Itaipu é apenas uma geradora de energia. Não é um banco de desenvolvimento
Quem o conhece sabe que o deputado federal Danilo Forte é um parlamentar sério. Às vezes, é até sizudo. Em compensação é sempre bem educado. O que não se sabia é que o deputado da bancada da União Brasil do Ceará também tem uma vertente de humorista.
Só isso poderia talvez explicar a proposta recém-apresentada por ele de usar o resultado da comercialização de energia e recursos da Itaipu Binacional para reduzir os impactos da enchente no Rio Grande do Sul.
Ele não deixou por menos. No projeto, Forte sugere a utilização de apenas R$ 400 milhões do caixa da Itaipu Nacional para aplicar nos problemas gerados pelo caos no Extremo Sul.
O deputado, entretanto, não tem culpa. Como muitos brasileiros, ele leu em algum lugar, há poucos dias, que a binacional está nadando em dinheiro e que concordou com uma proposta do Governo Federal para aplicar R$ 1,3 bilhão no embelezamento da cidade de Belém, para que a capital do Pará possa receber dignamente os milhares de visitantes estrangeiros esperados para a COP, no próximo ano.
Forte pensou o lógico: bom, se Itaipu tem dinheiro sobrando para investir num banho de loja em Belém, que está a 3,3 mil km de distância, totalmente fora da sua área de abrangência, então naturalmente deve ter algum dinheirinho para se gastar na recuperação do Rio Grande do Sul e dos seus sofridos moradores.
O olho grande de Danilo Forte sobre a grana de Itaipu deve ter crescido mais ainda quando ele soube que a binacional está construindo uma universidade em Foz do Iguaçu, que modernizou o aeroporto da mesma cidade e que também está construindo uma ponte entre o Brasil e o Paraguai. Itaipu é uma mãe muito generosa.
Ou seja, o deputado do Ceará descobriu que o dinheiro de Itaipu serve para muitas coisas, menos para reduzir as tarifas de energia elétrica pagas pelos consumidores brasileiros.
O site Paranoá Energia reconhece o direito sagrado do deputado Danilo Forte (e de qualquer outro congressista) de apresentar o projeto de lei que lhe der na telha. Faz parte do jogo democrático e é para isso que os senadores e deputados são eleitos. Para formular propostas que melhorem as vidas dos brasileiros. O PL de Forte tem boas intenções.
Entretanto, Danilo Forte é um congressista que conhece o funcionamento do setor elétrico brasileiro. Ele sabe como esse complexo mecanismo funciona. Tem participado de amplas negociações envolvendo questões complexas do SEB.
Talvez teria sido melhor se ele tivesse apresentado um projeto que, em vez de aumentar a distorção na gastança da Itaipu Binacional, melhorasse a qualidade das aplicações dos recursos da hidrelétrica em favor dos consumidores brasileiros de energia elétrica.
O projeto de Forte poderia simplesmente proibir a continuidade dessa distorção, obrigando a usina a, tendo recursos disponíveis, reverter toda essa grana para reduzir as tarifas pagas pelos consumidores. Nada de aeroporto, nada de ponte, nada de pracinha em cidades do interior do Paraná, nada de dinheiro para enchentes e nada de parque público em Belém.
Essa história da gastança equivocada de Itaipu, capitaneada pela classe política, é mais antiga do que o rascunho da Bíblia. Não foi inventada pelo governo Lula 3 e tampouco pelo deputado Danilo Forte.
Este editor apenas estranha que um Governo que fala tanto em modicidade tarifária e que reclama diariamente do valor da energia elétrica nunca tenha se preocupado em estancar essa brecha de recursos da Itaipu Binacional, que funciona como uma espécie de Tesouro Nacional paralelo.
Para quem na cúpula do Governo ainda não sabe como esse troço se chama, aqui vai uma modesta contribuição do site “Paranoá Energia”: o nome disso é “Custo Brasil”.
A tarifa brasileira de energia elétrica é caríssima, embora os custos de geração sejam relativamente baixos, por causa do tal de “Custo Brasil”: impostos altíssimos, além dos encargos que são inventados a cada dia e bobagens como essas, de gastar o dinheiro do SEB com penduricalhos que provavelmente são importantes, mas que ficariam melhor encaixados na contabilidade nacional se fossem bancados pelo Tesouro Nacional, ou seja, pelos contribuintes de impostos, e não pelos consumidores de energia elétrica, que já estão pela bola sete.
O site “Paranoá Energia” não está dizendo que há corrupção nesse negócio. E nem insinuando qualquer coisa nesse sentido.
Apenas lamenta que não exista a mínima preocupação no Governo e nem no Congresso para proibir a Itaipu Binacional de gastar dinheiro em projetos que são relevantes para a coletividade — alguém aí discorda que a ponte é necessária, que a modernização do aeroporto é prioritária ou que o banho de loja em Belém é oportuno? Ninguém dúvida disso.
O problema é que Itaipu é apenas uma geradora de energia elétrica. Não é um banco de desenvolvimento. Não é um saco sem fundo, onde o Governo vai lá e mete a mão peluda quando precisa de dinheiro para alguma coisa, mesmo que seja prioritária.
Quando esse Tesouro Nacional clandestino não funcionar mais, projetos como do deputado Danilo Forte não serão sequer apresentados. E os consumidores brasileiros de energia elétrica vão agradecer aos deuses que regem o Universo.