Momento oportuno para rever a formação de preços
Walfrido Avila (*)
Três assuntos que estão na pauta do setor elétrico nestes dias mostram que este pode ser o momento adequado para revermos a formação de preços, de modo que possamos substituir a sistemática atual, em que os preços surgem da aplicação de rígidas fórmulas matemáticas, nem sempre condizentes com a realidade de mercado, por um sistema já utilizado em muitos países, qual seja, a oferta de preços pelos agentes.
O primeiro assunto é o Projeto de P&D Estratégico, capitaneado pelo Instituto Abradee — com apoio de praticamente todo o setor elétrico — e que começa a dar os primeiros passos. É importante que dentro desse trabalho também haja comprometimento com a mudança da sistemática de formação de preços, bem como com a eliminação das barreiras que hoje impedem a expansão do livre mercado.
A segunda questão é o seminário que a Frente Parlamentar Mista em Defesa das Energias Renováveis, Eficiência Energética e Portabilidade da Conta de Luz realizará na Câmara dos Deputados, no próximo dia 09 de novembro. Trata-se da oportunidade para o setor discutir os temas relacionados à portabilidade, ou seja, o direito de opção que se dá ao consumidor para que mude de fornecedor de energia elétrica. É uma mudança e tanto, pois coincide com um momento de grandes transformações em ebulição no setor elétrico, como a chegada da geração distribuída, a expansão das energias renováveis (solar e eólica) e a procura cada vez mais intensa pela eficiência energética.
E, terceiro, há no âmbito do Ministério de Minas e Energia a preocupação com a governança dos modelos computacionais, visando alterar as metodologias e o mecanismo dos dados de entrada, através de uma consulta pública aberta pelo próprio MME. Desta forma, pretende-se estabelecer, através de decisão do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), as competências e diretrizes para alterar os modelos computacionais hoje utilizados pelo ONS e que atualmente se relacionam com a formação de preços de energia elétrica.
Nesse sentido, três questões principais preocupam o MME e os agentes: a metodologia para definição da aversão ao risco, a função do custo do déficit de energia e os parâmetros de entrada dos dados, para que os modelos possam ser operados no dia a dia.
Pois bem, o fato de esses assuntos estarem em pauta revela obviamente a insatisfação generalizada quanto à sistemática vigente, de formação de preços através de cálculos matemáticos, muitas vezes desconectados da realidade e da necessária transparência. Evidentemente que na teoria a ideia de definir o preço com base nos modelos matemáticos não é desprezível, tanto que essa sistemática se manteve pelas últimas duas décadas, ainda que o descompasso entre os dados de entrada e a realidade tenha gerado muita confusão e estresse absolutamente desnecessário no setor.
Talvez essa tenha sido a melhor solução lá pelo final da década de 1990, quando o sistema elétrico, então com forte predominância da geração hídrica na sua matriz, deixou de ser totalmente estatal e uma parcela significativa passou a ser operada pela iniciativa privada. Isto mudou, e muito. Hoje predominam os agentes privados, com maior facilidade de adequação aos trâmites de mercado. E, principalmente, passamos a ter muito mais geração térmica na matriz, sendo esta a que permite formar preços por ofertas.
Portanto, este é o momento de darmos um passo além e reconhecermos essa incompatibilidade entre a realidade, que é um sistema moderno de mercado, e a continuidade no uso de um sistema matemático representado por uma enorme burocracia, que encarece o produto final.
Em muitos países, como dissemos, mais ou menos desenvolvidos e em todos os continentes, o preço da energia elétrica é fixado pelos agentes, em acordo com a oferta e procura: alguém diz que vende por tanto e alguém diz que compra por tanto, exatamente como ocorre em outros mercados. É simples assim, e funciona, inclusive sem impedir que o sistema continue a ser operado sem ser desotimizado.
Por fim, considerando as oportunidades em aberto para debater o assunto, é indispensável que representantes dos agentes, através do fórum das associações (Fase), possam participar livremente não apenas dessas discussões, mas também, na implantação das mudanças.
(*) Walfrido Avila é presidente da comercializadora Tradener.