1ª cooperativa de energia começa a funcionar em agosto
Maurício Corrêa, de Brasília —
A primeira cooperativa de energia renovável do Brasil já tem data para entrar em funcionamento. Será no dia 05 de agosto próximo, quando começa a operar uma micro-usina de energia solar fotovoltaica, com capacidade de 75 KWp, segundo informou a este site o advogado ambientalista Raphael Sampaio Vale, presidente da Cooperativa Brasileira de Energia Renovável (Coober), da cidade paraense de Paragominas (300 km de distância em linha reta da capital do Pará, Belém).
Colocar a Coober em operação tem sido uma verdadeira epopeia, mas Vale e os demais 21 cooperados estão entusiasmados com o projeto, que representa um corte na história do setor elétrico brasileiro. “Por aqui, muita correria. Todos nós, da Coober, estamos na expectativa de começar a gerar a nossa própria energia elétrica, de fonte limpa, sem agredir a natureza e sem causar prejuízos às populações que normalmente são afetadas pelos grandes projetos”, afirmou Raphael Vale.
A cooperativa fez um processo de seleção do fornecedor dos equipamentos. Recebeu oito propostas e acabou optando pela empresa Axitec. Até entrar em operação, no Distrito Industrial de Paragominas, a micro-usina solar representará investimentos da ordem de R$ 600 mil, bancados totalmente com recursos próprios dos cooperados.
“Estamos ajustando os últimos detalhes e, de certa forma, estamos pagando o preço do pioneirismo. Mesmo assim, temos consciência do que fazemos. O projeto é piloto e queremos entender primeiramente como tudo funciona, de modo que, numa segunda etapa, seja possível expandir a usina, receber novos cooperados e aumentar a faixa dos benefícios que serão gerados pela nossa própria usina”, disse a este site o presidente e idealizador do projeto.
Todos estão conscientes que a pequena usina de Paragominas é uma espécie de grão de areia em relação ao gigantesco sistema elétrico brasileiro, mas aqui também o tamanho não é o que importa. E, de fato, entusiasmo e vontade de colocar o projeto em funcionamento não faltam ao grupo. No final de maio e início de junho, Raphael Vale e mais dois cooperados tiraram dinheiro dos próprios bolsos e bancaram uma viagem à Alemanha, para conhecer como funcionam as usinas de energia renovável naquele país.
A Alemanha é uma referência para o projeto de Paragominas. Lá, existem 822 cooperativas de energia, sendo que mais de 700 são de energia renovável. “Fomos lá para entender como funciona e observamos que, embora muito à frente do Brasil nesse campo, eles enfrentam as mesmas dificuldades que temos aqui no Brasil, principalmente como se integrar na rede de distribuição local”, explicou Vale.
Ele lembrou que que a Coober tem apoio institucional da Confederação Alemã de Cooperativas (DGRV) e trabalha em parceria com o Ministério das Cidades (Probiogás) e a agência alemã para cooperação e desenvolvimento (GIZ), além do apoio da Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), Governo do Estado do Pará e Prefeitura Municipal de Paragominas.
A assembleia de constituição da Cooperativa Brasileira de Energia Renovável (Coober) foi realizada no dia 24 de fevereiro, a partir da iniciativa de 22 cooperados que querem ser os gestores da própria energia elétrica que consumirão. São advogados, biólogos, engenheiros agrônomos e eletricistas e outros profissionais. “Nosso objetivo é produzir a energia que cada um vai consumir. Somos um grupo de amigos que tem uma visão de mundo diferente, no qual a produção será descentralizada e com base nas energias renováveis”, explicou Raphael Sampaio Vale.
Paragominas é um município emblemático em relação ao meio ambiente. Começou a surgir na época da construção da rodovia Belém-Brasília, a partir do deslocamento de populações que se dirigiam para o polo de desenvolvimento representado pela construção da nova capital federal. Foi um processo caótico de ocupação das terras, que se intensificou durante o regime militar, atraindo muita gente de outras regiões do País (do sul, de Minas Gerais, Goiás e do Espírito Santo), o que acabou gerando uma forte especulação imobiliária e muitos conflitos pela propriedade das terras.
Formalmente, o município de Paragominas somente foi criado em 1965, no meio de um processo caracterizado por muita violência. Chegou a ser conhecido como “Paragobala”. pois lá contava a lei do mais forte. Houve uma grande evolução com o tempo. “Hoje, Paragominas é Paragobela”, festejou Vale, esclarecendo que a data de inauguração no dia 05 de agosto ocorrerá na véspera da abertura da 50ª Feira Agropecuária local, quando também ocorrerá a 3ª Semana de Debates Ambientais. “O nosso projeto está no meio desse contexto: ocupar uma pequena parcela de terra, gerar a própria energia elétrica e promover o desenvolvimento em bases sustentáveis. A Coober é para ser vista dentro de uma concepção diferente de vida. Não temos ilusões, mas fazemos a nossa parte”, frisou.
A Coober tem como base o mesmo espírito que leva as pessoas a consumirem alimentos orgânicos, por exemplo, em vez de produtos industrializados e pouco saudáveis. Só que agora, em vez de consumir compulsoriamente uma energia elétrica gerada por uma usina que leva ao desaparecimento de uma parte da floresta, que inunda reservas indígenas ou de uma térmica a óleo combustível que joga diariamente toneladas de veneno na atmosfera, os integrantes da cooperativa estão fazendo a opção para consumir uma energia limpa, produzida e distribuída por eles mesmos.