitos. Então, é necessário investir muita saliva para tentar convencer os novos deputados e senadores, muitos dos quais nem sabem que existe um mercado livre de energia elétrica.
Essa não é a principal dificuldade. As maiores resistências provavelmente estarão no prédio do Ministério de Minas e Energia, num contexto bem diferente do que tem sido nos últimos anos, mais precisamente desde o fim da gestão da presidente Dilma.
Ainda não se sabe quem será o/a ministro/a de Lula para a área, mas o fato é que só a equipe de transição já assusta os defensores do ML.
Basicamente, o grupo de transição é constituído por especialistas que passaram anos trabalhando contra o ML. Petistas de carteirinha. São filosoficamente contra a existência de mercados livres. Será enorme surpresa para o Planeta Terra caso o MME, a partir de janeiro de 2023, declare que apoia a expansão do mercado livre.
Como se as dificuldades no Congresso e as dúvidas no Executivo não fossem suficientes, agora vem esse estudo elaborado pela CCEE, que é um balde de água fria num segmento que foi tratado com muito carinho pelo ministro atual de Minas e Energia, Adolfo Sachsida.
Defensor incondicional dos mercados, Sachsida se posicionou totalmente a favor da ampliação do ML e trabalhou fortemente nessa direção. Vai deixar saudades naqueles que admiram o ML e encontram vantagens na sua adoção.
Em retrospecto, não se pode criticar aqueles que nos últimos anos, na iniciativa privada, trabalharam arduamente para criar um ambiente favorável ao mercado livre de energia elétrica. Fizeram corretamente tudo aquilo que mandava o manual.
Geraram fatos que se transformaram em notícias, ocuparam espaços na mídia, organizaram eventos pelo país inteiro, conversaram com dezenas, se não foram centenas, de parlamentares. Estenderam o tapete vermelho para senadores e deputados, mesmo para aqueles que só estavam interessados na simples bajulação. Engoliram muitos sapos durante anos, sempre com um sorriso. De repente, o fogo amigo implodiu tudo e jogou o trabalho para 2023.
Neste momento, ninguém sabe verdadeiramente o que vai acontecer com o mercado livre de energia elétrica no Brasil. O jeito agora é esquecer o estudo da CCEE, esperar a posse do novo governo e ouvir as suas propostas para o SEB, inclusive para o ML. É mais recomendável que as pessoas interessadas esqueçam o assunto por uns dias, curtam bastante as festas de final de ano, e depois tentem rever as estratégias e examinar então o que será possível fazer. Pedidos ao Papai Noel, é lógico, podem ajudar.