O MME está em marcha lenta
Decorridos 20 dias da gestão do ex-senador Alexandre Silveira à frente do Ministério de Minas e Energia cabe uma reflexão. Este site conversou com vários especialistas da área de energia, que por motivos óbvios não quiseram se manifestar publicamente. O fato é que o saldo para a imagem do ministro não é bom.
Jornalistas que cobrem o setor estão acostumados com ministros principiantes e tendem a ser indulgentes com os primeiros dias da gestão de Silveira. Só que entre a classe empresarial começa a se formar uma ideia que o ministro está muito devagar, quase parando, o que tem afetado a cadeia produtiva da energia elétrica, do petróleo e do gás natural como um todo. Talvez da mineração, que não é foco do trabalho deste site, mas também é parte das responsabilidades do ministro.
A questão mais preocupante está nas dificuldades do ministro para montar uma equipe. Não consegue convencer ninguém a ocupar os cargos mais relevantes no MME. Tome-se como exemplo a Secretaria-Executiva, que é uma função absolutamente-chave dentro do MME, principalmente no caso atual em que o titular não tem conhecimento técnico.
Foram apontados vários nomes, como três ex-diretores da Aneel: André Pepitone, Efraín Cruz e Paulo Pedrosa. Também se falou no ex-deputado Marcelo Ramos. Mais recentemente foi comentado em Brasília que o atual presidente do Conselho de Administração da CCEE, Rui Altieri, poderia ocupar a função. Também foram citados os nomes de Bruno Eustáquio, que já foi um secretário-executivo-adjunto no próprio MME, e Edvaldo Santana, um professor e consultor bastante conhecido no mercado elétrico.
Por alguma razão que só Deus, Silveira e o Palácio do Planalto sabem, nenhum desses nomes conseguiu aprovação dentro do Governo para ser o número 2 no MME. À medida que o tempo passa, mais nomes vão se agregando à lista de pretendentes.
Enquanto não sai o nome do preferido, o MME fica à deriva, pois o secretário-executivo é um cargo altamente estratégico e em função dele vão sendo preenchidos os demais nomes técnicos no organograma do ministério.
O risco que se corre no momento atual, em que o MME tem um ministro e talvez assistentes administrativos de gabinete, é que as corporações vinculadas à Pasta imponham as suas agendas e pontos de vista. Isso é perigoso para a saúde da área de Energia como um todo.
Afinal, ONS, Aneel, CCEE, EPE e ANP têm seus quadros definidos e as respectivas máquinas burocráticas funcionam normalmente. E é neles que o ministro precisa se socorrer quando não conta com assessoria técnica própria. Só que cada órgão vinculado tem seus lobbies próprios, às vezes mais eficientes do que os que vivem no MME ou no Congresso.
Alexandre Silveira vai certamente dizer que o MME está funcionando normalmente e poderá citar como exemplos a inauguração, nesta quinta-feira, 19 de janeiro, de uma planta experimental para produção de hidrogênio verde (que é de responsabilidade de uma empresa privada) ou algumas reuniões que fez para tratar de torres de transmissão que teriam sido derrubadas por terroristas, na esteira dos acontecimentos de 08 de janeiro. Nem mesmo o ministro tem certeza absoluta a respeito dessa tese. Tudo isso é muito pouco em termos de realizações. Quase nada.
Então, alguma coisa está precisando de ajustes urgentes no âmbito do MME. Na avaliação deste site, Alexandre Silveira não é o principal culpado. É verdade que ele poderia ter recusado o convite honroso feito pelo presidente da República para assumir a Pasta, alegando falta de experiência. Entretanto, é difícil dizer não ao presidente da República.
Vale lembrar que outras pessoas, em outros governos, assumiram ministérios técnicos, sem ter experiência específica, e se saíram bem. O nome mais destacado é sempre o de José Serra, que foi excelente ministro da Saúde, sendo um economista. Ao contrário, o general Pazuello foi o desastre que todos conhecemos.
No próprio MME, o antecessor de Silveira, Adolfo Sachsida, entendia de setor elétrico pouco mais do que acender e apagar a luz. Mesmo assim foi um ministro muito bom, com sete meses de gestão de intensa produtividade em favor dos consumidores de energia elétrica, quando não deu a menor bola para os lobbies que habitam o prédio do MME. Escolheu uma direção estratégica e apenas foi em frente.
Sem medo do trocadilho, está faltando energia ao ministro de Minas e Energia. E isso certamente deve ser cobrado de quem o indicou.
Este editor entende que a lucidez que faltou ao presidente Bolsonaro em boa parte da sua gestão, em outras áreas, esteve presente na forma como o MME foi tocado no seu Governo. Nas gestões petistas anteriores e no Governo Temer nunca pensaram duas vezes em transformar o MME em moeda de troca política na hora de organização do ministério. O PT e Temer simplesmente entregaram o MME às feras.
Bolsonaro, ao contrário, indicou um almirante da ativa, que ficou pouco mais de três anos, e Sachsida, um professor de economia, que ficou sete meses. O almirante transformou a Pasta numa extensão da Marinha e encheu o ministério e estatais vinculadas de marinheiros e militares de outras forças. Sachsida chegou no final do mandato e apenas colocou alguém de sua confiança na Secretaria-Executiva. De todo modo, surpreendentemente o MME foi tocado de forma técnica, sem ingerência dos partidos.
Agora, no Lula 3, ninguém entende direito o que está acontecendo, mas é lógico que tudo indica a existência de um retrocesso. Os partidos da enorme coalizão governamental voltaram a dar as cartas e essa talvez seja a razão pela qual não se consegue formar uma equipe no MME.
Qualquer que seja a razão, o que está claro e todo mundo entende é que o MME está literalmente travado e o Governo parece não compreender muito bem a lição número um do setor elétrico brasileiro, ou seja, que o MME é a cabeça do sistema. Travou o MME, travou o resto. Fica todo mundo na expectativa, como agora, do que virá por aí.
Aparentemente ninguém torce contra Alexandre Silveira, o que já é algo positivo. Só se espera que ele se desenrole rapidamente e mostre produção.