Leilões de ativos do setor elétrico andam de lado no Governo Temer
Maurício Corrêa, de Brasília —
Embora o Ministério de Minas e Energia tenha se esforçado para injetar otimismo no mercado, divulgando uma nota na sua homepage, nesta quinta-feira, 25 de agosto, dando conta que o processo de licitação da distribuidora goiana Celg foi retomado, com a reabertura do “data room”, o fato é que os leilões de ativos do setor elétrico estão andando de lado na gestão do presidente Michel Temer.
Em termos concretos, a nota não diz muita coisa. Assinala que “o MME, os acionistas da Celg-D (Eletrobras e Governo de Goiás) e o BNDES reuniram-se nesta quinta-feira para reafirmar o compromisso com a realização do leilão de venda da companhia ainda em 2016. Participaram da reunião o Secretário Executivo do MME, Paulo Pedrosa; a Secretária da Fazenda do Estado de Goiás, Ana Carla Abrão; e o presidente da Eletrobras, Wilson Ferreira Jr, acompanhados de suas equipes e do BNDES”.
Mais à frente, o comunicado oficial menciona que “os assuntos abordados envolveram a necessidade de reavaliação do ativo e dos riscos associados à venda da empresa, além do atendimento aos trâmites e prazos legais para a adequada condução do processo. No intuito de viabilizar a concretização desse compromisso de venda no ano em curso, o grupo decidiu pela reabertura, em breve, do acesso ao Data Room da Celg-D, o que sinaliza aos agentes interessados a oportuna mobilização de suas equipes de avaliação. O grupo fará reuniões periódicas para acompanhamento do cronograma e do cumprimento das etapas necessárias à conclusão do processo”.
Uma nota muito vaga, pois, por enquanto, as autoridades do setor elétrico não têm muito o que dizer em relação à privatização da Celg, surpreendidas que foram com o não oferecimento de garantias financeiras por eventuais interessados antes da realização do leilão (que estava programado para se realizar em 19 de agosto) e a consequente suspensão do processo de licitação. Alguns grupos ligados à distribuição de fato chegaram a se interessar pela distribuidora de Goiás (entre eles a Energisa, a CPFL e a Equatorial), mas na hora H recuaram diante do preço mínimo fixado, de R$ 2,8 bilhões.
O fracasso em mais essa tentativa de transferir a Celg para a iniciativa privada acendeu uma luz amarela no mercado. No dia 16 de agosto, a Comissão de Licitação que coordenou o processo de desestatização divulgou um comunicado no Rio de Janeiro, informando que a licitação foi considerada deserta por falta de interessados e que o leilão não seria mais realizado na data prevista. O MME imediatamente se manifestou e garantiu que o leilão seria remarcado.
O processo de venda do controle da Celg D foi iniciado em maio de 2015, com a inserção da distribuidora goiana no Programa Nacional de Desestatização (PND). No dia 24 de junho de 2016, o edital de desestatização foi publicado, definindo a data do tão esperado leilão, na BM&F Bovespa, em São Paulo.
Não há muitas dúvidas no mercado em relação às condições operacionais da Celg, que é considerada uma boa empresa e atua em uma área de concessão bastante atraente, que é a maior parte do Estado de Goiás. O problema é que a distribuidora foi alvo de péssima gestão durante anos seguidos, por parte do antigo controlador, o governo goiano, motivando a transferência do controle societário para a Eletrobras, para evitar o comprometimento do fornecimento de energia elétrica na área de concessão.
A holding federal, hoje, detém 50,93% do seu capital social, ficando o Governo de Goiás com o restante. A empresa é responsável pelo atendimento de 237 municípios do Estado de Goiás — o que corresponde a mais de 98,7% do território goiano — e que atende a 2,61 milhões de unidades consumidoras e abrange uma área de concessão de 336.871 km². Entre especialistas do mercado, entretanto, de forma discreta, existem comentários no sentido que o Governo Federal quer fazer caixa com a Celg, cobrando mais do que a empresa efetivamente valeria.
Os problemas do Governo nesse campo não se restringem à distribuidora goiana. Apenas uma semana depois que o seu leilão foi cancelado, houve uma nova surpresa no mercado, quando o Governo Federal tomou a decisão de suspender um leilão de 25 linhas de transmissão que seria realizado no dia 02 de setembro.
Em seguida, o MME alegou que estudaria “formas de recalibrar os parâmetros” do próximo leilão de empreendimentos de transmissão e não descartou a possibilidade de mudanças nas composições dos lotes. O objetivo, indicou, seria garantir a atratividade do certame e a competição na disputa.
Em nota, o ministério confirmou que, em conjunto com a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), decidiu suspender a realização do leilão “com o objetivo de permitir que mais interessados possam se organizar para participar do leilão”, “reconhecendo a importância do sucesso da licitação e a garantia dos cronogramas das obras”. Uma nova data seria divulgada oportunamente, dizia a nota.
No mesmo dia, o diretor-geral da Aneel, Romeu Rufino, já havia adicionado um outro ingrediente nesse tempero, comentando que a data de 02 de setembro “não era muito feliz”, porque ficaria muito em cima da provável data do afastamento definitivo da presidente Dilma Rousseff. “Tem todo um ambiente político e institucional que poderia contaminar o resultado”, afirmou Rufino. Ele garantiu que há interesse dos investidores no setor e afirmou que alguns pediram mais tempo para analisar cada lote. “Temos recebido muitos investidores interessados e talvez, com uma nova data, possamos ter mais competição e condição de vender todos os lotes. Nosso interesse é viabilizar o máximo de participação”, afirmou.
Entretanto, Romeu Rufino deixou bastante claro que o adiamento do leilão de transmissão não estava relacionado com o processo de licitação da distribuidora Celg, cancelada por falta de interessados na semana anterior. “São situações bem distintas. O mercado colocou que o preço mínimo era um parâmetro relevante e não estava bem calibrado”, afirmou ele em referência à Celg.
Não existe, portanto, apenas uma razão, mas, sim, um conjunto de situações que impedem a venda da Celg e o leilão da transmissão. De qualquer forma, o mercado já identificou que o Governo está patinando nessa área, lembrando ainda que as distribuidoras do Norte e Nordeste que estavam federalizadas (e cujas concessões foram devolvidas pela Eletrobras) somente serão privatizadas no mínimo dentro de um ano.