Edvaldo Santana: “Precisamos de um novo Projeto Reseb”
Maurício Corrêa, de Brasília —
O Exército brasileiro perdeu um sargento de Infantaria que um dia pensou em fazer o curso de Guerra na Selva e o mundo do futebol deixou de ganhar um meio-de-campo talentoso, que entregava a bola no pé e gingava com elegância, na época em que o sistema de jogo era o 4-2-4. Em compensação, o mundo da energia elétrica ganhou um especialista, que é considerado um dos melhores craques na área de Regulação em todo o País.
Com 63 anos de idade, Edvaldo Alves de Santana é sergipano de Aracaju e com facilidade se destaca entre os brancos que dominam a energia elétrica brasileira. Filho de negro com índia, foi criado na Praia de Atalaia, na sua cidade natal, numa comunidade onde praticamente quase todo mundo era parente. Seu pai, descendente de escravos, ainda nascido na antiga senzala, possuía uma certidão de nascimento coletiva, emitida para mais 12 filhos de escravos, como era costume na época.
Seus pais eram pobres (a mãe, dona Valdice, funcionária pública estadual; o pai, senhor Reginaldo, pedreiro). Desde a infância, Edvaldo já demonstrava enorme aptidão para o conhecimento da Matemática, o que o destacaria em toda a vida profissional. Com menos de cinco anos, ele já conhecia a tabuada de cor. Sem ter com quem ficar, enquanto os pais iam trabalhar, acompanhava os dois irmãos mais velhos à escola e aprendeu as quatro operações e a ler e escrever antes mesmo de começar formalmente o antigo curso primário. Passava mais tempo com a avó materna, dona Júlia, uma índia com grande liderança na comunidade da Praia do Atalaia, que era quase uma reserva indígena.
Embora a família fosse pobre, ele e os irmãos tiveram a oportunidade rara naquele período de estudar em uma escola particular. Em um golpe de sorte, sua mãe achou na rua um bilhete premiado nominal de um programa da Fazenda estadual de incentivo à emissão de notas fiscais e recolhimento dos impostos. Sua mãe, possuidora de critérios elevados de honestidade, foi à casa da dona do bilhete premiado e entregou o precioso achado.
Proprietária de uma escola particular, essa senhora, em retribuição, permitiu que os três filhos de dona Valdice estudassem de graça no Educandário João Henrique Pestalozzi, de Aracaju, onde Edvaldo cursou o primário. Depois ele fez o antigo ginasial no Colégio Estadual e o industrial na antiga Escola Industrial de Sergipe. Nessa época, conheceu o jornalista Anselmo Góis, estudante do Tobias Barreto, que ficava quase ao lado do Estadual.
Entrando na adolescência, Edvaldo já havia percebido que fora da Educação não havia solução, pois não nascera em berço de ouro. Simultaneamente, fez o curso de Eletrotécnica, de manhã, e o antigo Científico, à noite. E era ajudante de pedreiro do próprio pai (naquela época, menores de idade podiam trabalhar e possuíam “Carteira de Trabalho de Menor”). Depois das primeiras lições no ofício do pai, passou a ser um pedreiro quase profissional. “Tenho orgulho em dizer que bati muita laje e assentei muito tijolo em Aracaju, tudo isso com menos de 16 anos”, afirmou a este site. Como ajudante do pai ou como pedreiro, muitas vezes trabalhou na casa de colegas de escola, que talvez não entendessem o que estava acontecendo.
Com 15 anos, Edvaldo já tinha total intimidade com marretas, serrotes, ponteiros, talhadeiras, martelos de unha, esquadros e prumos. Já sabia bater o nível corretamente e não fazia feio na hora de cortar cerâmicas. Se tivesse que seguir a profissão do pai, já estava na direção certa. Só que o sonho do garoto sergipano era maior do que isso: queria se formar, ser professor.
Bom no domínio da Matemática, ganhou de presente um livro publicado originalmente em 1938, que fez muito sucesso entre os adolescentes ainda nos anos 70: “O homem que calculava”, do escritor Malba Tahan, pseudônimo de Julio Cesar de Mello e Souza, professor e educador, que foi um dos maiores divulgadores da Matemática no Brasil. “Não sabia exatamente como isso aconteceria, mas eu percebia que minha vida teria alguma relação direta com os números. Não tinha como fugir disso”, afirmou.
Só que o mundo do jovem Edvaldo não era apenas a Matemática ou o aprendizado das artes básicas da construção civil. Ele também gostava de futebol e jogava bem nas categorias de base do Cotinguiba (um bairro de Aracajú). “Eu era muito bom de bola, modéstia à parte”, comentou.
