Em Goiás, usina térmica recebe sem gerar
Num momento em que consumidores vêm sendo afetados por medidas com custos bilionários, o caso de uma usina termelétrica em Anápolis (GO) chama atenção por simbolizar as distorções do setor. A Daia, que pertence à empresa Usina Termelétrica de Anápolis Sociedade Anônima, deve ter o contrato encerrado neste mês, tendo sido paga mensalmente pelos consumidores mesmo sem gerar eletricidade há quase cinco anos e acumular mais de R$ 80 milhões em multas.
O direito de a empresa manter os contratos e, portanto, receber a receita fixa, foi garantido na Justiça por meio de liminares de 2017 e de 2020. Em tese, seriam decisões provisórias, mas o caso nunca teve o mérito julgado, e tudo indica que os contratos serão finalizados sem que tenha havido uma decisão definitiva.
Movida a diesel, a usina foi uma das vencedoras do primeiro leilão de energia nova de 2005. À época, o empreendimento já estava pronto e havia sido contratado anteriormente para três anos; mas, pelo pouco uso dos equipamentos, foi autorizada a participar da competição. Por meio do novo contrato, a empresa se comprometeu a entregar energia por 15 anos, no período entre janeiro de 2008 e dezembro de 2022, mas desde outubro de 2017 a empresa não apresenta geração de energia.
Nos dois últimos anos, o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) deu ordem para o funcionamento da usina em ao menos cinco meses, mas não houve resposta sobre os pedidos. Na internet, há poucas informações sobre o empreendimento. No site, só há o endereço e um telefone para contato.
A Justiça garantiu à UTE Daia o pagamento da receita fixa. A receita mensal em 2022 é de R$ 1,3 milhão – suficiente para bancar o desconto de mais de 70 mil famílias no programa Tarifa Social. Os números são mais expressivos ao considerar os últimos anos. Apenas no ano passado, o montante chegou a R$ 14,9 milhões De janeiro de 2013 a setembro de 2021, a usina recebeu R$ 109,3 milhões – sendo que só entregou energia em cerca de metade desse período.
Procurado, o sócio-administrador da usina, José Alves Neto, afirmou que os problemas começaram em 2008, logo no início do novo contrato, atribuídos por ele a erro da Aneel na fórmula do cálculo da receita que a empresa receberia para custear o combustível. Segundo ele, a usina gerou energia por anos apesar de os recursos não serem suficientes para bancar a operação, o que levou a dívidas bancárias e, com outros fatores, resultou no pedido de recuperação judicial em 2012, quando os credores executaram as dívidas. Mesmo a recontabilização não foi suficiente para cobrir os prejuízos.