Que tal refletir sobre uma Constituinte Exclusiva?
Embora este site seja destinado à veiculação de informações sobre a área de energia, não se pode ignorar que o Brasil atravessa um momento excepcional na sua História dada a falência absoluta do modelo político, com a corrupção azeitando as atividades do mundo político em geral. Antes que uma multidão enfurecida faça o que se fez no Congresso do Paraguai, é preciso reformar as instituições políticas, de modo que as atividades do País possam fluir de outra forma. Obviamente, não dá nem para pensar em efetuar tais reformas com os partidos e congressistas que aí estão, quase todos envolvidos até a alma na Operação Lava Jato.
O que mais impressiona em tudo o que vem sendo mostrado pela Operação Lava Jato é como uma empresa poderosa como a Odebrecht conseguiu corromper todo o sistema político-partidário, chegando à sofisticação de constituir um departamento de propinas, através do qual se relacionava com figuras suspeitas e chamadas de Mineirinho, Esquálido, Italiano, Amigo, Caju, etc. Obviamente, todos ouviam as histórias, mas, em sã consciência, não era possível imaginar que a Odebrecht era o centro do verdadeiro poder no Brasil. Presidentes da República, ministros, congressistas não passavam de assalariados da maior construtora do País.
Este site entende que é oportuno, portanto, refletir sobre a tese de uma Constituinte Exclusiva levantada pelos juristas Modesto Carvalhosa, Flávio Bierrenbach e José Carlos Dias em recente manifesto publicado no jornal “O Estado de São Paulo”.
“Os constantes escândalos comprovam a inviabilidade do vigente sistema político-constitucional. Ele representa um modelo obsoleto, oligarca, intervencionista, cartorial, corporativista e anti-isonômico, que concede supersalários, foros privilegiados e muitos outros benefícios a um pequeno grupo de agentes públicos e políticos, enquanto o resto da população não tem meios para superar a ineficiência do Estado e exercer seus direitos mais básicos. A Constituição de 1988 transformou a burocracia num obstáculo perverso ao exercício da cidadania. Ela é fruto de um momento histórico bastante peculiar, o fim de um regime de exceção, que não corresponde mais à realidade do Brasil; representa um conjunto de interesses e modelos que já em 1988 estavam em franca deterioração no mundo civilizado”, diz o manifesto.
“Por ser um compromisso de interesses entre as forças que disputavam o poder após a ditadura, a Carta de 88 foi recheada de casuísmos e de corporativismos. Estabeleceu um absurdo regime político que se nutre de um sistema pseudopartidário, excessivamente fragmentado e capturado por interesses de corporações e de facções político-criminosas. Isso torna excessivamente custosa a governabilidade, criando uma relação tóxica entre os Poderes, o que favorece a corrupção, o tráfico de influência e os rombos devastadores nas contas públicas. Os vícios insanáveis de Carta de 88 fizeram com que ela tenha sido desfigurada por 95 emendas desde sua promulgação, tramitando atualmente mais de mil novos projetos de emendas constitucionais. No entanto, tais emendas são paliativos lentos e pontuais, que apenas retardam as verdadeiras estruturais necessárias”, assinalam os juristas.
Em seguida, os autores do manifesto elencam os temas que deveriam fazer parte de uma reforma estrutural, política e administrativa, indispensável à restauração das instituições. Dentre outros citam:
– Eliminação do foro privilegiado;
– Eliminação da desproporção de deputados por Estados da Federação;
– Voto distrital puro, sendo os parlamentares eleitos pelo distrito eleitoral respectivo;
– Referendo no caso de o Congresso legislar em causa própria, sob qualquer circunstância;
– Estabelecimento do regime de consulta, com referendo ou plebiscito, para qualquer matéria constitucional relevante;
– Nenhum parlamentar poderá exercer cargos na administração pública durante o seu mandato;
– Eliminação dos cargos de confiança na administração pública, devendo todos os cargos ser ocupados por servidores concursados;
– Eliminação do Fundo Partidário e do financiamento público das eleições: serão os partidos financiados unicamente por seus próprios filiados;
– Eliminação das emendas parlamentares, que tornam os congressistas sócios do Orçamento, e não seus fiscais;
– Criação ou aumento de impostos, somente com referendo;
– Fim das coligações para quaisquer eleições;
– Eliminação de efeitos de marketing das campanhas eleitorais, devendo os candidatos se apresentar no horário gratuito pessoalmente, com seus programas e para rebater críticas;
– Distribuição igual de tempo por partido no horário eleitoral gratuito para as eleições majoritárias (presidente e governador);
– Inclusão do princípio da isonomia na Constituição, de modo que a lei estabeleça tratamento igual para todos, em complementação ao princípio vigente de que todos são iguais perante a lei;
– Isonomia de direitos, de obrigações e de encargos trabalhistas e previdenciários para todos os brasileiros, do setor público e do setor privado;
– Eliminação da estabilidade no exercício de cargo público, com exceção do Poder Judiciário, do Ministério Público e das Forças Armadas, devendo os servidores públicos se submeter às mesmas regras do contrato trabalhista do setor privado;
– Eliminação dos privilégios por cargo ou função (mordomias, supersalários, auxílios, benefícios, etc.), devendo o valor efetivamente recebido pelo servidor estar dentro do teto previsto na Constituição.
É obvio que alguns desses temas talvez não sejam factíveis. Mas grande parte deles, sim. Como tais mudanças “jamais serão aprovadas pelos atuais parlamentares, que atuam só para manter o vigente sistema político-constitucional, que preserva seus privilégios”, como diz o manifesto, torna-se inevitável reivindicar uma Constituinte Exclusiva, que seria composta por integrantes da sociedade civil que não ocupem cargos políticos e que depois ficariam inelegíveis por oito anos.
A proposta é que seja feito um plebiscito para que os eleitores possam indicar se preferem uma Assembleia Constituinte independente, formada por pessoas que não tenham cargos políticos, ou, então, uma Assembleia Constituinte formada pelos próprios congressistas. Esta seria a única pergunta a ser formulada na cédula, conforme a proposta dos três juristas.
“Impõe-se, enfim, uma mobilização da sociedade civil e organizada que exija do Congresso Nacional a realização de um plebiscito, nos termos da Lei 9.709/98, para que o povo decida, soberanamente, se quer uma Assembleia Constituinte originária e independente, que estabeleça as novas estruturas para o desenvolvimento sustentável do nosso país, num autêntico Estado Democrático de Direito”, afirmam Carvalhosa, Dias e Bierrenbach.