Transmissão de energia busca soluções para os gargalos
Maurício Corrêa, de Brasília —
Em 2016, calcula-se que o segmento de transmissão precisará receber investimentos totais da ordem de R$ 36 bilhões. Mas a conta ainda não fechou, pois existem muitas variáveis que prejudicam a atração dos investimentos. Todo mundo está preocupado (governo, agentes e investidores) em encontrar soluções para permitir que a área de transmissão possa ter mais investimentos, que por sua vez possam escoar os megawatts gerados pelo parque gerador, como ficou bem claro, nesta quinta-feira, 14 de abril, durante o evento promovido, em Brasília, pelo Instituto Acende Brasil e pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).
“A transmissão tem um grande desafio pela frente, devido à expansão do setor elétrico”, afirmou o diretor-geral da Aneel, Romeu Rufino. Ele acredita que o modelo do setor elétrico é “robusto e bem sucedido, um orgulho para todos nós”, mas, como qualquer modelo, precisa ser revisitado. Na sua opinião, está na hora de mexer nas bases do modelo voltado para o segmento da transmissão. “Aperfeiçoamentos precisam ser feitos”, disse o diretor, comentando depois que o leilão de linhas realizado nesta quarta-feira, em São Paulo, teve um bom resultado, considerando o cenário atual da economia brasileira. “Foram R$ 7 bilhões de investimentos em transmissão, o que é um resultado expressivo”, frisou, mas deixando claro que o Brasil pode ter resultados melhores nesse campo.
Uma das situações que, na visão de Rufino, permitem supor que o modelo para a transmissão é robusto é o fluxo financeiro do setor. Ele lembrou que, no passado, houve problemas de falência de toda a cadeia negocial, mas, hoje, o fluxo financeiro está garantido aos empreendedores nos próprios contratos de concessão. “Precisamos atrair mais investimentos. Temos hoje uma retração de demanda, que, no entanto, é passageira”, afirmou o diretor da Aneel.
O professor Maurício Tolmasquim, presidente da EPE, que foi um dos participantes do primeiro painel do evento, pode ter uma solução para o problema citado por Rufino. Na sua opinião, o desafio do momento consiste em estimular investidores da área de geração a participar também de leilões de transmissão. Ele lembrou que foi criado um grupo de trabalho no âmbito do Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE), que está examinando opções que possam ir de encontro a essa proposta.
Além disso, segundo Tolmasquim, o GT se preocupa com outras questões, como tornar o estudo ambiental mais factível, de modo que seja uma etapa que não assuste empreendedores na área de transmissão. O GT também se preocupa com as questões fundiárias, que impactam fortemente a transmissão devido ao fato de as linhas atravessarem quilômetros e mais quilômetros de terras por todo o país.
Nesse contexto, cruzando rios ou invadindo áreas de florestas ou de cerrado, as linhas de transmissão constituem um problema de natureza ambiental, encontrando forte resistência nos órgãos de proteção do meio ambiente, razão pela qual o GT está buscando alternativas que permitam dialogar com os ambientalistas, buscando as tão sonhadas licenças que transformem os projetos de transmissão em realidade.
O presidente da EPE foi sincero ao admitir que o planejamento do setor elétrico considera o crescimento do mercado e a expansão da geração, mas tem de fato muitas dificuldades para acertar 100% naquilo que é planejado, devido às dificuldades próprias da economia. “Temos que sincronizar o planejamento com a expansão da transmissão. No caso das hidrelétricas, você não pode licitar sem saber que elas vão mesmo sair do papel. Entretanto, no caso da carga, é muito difícil fazer a previsão com antecedência”. Ele citou o exemplo de uma montadora de automóveis, que de repente é criada em uma região onde não havia qualquer previsão para esse tipo de carga. O jeito então é se adaptar às circunstâncias da carga que surge repentinamente.
O diretor-geral do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), Hermes Chipp, é provavelmente o especialista do setor elétrico que mais entende carga de energia. Ontem, sem usar essas palavras, ele reconheceu que algo que faz a sua pressão subir é descobrir que uma obra só entrará efetivamente em serviço depois do prazo. E atraso nas linhas de transmissão é algo que tem deixado Chipp sem sono. Por isso, ele entende que o primeiro desafio é garantir a entrada das obras de transmissão dentro dos prazos contratuais, para que o sistema possa ser otimizado. Ele defende, há algum tempo, a proposta de realização de leilões regionais para a transmissão.
Para o diretor Reive Barros, da Aneel, 91% dos empreendimentos de transmissão estão concentrados nas 10 maiores empresas do segmento. Ele esclareceu que o atraso médio das linhas é de 16,5 meses, enquanto nas subestações o atraso é de 12,3 meses. Reive não tem dúvidas: existe espaço para rever o planejamento para a transmissão, em busca de melhores resultados.
Nesse contexto, ele acredita que é possível rever não só a regulação, mas também o próprio mecanismo das licitações, selecionando melhor os participantes dos leilões. Outra necessidade é tornar o leilão mais atrativo. O próprio Tolmasquim lembrou no painel que “algumas vezes, empresas grandes (estatais ou privadas) entram no leilão, mas não vão até o fim”. Para Reive, o aperfeiçoamento passa rigorosamente pela seleção dos participantes, de modo a se restringir “a participação de aventureiros”.
A Aneel tem perdido horas e horas, buscando soluções para a questão da transmissão. No momento, investe fortemente em um acompanhamento mais próximo das atividades dos empreendedores, com a realização de reuniões trimestrais. Segundo Reive, isso tem contribuído para minimizar os problemas. Tanto Tolmasquim quanto Chipp tem um diagnóstico semelhante: é fundamental fazer com que o planejamento da transmissão seja cada vez mais próximo das necessidades da Operação do setor elétrico.
No segundo painel, falando em nome da Associação Brasileira das Empresas de Transmissão de Energia Elétrica (Abrate), o presidente da Companhia de Transmissão de Energia Elétrica Paulista (CTEEP), Reynaldo Passanezi, mostrou com clareza que a realidade das linhas já existentes também não é fácil. Ele explicou que a transmissão já representou 9% das tarifas de energia elétrica, mas que hoje não atingem 3%.
Além disso, existe um total de R$ 25 bilhões de indenizações pendentes, que o Tesouro deve aos empreendedores, como resultado da MP 579. “É impossível não falar deste assunto”, afirmou Passanezi, para quem é fundamental que os pagamentos de fato comecem a ser feitos no meio do ano, como está previsto. Esse dinheiro, como definiu, “é o oxigênio necessário para recuperar a capacidade financeira das empresas”, considerando a sua tese que o segmento está “extremamente deficitário”.
Élida Almeida, coordenadora geral substituta de Sistemas Financeiros do Ministério da Fazenda, fez uma apresentação sobre o uso de debêntures de infraestrutura como alternativa de financiamento para as empresas, lembrando que a área de energia é o segundo setor na emissão desse tipo de papel, só perdendo para projetos rodoviários. Eduardo Chagas, da área de infraestrutura do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), explicou que a instituição está estudando com o mercado segurador a adoção de seguro-garantia no financiamento para o setor elétrico, mas esse tipo de produto ainda não virou realidade.