Eletrobras em busca da verdade
Da Redação, de Brasília (Com apoio da Eletrobras) —
Foi muito mais rápido do que se esperava. A Bolsa de Valores de Nova York (NYSE) comunicou à Eletrobras que os papéis denominados ADS “American Depositary Share” da estatal voltam a ser negociados junto à NYSE a partir de hoje, 13 de outubro. Além disso, a bolsa confirmou que o processo de deslistagem da Eletrobras foi cancelado, o que normaliza totalmente as operações da estatal brasileira junto aos investidores nos Estados Unidos. Na última terça-feira, dia 11, a Eletrobras havia arquivado na Securities and Exchange Commission (SEC, equivalente à Comissão de Valores Mobiliários nos Estados Unidos) os formulários denominados 20-F, referentes aos exercícios de 2014 e 2015, que haviam causado a retirada dos papéis da empresa brasileira das negociações na NYSE.
Surpreendida pela retirada dos seus papéis do mercado de Nova York, porque os balanços dos dois exercícios não estavam assinados pela auditoria independente e havia muitas ressalvas, a Eletrobras mergulhou profundamente na questão, não apenas para entender o que havia motivado a decisão da NYSE, mas, também, para verificar internamente o que havia acontecido e resolver as pendências.
Na realidade, a Eletrobras se declarou surpreendida por muita coisa, principalmente por denúncias pesadas de corrupção, que levaram o ex-diretor de Operações, Walter Cardeal, a ser conduzido coercitivamente para depoimento na Polícia Federal e, mais do que isso, resultaram na condenação do ex-presidente da Eletrobras Eletronuclear, Othon Luiz Pinheiro da Silva, a uma pena pesada de 43 anos de prisão pelo juiz da 7ª Vara Criminal Federal, por corrupção passiva, lavagem de dinheiro, obstrução de justiça, evasão fiscal e participação em organização criminosa.
“Conforme amplamente divulgado ao mercado, o arquivamento dos Formulários 20-F foi adiado pela Companhia, de modo que fosse possível concluir investigação interna independente sobre determinadas alegações relativas à “Operação Lava Jato” e, dessa forma, completar as informações relacionadas a ela nos referidos relatórios anuais, em
conformidade com a legislação estadunidense aplicável”, destacou um comunicado ao mercado e aos acionistas distribuído pela estatal.
De fato, em 2009, as autoridades federais brasileiras focaram as investigações da “Operação Lava Jato” em organizações criminosas envolvidas em lavagem de dinheiro. Então, desde 2014, o Ministério Público Federal dirigiu parte das investigações para irregularidades envolvendo empreiteiros e fornecedores de empresas estatais.
“Embora nenhuma acusação criminal tenha sido movida diretamente contra a Companhia no âmbito da “Operação Lava Jato”, até este momento, o Ministério Público Federal conduziu investigações sobre irregularidades envolvendo alguns funcionários, empreiteiros e fornecedores da Companhia e de suas subsidiárias, bem como certos empreiteiros e fornecedores de sociedades de propósito específico (“SPEs”) nas quais a Eletrobras e/ou suas subsidiárias detém participações acionárias minoritárias. Esses projetos são relacionados a usinas de geração de energia elétrica”, admitiu a empresa.
Com papéis listados na bolsa de Nova York, a Eletrobras não podia ficar em cima do muro e fingir que não estava acontecendo nada dentro da empresa. Contratou o escritório de advocacia Hogan Lovells US LLP para realizar uma investigação interna independente com o propósito de avaliar a eventual existência de irregularidades, incluindo violações ao U.S. Foreign Corruption Practice Act (FCPA), à Lei Brasileira Anticorrupção e ao Código de Ética da
Eletrobras (a “Investigação Independente”).
Além disso, constituiu uma comissão, em 31 de julho de 2015, para acompanhar o trabalho do escritório americano. Essa comissão é constituída pela ministra Ellen Gracie Northfleet, aposentada do Supremo Tribunal Federal, por Durval José Soledade Santos, ex-diretor da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e por Manoel Jeremias Leite Caldas. “A Companhia, o Hogan Lovells e a Comissão Independente têm acompanhado de perto as investigações oficiais e cooperado com as autoridades brasileiras e americanas, incluindo a Justiça Federal, o Ministério Público Federal (“MPF), a Comissão de Valores Mobiliários (“CVM”), o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (“CADE”), o United States Department of Justice (“DOJ”) e a United States Securities & Exchange Commission (“SEC”), entre outros, e têm atendido às solicitações de informações e documentos por parte dessas autoridades”, esclareceu o comunicado ao público.
Em 06 de julho de 2016, a Polícia Federal iniciou a “Operação Pripyat”, tendo sido cumpridos mandados de prisão, expedidos pelo juiz da 7ª Vara Federal da Comarca do Rio de Janeiro, contra ex-diretores que já haviam sido suspensos pelo Conselho de Administração da Eletrobras, bem como contra outras partes. Em 27 de julho de 2016,
o Ministério Público Federal denunciou formalmente tais ex-diretores por corrupção, lavagem de dinheiro e obstrução de justiça.
Os resultados da investigação feita até agora foram informados à SEC e a Eletrobras mostrou claramente que encontrou indícios de superfaturamento e pagamento de propina por fornecedores e construtores. A empresa revelou que os relatórios finais da investigação independente “incluem certas descobertas com seus respectivos impactos, qualitativos e quantitativos, nas demonstrações financeiras da Companhia relacionadas a alguns, mas não todos, os projetos de geração de energia que estão incluídos no âmbito da Investigação Independente”. A Eletrobras adiantou que os relatórios apresentam superfaturamentos relativos “à propina e práticas de cartel, considerados ilegais no âmbito de alguns contratos dos projetos investigados, os quais foram celebrados, desde 2008, com certos empreiteiros e fornecedores”.
A investigação estimou que a extensão dos impactos estimados da propina é de 1% a 6% do valor do contrato e ainda determinados montantes fixos, enquanto o impacto estimado do cartel é de 10% dos pagamentos relativos a um contrato específico (R$ 16 milhões). A empresa afirma que a investigação descobriu propinas utilizadas para financiar pagamentos indevidos a partidos políticos, funcionários eleitos ou outros funcionários públicos, além de outros agentes. “A maior parte dos pagamentos supostamente indevidos foi feita pelos empreiteiros e fornecedores e por intermediários (…)”.
Em consequência da investigação, a Eletrobras fará uma baixa contábil de R$ 302,586 milhões nos anos de 2014 e 2015, sendo o maior impacto no primeiro ano de R$ 286,590 milhões. Os maiores prejuízos são relacionados as obras das usinas de Angra 3 e Mauá 3. A empresa reconheceu ainda uma perda de R$ 91,464 milhões nos seus resultados de 2014 por meio do método de equivalência patrimonial. As demonstrações refletem despesas com custos de R$ 195,127 milhões, em 2014, e R$ 15,996 milhões, em 2015.
“A Eletrobras informou que está tomando medidas para melhorar a governança. A empresa lembrou que houve punição com afastamento e desligamento de funcionários, suspensão de contratos, e a criação da diretoria de governança. Além disso, está desenvolvendo uma série de medidas e iniciativas denominadas “Programa Eletrobras de 5 Dimensões”, que abrangem o desenvolvimento de uma nova cultura corporativa; avaliação de risco periódica; melhoria de políticas e procedimentos internos; promoção interna do compliance; e monitoramento contínuo, ações corretivas e de remediação para os resultados da investigação”, informou a empresa.