Atento, mercado de energia quer saber o que vem depois das liminares
Maurício Corrêa, de Brasília —
No mercado de energia elétrica, hoje, existe basicamente uma única pergunta: o que o Governo (leia-se Ministério de Minas e Energia) pretende fazer em relação ao GSF, agora que as liminares de vários agentes estão sendo cassadas?
Uma outra pergunta desdobra-se dessa principal e é a seguinte: qual será o impacto efetivo da suspensão das liminares nas geradoras que atendem ao mercado livre, principalmente aquelas que são de pequeno porte?
As consequências são imprevisíveis, até mesmo porque os números são gigantescos. Uma associação fez uma simulação a pedido deste site e o resultado de quatro pequenas centrais hidrelétricas (PCH´s) que agora precisarão pagar o GSF pode superar, em casos específicos, 15% do valor de equity, ou seja, é um valor que não cabe no fluxo de caixa do empreendimento, praticamente impagável. Presume-se que o resultado disso tudo será um forte aumento da inadimplência.
Em termos práticos, isto significa que o que o Governo resolveu chamar de “desjudicialização”, ou seja, a anulação de decisões judiciais que evitavam o pagamento do GSF, pode ser boa para destravar o mercado de curto prazo, mas não resolve o problema do GSF em si.
Além disso, fica muito claro para os agentes que os geradores não controlam as suas próprias operações e podem, sim, ser afetados por decisões operativas do Governo, principalmente as desastradas como parece ser a que gerou essa confusão do GSF.
Vale a pena recapitular: esse problema só está ocorrendo porque o Governo Dilma tecnicamente deveria ter adotado o racionamento de energia elétrica, em 2014, mas, como era ano eleitoral e o Brasil vivia sob a égide do populismo bolivariano, em vez de determinar ao ONS que aplicasse o corte de energia, o Governo fez exatamente o contrário: ao ONS foi determinado que a operação fosse feita no sentido de acumular água nos reservatórios a qualquer custo.
Também é bom voltar à História: várias razões levaram à vitória presidencial do PT em 2002 e uma delas, com certeza, foi a intensa utilização política do racionamento aplicado em 2001 e 2002 pelo Governo FHC. Na visão do PT — correta sob o aspecto de uma disputa eleitoral — o partido que ganhou as eleições em 2002, em parte graças ao racionamento de energia, corria o risco de perder a eleição de 2014 pela mesma razão, pois, então, o PSDB utilizaria a mesma arma eleitoral contra o PT. Resultado: isso implicou em despacho fora da ordem de mérito das geradoras térmicas. Aí, a energia de reserva e as térmicas acabaram deslocando a energia hídrica e deu no que deu.
Naquele momento, os geradores estavam prontos para produzir energia elétrica e jogar no sistema, mas o ONS também entrou na onda populista e a conta foi mandada depois para os geradores. Estes não aceitaram e entraram com recursos na Justiça, para não serem obrigados a pagar o chamado “déficit de geração hidríca”, pois a decisão de gerar fora da ordem do mérito, afinal, era de natureza política e esse custo deveria ser pago pelo Governo, no entendimento dos geradores.
Em resumo, essa é a história. Este site conversou com empreendedores de pequenas centrais hidrelétricas. Uma das associações que os representam, a Abragel, era possuidora de uma liminar (agora cassada), que limitava o pagamento ao limite usual de 5%.
No entendimento desses agentes de PCH´s, os excessos ocorridos em 2014 e 2015 foram motivados por questões alheias ao despacho na ordem de mérito (razões políticas). Quando se enquadram na ordem de mérito, os agentes conseguem prever, dimensionar e se proteger em relação aos despachos, mas, quando estão fora da ordem de mérito, aí é um Deus nos acuda.
Embora a Aneel entenda que foi dada uma alternativa de repactuação, a proposta para o ACL foi piorada pela agência reguladora e tornou-se inviável, tanto que a adesão foi de zero por cento. Naturalmente, esses agentes continuam defendendo o não pagamento, embora tenham perdido a liminar que os protegia.
Um agente lembrou que a própria lei que estabeleceu as regras da repactuação do risco hidrológico (Lei 13.203, de 08 de dezembro de 2015), determinou que os custos do deslocamento da geração hidrelétrica decorrente da geração termelétrica que exceder aquela por ordem de mérito e daquele devido à importação, deverão ser excluídos do cálculo do GSF.
Somente agora a Aneel está regulamentando essa lei visando ao abatimento do despacho fora da ordem de mérito para o ano de 2016 em diante. Já o ONS vem sinalizando que despachos térmicos fora da ordem de mérito, daqui para frente, só em casos de extrema necessidade. Os movimentos atuais da Aneel e do ONS reforçam a tese de que o uso do modelo, tal como feito em 2014/2015, não era adequado.