Abiape diz ao MME que está pronta para investir
Maurício Corrêa, de Brasília —
Em um momento que o Governo só escuta o que não quer, dirigentes da Associação Brasileira dos Investidores em Autoprodução de Energia (Abiape) foram recebidos em audiência pelo secretário-executivo do Ministério de Minas e Energia, Luiz Eduardo Barata Ferreira, nesta terça-feira, 19 de janeiro, quando deram uma boa notícia: o momento certamente é de muita dificuldade para o País, mas, com pequenos ajustes que dependem apenas de decisão política, existem grupos empresariais que estão dispostos a investir pesado, pois têm uma visão de longo prazo do Brasil e acreditam que a crise atual não vai durar para sempre.
A mensagem da Abiape ao MME foi levada por parte dos integrantes do Conselho de Administração e pela Diretoria-Executiva da associação. É uma organização, aliás, que agrupa uma parcela bastante significativa do PIB brasileiro, sendo ainda responsável por milhares de empregos diretos e indiretos. Dela fazem parte a Alcoa, ArcelorMittal, CNS, Gerdau, InterCement Brasil, Votorantim, Odebrecht, Samarco, Vale e Thyssen Krupp. É gente que tem bala na agulha.
Basicamente, foram levadas três mensagens ao secretário-executivo do MME: necessidade de reduzir a judicialização do setor elétrico; prorrogação dos prazos de concessões das usinas classificadas como de autoprodução e garantia de acesso dos autoprodutores ao lançamento de debêntures incentivadas.
O presidente da Abiape, Mário Luiz Menel da Cunha, disse a este site que as empresas que participam da Abiape entendem a profundidade da atual crise econômica, mas que ela não será eterna. “Do mesmo jeito que começou, em algum momento, que esperamos seja o mais breve possível, vai se esgotar. E, então, o País precisará estar preparado para uma nova arrancada de desenvolvimento. Não podemos apenas ficar lamentando que a situação está ruim. Todos nós temos a obrigação de tentar encontrar soluções para que o Brasil saia da crise. Essa é a principal mensagem que levamos ao MME, pois temos uma contribuição a oferecer nesse sentido, bastando alguns pequenos ajustes de natureza legal”, argumentou o presidente da Abiape.
A associação, por exemplo, entende que uma “excelente” demonstração que o Governo Federal poderia dar nessa direção seria, por exemplo, simplesmente contribuir para reduzir a judicialização, que é algo que incomoda todos os agentes, já que as regras tornam-se imprevisíveis. No caso do GSF, por exemplo, a Justiça concedeu 103 liminares.
Para a Abiape, o Governo poderia dar um passo adiante, revogando a Resolução número 03 do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) e a Portaria número 455 do MME. Ambas constituem duas enormes pendências entre os agentes econômicos e o MME.
A Resolução número 03 do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) criou um grande impasse entre as autoridades do Governo Federal e os agentes econômicos, principalmente os comercializadores e os geradores, pois determinou que os custos referentes à geração de energia por usinas termelétricas acionadas emergencialmente deveriam ser rateados entre todos os agentes do mercado, por meio do pagamento do Encargo de Serviços do Sistema – ESS.
Entretanto, os agentes argumentam que a Lei nº 10.438, de 2012, especifica que o ESS deva ser pago somente pelos consumidores. E, com a nova resolução do CNPE, o pagamento deveria ser feito por todas as categorias de agentes, inclusive as próprias termelétricas. Uma confusão desse tamanho só podia mesmo acabar na Justiça, como ocorreu. A Abiape lembrou ao secretário Luiz Eduardo Barata que, hoje, existe um total de 93 liminares judiciais obtidas por agentes diversos contra o pagamento previsto na Resolução 03 do CNPE.
Outra pendência significativa apontada pela Abiape, também fonte de muitos problemas judiciais, é a Portaria 455 do próprio MME. Essa polêmica portaria, em síntese, diz que os registros e ajustes dos contratos de energia elétrica, até então realizados a cada mês, deveriam ser feitos semanalmente a partir de fevereiro de 2014. Isso gerou um pandemônio entre os agentes, devido aos impactos — não previstos pelo MME na hora de editar a portaria — nas dezenas de milhares de contratos que ficam sob a responsabilidade da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), questão, aliás, que Barata conhece bem na condição de ex-presidente do Conselho de Administração da Câmara.
Simplesmente, é impossível renegociar as condições de todos esses contratos. O fato concreto é que essa Portaria 455 hoje está suspensa por uma liminar judicial e aparentemente todo mundo no Governo, de forma pragmática, se esqueceu que a sua regulamentação ainda está pendente.
“Já que nem a CNPE 03 e nem a MME 455 produziram os efeitos pretendidos inicialmente, o mais razoável seria a revogação de ambos os atos. Imediatamente, os agentes do mercado teriam a sensação que houve uma mudança na maneira de ver as coisas, resultando em mais credibilidade”, afirmou Menel.
Além da judicialização, outra questão que preocupa os autoprodutores é o lançamento de debêntures incentivadas, prerrogativa que os deixou de fora – assim como todos os agentes que atuam no mercado livre – prejudicando a captação de financiamentos para projetos de infraestrutura. Ele esclareceu que o MME solicitou uma proposta concreta, que será encaminhada brevemente ao Governo.
A outra questão tratada com o secretário-executivo do MME diz respeito ao processo de renovação de concessões, regulamentação da lei, por parte dos agentes de autoprodução. Menel explicou que, em 2012, eles manifestaram a vontade de renovar tais concessões (algumas, por exemplo, estão vencendo em junho próximo). Contudo, até hoje o decreto que regulamenta as concessões não foi assinado, o que preocupa os agentes. A Abiape recebeu garantias do MME que o assunto está sendo resolvido.