Abraceel desiste da portabilidade
Caiu a ficha: a associação dos comercializadores de energia, a Abraceel, desistiu de brigar pela portabilidade das contas de luz.
Um dia, um cara bom de marketing dentro da associação saiu com essa história. Lembrou das contas de telefone e pensou: por que não o mesmo com as contas de luz?
Virou uma bandeira da associação, animou a moçada. Durante anos, a Abraceel carregou a bandeira e foi a fonte inspiradora do projeto 232, do Senado Federal, de 2016, que criava a portabilidade.
Esse projeto depois virou o 414, na Câmara dos Deputados, também sob inspiração da associação, mas com uma ambição maior (e legítima) de modernização das relações comerciais do setor elétrico brasileiro.
Em agosto passado, o presidente da Câmara, Arthur Lira, depois de ter engavetado o 414 durante meses e meses, criou uma comissão especial para analisar a proposta. Nunca mais se falou dela.
O assunto da portabilidade, naturalmente, como bom produto de marketing e comunicação, gerou dezenas de entrevistas nos meios de comunicação, artigos em sites e jornais, discursos parlamentares, apresentações em eventos e por aí vai. Todo mundo sabia que há enorme diferença entre os mercados de telefonia e energia, mas não importava muito. O fundamental era ocupar espaços e falar da portabilidade.
A associação, aparentemente, já não dá bola para o tema. Pode até sair, nunca se sabe, mas a portabilidade da conta de luz parece algo extremamente distante e sem sentido, até mesmo para os comercializadores, que sempre trabalham de forma organizada em torno dos seus objetivos estratégicos.
Tanto assim que a equipe da Abraceel, que não é boba, não incluiu a portabilidade entre as bandeiras propostas para a AGO que será realizada em 07 de dezembro e que aprovará o plano de trabalho da diretoria-executiva no próximo ano.
Eis o que diz a Abraceel sobre a abertura e crescimento do mercado nos preparativos para a AGO:
“Destaque para reuniões com Superintendências da Aneel para discutir ações de simplificação do processo de migração, a realização de evento para discutir o uso adequado dos dados dos consumidores e a defesa da concorrência e o engajamento de outras associações na proposição de contribuições da Abraceel para o aperfeiçoamento da comercialização varejista. Os conselheiros foram ainda informados que está em fase final de elaboração um estudo de “excelente qualidade”, produzido internamente, com propostas de aprimoramento de regulamentos atinentes à migração e de benchmarking das melhores práticas da migração praticadas pelas distribuidoras”.
Alguém leu aí alguma vírgula sobre a portabilidade? Não, pois simplesmente não tem. Agora, num surto de realidade, a associação pretende carregar em 2024 bandeiras que são mais pé no chão:
1. Simplificar a migração (de consumidores) e aprimorar o agente varejista;
2. Fomentar a concorrência isonômica no mercado;
3. Atuar para a abertura do Grupo B (de consumidores).
E por que a portabilidade deixou de ser uma bandeira? Por 77 razões, a começar pelo fato que o Governo Federal claramente empurra com a barriga a proposta de modernização do setor elétrico e não tem a menor boa vontade com o tema. Além disso porque também é uma furada incluir a portabilidade no planejamento estratégico.
Como dificilmente sairá, não renderá um tostão furado sequer de bonificação para o pessoal da Abraceel no exercício de 2025. Então, é muito mais prudente e inteligente colocar entre as bandeiras outra coisa mais factível que possa se tornar realidade em 2024 e que resulte em boas bonificações por desempenho no outro exercício.
E o que fazer com a proposta de portabilidade? Nada. Fica ali, guardada em algum lugar e se amanhã ou depois aparecer uma autoridade entusiasmada e interessada no assunto basta desengavetar a proposta.