Pela continuidade administrativa no MME
Walfrido Avila (*)
Com a evidente saturação de parte do atual modelo do setor elétrico, institucionalizado pela reforma decretada em 2004 — que separou o setor elétrico em ambientes regulado e (mais ou menos) livre — vínhamos convivendo, na última década, com a estagnação no desenvolvimento e com a repetição de velhos equívocos regulatórios, como por exemplo a limitação de preços de mercado mediante canetadas. Acumularam-se assim problemas cuja gravidade demanda soluções imediatas, sem mais espaço para postergações.
Neste cenário, destaca-se a recente e relevante atuação, à frente do Ministério de Minas e Energia, do ministro Fernando Coelho Filho, e sua equipe altamente qualificada, que apesar das dificuldades que atingem o setor público como um todo, conseguiu estabelecer e dar andamento a uma agenda adequada para enfrentar os principais problemas setoriais digna de elogios.
É verdade que ainda não foi possível atender a todos os segmentos do setor elétrico nacional. Entretanto, em linhas gerais, se está fazendo um trabalho bastante positivo, visando à modernização do SEB.
Nessa linha, destaca-se que, depois de muito diálogo, foi possível colocar de pé uma agenda relevante, representada basicamente pela proposta de privatização do Sistema Eletrobras e pela edificação de um novo modelo institucional, o qual também contempla a abertura e ampliação do mercado livre, ainda que prevendo mais um período de transição para isso.
A privatização de empresas como a Eletrobras é reivindicada pela parcela consciente da sociedade brasileira há bastante tempo, como forma de dar um basta ao financiamento, pelos contribuintes, através do Tesouro Nacional, de estatais falidas, administradas com cabides e abertas a uma série de dificuldades, ou talvez facilidades, operacionais e administrativas.
Entra Governo, sai Governo, ninguém nunca buscou de fato fazer essas estatais funcionarem de forma eficiente, sem custos adicionais para a sociedade, contando quase sempre com a passividade dos contribuintes, no fim da linha.
Quer parecer que essa passividade chegou ao fim e não tem mais sentido manter essas empresas sob o comando do Estado. É melhor realizar e estancar os prejuízos públicos, e passar as empresas para uma administração mais eficiente pela iniciativa privada.
Outra questão fundamental que apenas se começou a enfrentar foi a do risco hidrológico, que trava todo o setor elétrico há muito tempo. Apesar do profundo empenho de muita gente, não se conseguiu avançar em relação ao GSF, o que não significa que o problema deva ser esquecido.
É preciso reconhecer que essa é a verdadeira herança maldita da gestão anterior e não é uma situação fácil de ser resolvida. Entretanto, temos que continuar empenhados na busca de uma solução para o futuro, pois não tem cabimento pensar em um novo setor elétrico com a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica – CCEE paralisada por causa dos débitos de GSF.
Todavia, no que se refere à efetiva abertura do mercado de energia elétrica, hoje o Brasil está mais atrasado do que os mais atrasados países da América Latina, o que é extremamente vergonhoso. Também é necessário colocar um ponto final a esse largo atraso. Para tanto, é extremamente tímida a proposta apresentada, que ainda prevê vários anos de transição para a verdadeira liberdade de escolha por todos os consumidores.
Ora, desde que se começou a falar nessa possibilidade, já há quase 25 anos, o segmento representado pelo mercado livre é o único que tem realmente proporcionado para a indústria nacional, de forma contínua e já consolidada, ganhos econômicos efetivos e de elevado montante financeiro, facilmente mensurável.
Nestas duas últimas décadas o mercado já está suficientemente experimentado, não havendo mais que se falar em “cautela” com uma transição gradual. Neste caso, não se aplica a máxima maquiavélica de “fazer a maldade de uma vez, e o bem aos poucos”.
Urge que o “bem” representado pela total abertura do mercado livre, sem limites de escolha pelos consumidores, seja um ato de vigência imediata (a exemplo do que ocorreu, com sucesso, em vários países, onde o mercado se abriu da noite para o dia seguinte).
É portanto necessário um perfil de coragem governamental para não só colocar o assunto em discussão, mas tomar a atitude real de ampliar o mercado e permitir que outros consumidores também tenham o direito de se beneficiar das muitas coisas positivas que este mercado livre — que com muito orgulho ajudei a criar — tem condições de oferecer.
Desta forma, é natural que o anúncio referente à saída do ministro Coelho Filho do MME, até o início de abril, de modo a cumprir a legislação eleitoral e estar apto a concorrer a algum cargo eletivo, desencadeie a preocupação do setor elétrico e o debate a respeito da sua sucessão.
Neste contexto, é extremamente importante que a pessoa que venha a suceder o atual ministro, e a equipe que venha a ser reconstituída, estejam totalmente comprometidas não só com a continuidade da agenda política implementada no atual governo, como também que tenham a coragem e principalmente o apoio setorial para dizer um sonoro não a qualquer postergação.
A iniciativa privada, que representa a parcela da sociedade capaz de recolocar o Brasil na trilha do crescimento econômico, não deveria ter outra postura a não ser demandar que o novo ocupante da Pasta ministerial esteja totalmente alinhado com a política de modernização do setor elétrico, de privatização da Eletrobras e de imediata abertura do mercado livre.
Não tem qualquer sentido o Brasil perder tempo com alguém que aceite olhar pelo retrovisor, com saudade do passado e sem ação no presente. Ao contrário, tem que ser uma pessoa com perfil semelhante ao do atual ministro, com olhar visionário, elevado e para a frente, pensando e agindo com urgência no aperfeiçoamento que o nosso setor elétrico merece receber.
É fundamental, portanto, que sejam superadas as pressões em contrário e a escolha do sucessor do ministro Coelho Filho possa conduzir o novo ministro em conformidade com a plenitude da importância do MME. É uma Pasta rigorosamente vital devido ao seu peso na definição e implementação da infraestrutura, e que precisa funcionar de modo que os agentes possam programar sem sobressaltos os investimentos tão necessários à retomada do crescimento econômico do Brasil.
(*) Walfrido Avila é presidente da comercializadora Tradener