Regulação impede crescimento de redes subterrâneas
Daniel Bento (*)
Não é preciso se esforçar muito para observar emaranhados de fios espalhados pelos ares das cidades brasileiras. Eles estão por toda a parte prejudicando não apenas o aspecto visual urbano, mas causando transtornos para a população devido a recorrentes desligamentos em consequência de estarem expostos a intempéries e a toda sorte de incidentes, incluindo furto de cabos e de energia.
A exemplo do que já fazem muitos países, a solução para estes problemas é o enterramento da rede de energia, mas seu desenvolvimento esbarra na morosidade regulatória do país e na falta de interesse das concessionárias de energia e do poder público em investir neste benefício para a população.
De acordo com a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), o percentual de redes enterradas não ultrapassa a média de 2% em todo o território nacional. A título de comparação, a Holanda conta com praticamente 100% da sua rede de média tensão subterrânea. O Reino Unido e a Alemanha também apresentam boa parte de seus cabos de energia enterrados: 81% e 60%, respectivamente.
O que falta para avançarmos também no Brasil? Leis e regulamentos que promovam planejamento e incentivem investimentos nesse modelo. Últimos avanços tecnológicos vêm reduzindo os custos de construção e instalação de redes subterrâneas, sendo que os ganhos futuros com redução de manutenção e maior confiabilidade do sistema são prova de que o investimento vale a pena.
Atualmente, as novas redes subterrâneas de distribuição são oriundas de projetos isolados de revitalização em centros urbanos e históricos e de novos condomínios residenciais, comerciais ou industriais.
Recentemente, a Comissão de Cultura da Câmara dos Deputados aprovou a proposta que torna obrigatória a utilização de redes subterrâneas de distribuição de energia elétrica em conjuntos urbanos tombados ou que tenham valor histórico e cultural reconhecido pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). A medida está prevista no Projeto de Lei 798/11, do deputado Paulo Abi-Ackel (PSDB-MG), e ainda passará por outras comissões.
Seria oportuno aproveitar o momento que estamos passando por reformas e ajustes de políticas públicas para iniciar essa ação de planejar o enterramento das redes de distribuição e telecomunicações em nossas principais cidades de forma mais abrangente para colher futuramente os frutos dessa conversão, como reorganização da rede elétrica, maior confiabilidade e segurança, além de cidades esteticamente mais agradáveis.
Esperamos da Aneel e outros órgãos competentes comprometimento com o sistema elétrico nacional e medidas que realmente impactem positivamente na qualidade da energia fornecida aos brasileiros.
*Daniel Bento é engenheiro eletricista e membro do Cigré, onde representa o Brasil em dois grupos de trabalho sobre cabos isolados. Atua há mais de 25 anos com redes isoladas, tendo sido o responsável técnico por toda a rede de distribuição subterrânea da cidade de São Paulo. Atualmente, é diretor executivo da Baur do Brasil.