Venda de usina na Nicarágua põe fim ao sonho internacional da Eletrobras
Maurício Corrêa, de Brasília —
O sonho de internacionalização da Eletrobras, adubado nos anos do petismo como um dos símbolos da expansão geopolítica do Brasil, chegou ao fim de forma melancólica. Nesta segunda-feira, 25 de julho, a estatal distribuiu um comunicado aos acionistas e ao mercado em geral, informando que, no último dia 22, a Centrales Hidrelectricas de Centroamerica, na qual a Eletrobras detém 50% do capital social, vendeu a totalidade das ações de sua subsidiária integral Centrales Hidrelectricas de Nicaragua, detentora da concessão do projeto hidrelectrico de Tumarin, localizado na Nicaragua, com potência instalada de 253 MW, pelo valor total de U$ 44,2 milhões. A Eletrobras sai com prejuízo do negócio.
A venda foi efetuada para a Empresa Nicaraguense de Eletricidad – Enel (sem relação com a companhia elétrica italiana do mesmo nome), que é uma estatal nicaraguense de energia e para a Distribuidora de Electricidad del Norte S.A – Disnorte, que será a compradora da energia elétrica a ser gerada, o que possibilitará a continuidade do projeto.
Segundo o comunicado assinado pelo diretor financeiro e de relações com investidores da Eletrobras, Armando Casado de Araújo, o projeto da usina de Tumarin era o único desenvolvido pela CHC, através da subsidiária integral CHN, que foi vendida. Agora, serão adotadas providências legais visando ao encerramento da participação da Eletrobras na CHC. O investimento da Eletrobras na CHC, registrado nas Informações Financeiras do primeiro trimestre de 2016, era de R$ 87,8 milhões, existindo, porém, provisão para perdas do investimento na totalidade do valor investido.
Arautos da estratégia do PT de ocupar espaços no planeta saudaram a operação internacional da Eletrobras, no Governo Lula, como uma manobra de genialidade. Tudo, enfim, era parte da mesma estratégia que moldou a política exterior do Brasil nos anos petistas, quando foram criadas embaixadas por países da África e da Ásia, sem qualquer estudo de viabilidade, baseando-se apenas numa visão ideológica. Hoje, essas embaixadas estão praticamente abandonadas e algumas sequer dispõem de recursos para cobrir as despesas do pessoal diplomático brasileiro.
Também está relacionada com a estratégia de criação das chamadas “empresas campeãs nacionais”, quando alguns grupos fartamente irrigados com dinheiro barato do BNDES (Eike Batista, JBS, LBR, Brasil Telecom, Fíbria, Marfrig, por exemplo) na teoria seriam os pontas de lança da nova economia brasileira, ocupando mercados da Patagônia ao Canadá, do Cabo da Boa Esperança a São Petersburgo, da Turquia a Vladivostok.
Da mesma forma, mas principalmente na África, uma outra estatal, a Embrapa, também passou por um processo de internacionalização e em vários momentos se transformou em verdadeiro braço do Governo brasileiro, atuando livremente em alguns países e até com mais desenvoltura que as próprias embaixadas. Pretendia-se fazer o mesmo com a Eletrobras, que chegou a examinar projetos hidrelétricos em países africanos, como o Congo. À Eletrobras estava desenhado um papel semelhante, na área de energia, aproveitando o inegável conhecimento que a empresa reúne na área de energia elétrica, principalmente em projetos de geração e transmissão.
O projeto de internacionalização da Eletrobras nasceu efetivamente em 2008, com a Lei 11.651, que permitiu a atuação da Eletrobras em outros países, com ou sem aporte de recursos, com ou sem controle acionário dos projetos a serem desenvolvidos. Até então, a única experiência internacional da Eletrobras era a participação, em partes iguais, na binacional Itaipu, junto com o Governo do Paraguai.
Em março de 2010, quando divulgou a sua nova visão empresarial, a estatal dizia, sem modéstia, que, em 2020, pretendia ser o maior operador global de energia limpa, com rentabilidade comparável às melhores empresas do setor elétrico. Como estava desenhado que a Eletrobras seria uma das campeãs nacionais, no ano seguinte a empresa foi retirada dos cálculos do déficit primário do Governo Federal, o que abria caminho para a realização de investimentos no exterior. Então, a sua prioridade no cenário mundial eram Argentina, Estados Unidos, Colômbia e Peru.
O projeto de Tumarin não fazia parte das prioridades de atuação internacional, mas não se pode esquecer que, dentro do Palácio do Planalto, havia um aliado de primeira linha do presidente sandinista Daniel Ortega, que era o então todo poderoso assessor especial de Política Externa do presidente Lula, professor Marco Aurélio Garcia, que, aliás, mandava mais do que o Itamaraty.
Oficialmente, a principal razão que levaria à internacionalização da Eletrobras era aumentar o valor de mercado da empresa. Tudo foi por água abaixo, a partir de 2012, quando a presidente Dilma Rousseff, em uma das decisões mais infelizes tomadas por um presidente da República do Brasil, assinou a MP 579, que, entre outras consequências, jogou a Eletrobras no chão e simplesmente destruiu o seu valor de mercado.