Abdan alega que Angra 3 foi abandonada
Da Redação, de Brasília (com apoio da Abdan) —
O portfólio do Novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), divulgado na última sexta-feira, no Rio de Janeiro, pelo Governo Federal, não engloba a finalização da usina de Angra 3, e, sim, a condução de uma “análise de viabilidade técnica, econômica e socioambiental” das obras pendentes. O cenário gerou incertezas sobre o futuro do projeto e sobre toda a cadeia produtiva do setor e indústria nuclear braseira, deixando os agentes econômicos apreensivos com esta possibilidade.
A obra da usina já está 70% concluída. “Tememos a sua paralisação. Tem obras muito menos relevantes sendo incluídas no PAC e Angra 3, que é a maior obra do país, não está. Não incluir a conclusão deste empreendimento no PAC significa, na prática, ainda que não formalmente, acabar com o projeto. Esse é um momento decisivo para o setor unir esforços”, afirma Celso Cunha, presidente da Associação Brasileira para Desenvolvimento Atividades Nucleares (Abdan).
Especialistas ressaltam o impacto disso para o Estado do Rio de Janeiro. “Parando as obras, a Eletronuclear não tem como pagar as dívidas, então isso vai para a União. E assim, não será possível fazer as obras para manter Angra 1, irá impactar não somente Angra 1, mas também Angra 2. Será uma reação em cadeia para todas as empresas públicas do setor e, principalmente, para a arrecadação do Estado e para os empregos, porque temos um volume altíssimo de pessoas que vão ficar desempregadas”, explica Leonam Guimarães, engenheiro nuclear e diretor técnico da Abdan.
Segundo fontes do segmento de energia, a regra seria colocar no PAC obras que poderiam ser entregues nesta gestão. No entanto, estão ocorrendo pressões para inclusão de outras demandas com outra justificativas. “O PAC é uma espécie de grife, um grupo das obras importantes. A segunda justificativa é que mesmo que a obra não fique pronta nesta gestão, teria um andamento importante, se estiver no PAC. No caso de Angra, temos ainda a questão política do PAC estar sendo lançado no Rio de Janeiro, onde se localiza a obra”, revela fonte influente no setor. “A não conclusão de Angra 3 quebra uma cadeia de produtos nucleares inimaginável. Além ser uma demonstração de incompetência gerencial incompatível com a engenharia brasileira”, reforça.
No âmbito do setor elétrico brasileiro, a conclusão da Usina Termonuclear Angra 3 (UTN Angra 3) tornou-se uma questão urgente. O Operador Nacional do Sistema (ONS), órgão responsável pela coordenação e controle do sistema elétrico nacional, já manifestou formalmente ao Ministério de Minas e Energia (MME) a importância estratégica da UTN Angra 3 nos estudos de planejamento da operação do Sistema Elétrico Brasileiro (SEB).
Segundo o MME, já foram aportados mais de R$ 7,8 bilhões no projeto e seriam necessários mais R$ 20 bilhões para a conclusão até 2029, cifra considerada alta demais no governo. De acordo com a modelagem do BNDES, esse valor restante viria de um financiamento que seria pago por uma tarifa mais alta nos primeiros 15 anos. Essa tarifa permitiria servir a dívida e remunerar o capital numa TIR de 8% a 9%.
Porém, entidades e autoridades do setor alertam que os custos associados ao abandono da iniciativa representam mais da metade dos investimentos necessários para a conclusão da usina, cerca de R$ 15,2 bilhões. “Os investimentos já realizados para a construção de Angra 3 representam um esforço da União e da Eletrobras. A conclusão da obra requer a obtenção de financiamento, sem necessidade de aporte financeiro direto da Eletrobras ou do Governo. E estes custos serão repassados aos consumidores quando a energia elétrica for gerada”, afirmou o professor Nivalde de Castro, coordenador do Gesel-UFRJ.
A Associação Brasileira para Desenvolvimento Atividades Nucleares (Abdan) propõe desta forma que sejam utilizados recursos oriundos das outorgas a serem renovadas como aumento de participação acionaria no projeto, fazendo com que o valor da tarifa seja reduzido e o Estado Brasileiro pague por sua ineficiência.
Para o ex-secretário estadual de Energia, Indústria Naval e Petróleo do Rio de Janeiro, Wagner Victer, Angra 3 é fundamental para a estabilidade do subsistema elétrico Sudeste e Centro Oeste, não só na capacidade de geração de energia de base, mas fundamentalmente para também garantir a segurança de toda essa região. “Além disso Angra 3 contribui profundamente para fechar e dar escala ao sistema nuclear brasileiro envolvendo a produção de tecnologia, a segurança associada com as outras duas usinas nucleares colocadas no mesmo local em Angra. E fundamentalmente para o domínio dessa importante fonte de geração de energia, hoje considerada em países europeus como energia limpa por não emitir os gases do efeito estufa. Não há como prescindir das três usinas nucleares no Brasil para compor o sistema interligado Nacional”, reforça Victer.
Manutenção e segurança
Os equipamentos da UTN Angra 3 são mais um ponto de discussão no segmento, por conta da demora no processo de conclusão das obras. Manter as máquinas da usina em excelente condição é outro fator-chave para o funcionamento confiável e a maximização de sua vida útil.
“Embora o projeto de Angra 3 tenha sido inicialmente concebido no final dos anos 1970, ao longo do tempo, foram implementadas adaptações na concepção original. Estas mudanças visaram incorporar avanços tecnológicos, lições aprendidas com a operação de outras instalações nucleares e as diretrizes de segurança estabelecidas pelas normas nacionais e internacionais, que passaram por revisões ao longo desse período. Essas modificações garantem que Angra 3 possua um nível de segurança e desempenho em total conformidade com os rigorosos padrões internacionais vigentes. Todos esses detalhes e informações estão minuciosamente registrados no relatório intitulado “Atualização do Padrão Técnico e de Segurança do Projeto de Angra 3″”, explica o diretor técnico da Abdan, Leonam Guimarães.
Através de uma estratégia de manutenção proativa e rigorosa, a Eletronuclear visa evitar problemas potenciais, minimizar paradas não programadas e otimizar a produção de energia. De acordo com os relatórios emitidos, os equipamentos de Angra 3 têm sido mantidos em perfeita atualização e se encontram em excelente estado de manutenção e conservação. A Eletronuclear, ciente da importância da tecnologia em constante evolução no setor nuclear, tem se dedicado a assegurar que os equipamentos estejam alinhados com os mais altos padrões de qualidade e segurança”, explica Celso Cunha.