Ação da Eneva no Amazonas parou na Justiça
Da Redação, de Brasília (com apoio do Instituto ClimaInfo) —
A anulação do licenciamento ambiental da exploração de gás no Campo do Azulão (localizado nos município de Silves e Itapiranga) sob responsabilidade da empresa Eneva, no Amazonas (AM), e a demanda de liminar para suspender as audiências públicas marcadas pelo órgão ambiental estadual para os dias 20 e 21 (sábado e domingo próximos) constam do pedido de Ação Civil Pública (ACP) protocolado ontem sob o número 1021269-13.2023.4.01.3200 na seção judiciária da Justiça Federal no AM.
Os titulares do pedido são a Aspac (Associação de Silves pela Preservação Ambiental e Cultural ) e pela Associação dos Mura, que representa 190 famílias indígenas dos povos Mura, Munduruku e Gavião Real, com apoio da organização global 350. org .
Segundo o Instituto ClimaInfo, técnicos que trabalham em apoio às comunidades impactadas levantaram a existência de várias inconsistências e desinformações, tanto no processo de licenciamento ambiental, por parte do IPAAM, quanto nas atividades exercidas pela empresa Eneva.
Também causou surpresa a realização de uma audiência pública sem a prévia divulgação e debate público sobre o Estudo de Impacto Ambiental de Campo do Azulão – que não foi apresentado nem pela Eneva nem pelo órgão ambiental estadual.
Do pedido de ACP também constam:
a) Que o licenciamento seja feito pelo Ibama (Instituto Brasileiro de Meio Ambiente), devido à complexidade e sensibilidade ambiental da bacia hidrográfica;
b) que seja realizada a consulta livre, prévia e informada dos povos indígenas e demais populações tradicionais, localizadas na área de influência do empreendimento ;
c) que seja elaborado estudo específico de Componente Indígena e do Componente Quilombola, ausentes em todas as fases do licenciamento ambiental e tampouco apreciado no Rima (Relatório de Impacto Ambiental) apresentado pelo empreendedor, além da identificação dos impactos do empreendimento pela Eneva e a implementação dos planos de gestão econômicos e demais medidas mitigatórias e compensatórias; e
d) que seja dada ampla publicidade ao EIA (Estudo de Impacto Ambiental), conforme determina a Resolução 237 do CONAMA (Conselho Nacional do Meio Ambiente).
EIA não foi divulgado; povos tradicionais não foram ouvidos
“A audiência pública não atende aos princípios básicos da consulta livre e informada às comunidades ribeirinhas, povos indígenas e quilombolas, além de não ter sido divulgado o EIA que precede a apresentação do Rima. Existem potenciais riscos de contaminação das águas superficiais e subterrâneas da Bacia Amazônica, o que causaria grandes problemas de saúde e até morte das populações”, estima a bióloga Marcia Ruth Martins da Silva, da Aspac, uma das autoras do pedido de ACP.
“A Eneva nunca ouviu os povos tradicionais que moram aqui na região. Ela não tem nenhum respeito ao povo indígena que mora no município de Silves”, avalia o Cacique Jonas Mura, que também assina o pedido.
“É inconcebível ainda explorarmos novas áreas de combustíveis fósseis, ainda mais numa região tão sensível como a Bacia Amazônica. O Campo de Azulão está recebendo do IPAAM um licenciamento no mínimo controverso, sem a participação popular, sem informações técnicas, comprometendo uma região cuja beleza cênica e a riqueza ambiental, fala por si só. Tanto o órgão ambiental como a Eneva, esqueceram que lá existem gente, povos indígenas, quilombolas, extrativistas, pescadores artesanais e ribeirinhos que vivem e subsistem, há centenas de anos, com os recursos naturais renováveis da região em um equilíbrio harmônico”, observou Luiz Afonso Rosário, integrante da organização 350.org que – juntamente com a AspacC, a Associação dos Mura e a Rede GTA – integra a rede Resistência Amazônica.
“Apesar de ameaças sociais e ambientais, a audiência dupla é realizada após o empreendimento receber as licenças prévia, de instalação e de operação sem apontar aspectos como a ameaça social – afinal, um município com 12 mil habitantes irá receber 5 mil homens, com efeitos na vida das mulheres, na prostituição infantil, na gravidez precoce, nas doenças e tudo mais. E, ainda mais grave, no risco dos danos ambientais. As entidades registram estranheza e perplexidade na atitude do órgão ambiental estadual IPAAM e o empreendedor Eneva sequer apresentarem antes à sociedade o EIA mesmo após requerido pelas organizações sociais, “rasgando” a Resolução Conama 237 que trata dessa matéria”, avalia Sila Mesquita, presidenta da Rede GTA e membro da coordenação da organização Terrazul.