O que pode mudar no setor elétrico
No final da campanha presidencial do ano passado, o grupo de especialistas em setor elétrico que trabalhava com propostas de governo para o então candidato Aécio Neves, chegou a rascunhar um conjunto de ideias que poderiam virar o setor pelo avesso, caso o candidato do PSDB tivesse sido eleito. O rascunho era arrasador com o modelo atual, construído a partir de 2003, quando a então ministra Dilma Rousseff assumiu a Pasta de Minas e Energia. Sem cerimônia, a proposta era colocar de pé um novo modelo baseado no viés liberal.
Mas as urnas falaram de outra forma, o mandato de Dilma foi renovado e o grupo de especialistas recolheu-se ao silêncio. Entretanto, como a política dá voltas e ninguém poderia imaginar que o segundo mandato da presidente entraria em colapso apenas algumas semanas depois de iniciado, o fato é que volta-se a comentar em Brasília as propostas que foram discutidas muito discretamente na campanha de Aécio.
O raciocínio é simples: devido à fragilidade total do Governo Dilma, há uma chance de uma nova eleição em 2016, quando o PSDB — seja com o mesmo Aécio ou com o governador Geraldo Alckmin — poderia assumir o Palácio do Planalto. Se isso acontecer, o Partido não quer ser apanhado de surpresa e, se for chamado a governar, quer mostrar que tem propostas concretas para o setor elétrico. Na visão da oposição, o setor precisa ser reconstruído, pois a política da presidente Dilma teria sido uma espécie de terra arrasada.
Sem entrar no mérito de quem está com a razão, o fato concreto é que houve uma forte intervenção estatal na área de energia elétrica, o que é compatível com a política defendida pelo Partido dos Trabalhadores. Para a oposição, isso gerou não apenas ineficiência, falta de transparência ou de previsibilidade, como aumentou demasiadamente o tamanho da burocracia setorial, elevando os custos para os agentes e consumidores.
Uma fonte explicou para este site que não será fácil desmontar a estrutura do estado petista dentro da área de energia em geral. E lembrou que hoje o Ministério de Minas e Energia já conta com uma estatal pura, que é a Empresa de Planejamento Energético (EPE), mas dispõe de vários satélites — Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), que não deveriam, mas atuam ultra-afinados com os interesses do Executivo.
A CCEE e o ONS foram concebidos para serem organismos neutros. Talvez já tenham sido, mas foram capturados pelo MME. A Aneel era a agência mais independente do Executivo, até que um diretor-geral a transformou simplesmente num apêndice do ministério setorial. A oposição acompanha tudo isso em total silêncio, pois, se assumir o governo, ao que tudo indica virá por aí uma situação bem diferente.
Há quem diga, por exemplo, que será passada uma faca bem afiada nos orçamentos da CCEE, da EPE e do ONS, que terão que se adaptar aos novos dias (se for o caso). No caso da Aneel, cuja autonomia é considerada uma peça-chave do modelo liberal, terá que trabalhar com um tipo de gestão diferente. No fundo, o que se pretende antes de qualquer outra coisa é: 1. reduzir a intervenção do Poder Executivo; 2. reduzir os custos para os agentes, inclusive os consumidores. ONS, EPE, CCEE e Aneel somam hoje centenas de empregados, provavelmente uns 2 mil, sem contar a estrutura do próprio MME, que já é grande. Somando tudo isso, vai muito dinheiro pelo ralo.
Para alguns especialistas, a crise do atual governo é essencialmente de confiança na economia em geral, mas não basta trocar o ocupante principal do Palácio do Planalto. Em relação ao setor elétrico, é necessário restabelecer a segurança regulatória, que foi para o espaço com tantas medidas provisórias e todo o cipoal jurídico/burocrático criado pelo atual governo. Nesse contexto, é possível fazer mais e melhor com menos gente, enfatizando velhos princípios como regras claras, estáveis, etc e etc.
É uma briga que estava praticamente sepultada, mas foi ressuscitada graças à inoperância do atual governo, criando condições para um processo de impeachment e, quem sabe, até mesmo para uma nova eleição. Mesmo que ela não ocorra, se a presidente for simplesmente substituída pelo vice Michel Temer, ele precisará governar com o apoio maciço do PSDB e, nessa novo acerto político, o MME poderá inclusive mudar de dono. Essa é a razão principal pela qual o PSDB está mexendo nas gavetas e redescobrindo as suas antigas propostas.