Em 1970, foi morar no Rio de Janeiro, sozinho. Com muito sacrifício, foi bancados pelos pais durante vários meses. Como gostava de futebol, se apresentou no infanto-juvenil do América, um clube de futebol da Tijuca que gozava ainda de algum prestígio na época.
“Fui um meio de campo de razoável qualidade sabia tocar a bola com elegância e acho que até teria sucesso no futebol”, garantiu, mas não era o que queria. Via por lá grandes craques, como os dois irmãos de Zico, Edu e Antunes. Chegou a jogar contra Roberto Dinamite, que, na mesma época, pertencia às categorias de base do Vasco da Gama.
Ao concluir o curso secundário, um fato mudou a sua história de vida: a morte do pai, em Aracaju. Sem condições de se manter, abandonou de vez o sonho do futebol e foi incorporado ao Exército, como recruta, de onde saiu como Terceiro Sargento. No Exército aprendeu a ser disciplinado, às vezes até em excesso, como sua quase obsessão pelo cumprimento de horário. Era com o soldo de sargento que pagava os estudos.
No Rio de Janeiro, estudou Engenharia. Fez o curso noturno, enquanto servia em um batalhão de Infantaria durante o dia. Formou-se em 1976 e, pouco antes, em outubro de 1975, já era empregado da Eletrosul, que funcionava no Rio de Janeiro, no prédio vizinho ao da antiga Confederação Brasileira de Desportos (CBD), hoje CBF. Seu período de vida militar somou quatro anos e meio.
Em 1º de março de 1977, foi transferido para Florianópolis, junto com todo o pessoal da Eletrosul, que estava mudando de endereço, dentro da estratégia do regime militar de ter uma grande estatal de geração e transmissão, como subsidiária da Eletrobras, operando em cada região do País.
Na capital catarinense, até para se ambientar na nova cidade, fez o vestibular para Economia na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), onde se graduou em 1981. Um ano depois, já fazia parte do corpo de professores do curso de Economia da UFSC e simultaneamente trabalhava na Eletrosul. Em Santa Catarina, casou-se pela primeira vez e teve três filhos, dos quais tem uma neta (hoje, está casado há 15 anos com Luísa, uma psicóloga e advogada que conheceu na Aneel, em Brasília).
Aos poucos, começou a encontrar uma convergência entre o seu gosto pela Matemática e o setor elétrico e foi se especializando no complexo mundo das tarifas de energia elétrica. Acabou participando do grupo de tarifas que existia no antigo Departamento Nacional de Águas e Energia Elétrica (DNAEE), em Brasília, em 1988. Pelo menos uma semana por mês estava em Brasília, no DNAEE. Quatro anos depois, aproveitou uma oportunidade e optou por um Programa de Demissão Voluntária da Eletrosul. Sem vínculos com o DNAEE, ficou numa espécie de ponte aérea entre Brasília e Florianópolis, onde continuava dando aulas na UFSC. Em 1993, passou a ser professor em dedicação exclusiva.
Edvaldo Santana concluiu o mestrado em 1985 e o doutorado em 1993, ambos na área de planejamento dos sistemas elétricos. Quase no apagar das luzes de 1994, foi o primeiro colocado no concurso para professor titular do Departamento de Economia da UFSC. Ele se orgulha de ter orientado mais de 70 teses entre mestrados e doutorados, mais de 30 com esta última titulação. Na lista de pessoas que foram por ele orientadas está Elbia Silva Gannoum, presidente da Abeeólica, de quem orientou o mestrado e o doutorado. Poucos sabem, mas Edvaldo talvez tenha sido o primeiro brasileiro a ter, em 1994, um projeto de pesquisa aprovado pelo CNPq para estudar a Regulação, quando ainda nem se falava, no Brasil, na existência de uma agência reguladora.
Há 20 anos, o setor elétrico brasileiro estava mergulhado numa enorme crise e ninguém duvidava que era necessário efetuar mudanças profundas para tentar encontrar uma solução. O DNAEE virou Aneel; as operações do setor elétrico, que eram feitas por um grupo de trabalho da Eletrobras, se transformaram no ONS; o planejamento ficou meio solto e sem dono; foi criado o Mercado Atacadista de Energia (MAE, hoje CCEE). Na esteira dessas reformas, surgiu o mercado livre de energia e houve uma primeira onda de privatizações.
Santana embarcou nessa canoa de grandes transformações e, a partir do final de 1996 e início de 1997, assessorou diversos bancos de investimento nos processos de privatização. Em julho de 2000, entrou na Aneel, na condição de cedido pela UFSC. Começou como superintendente de Estudos de Mercado. Em dezembro de 2005, ele virou diretor da agência reguladora, função que ocupou durante dois mandatos. Continuou vinculado à UFSC, onde finalmente se aposentou em outubro de 2013, coincidindo com o fim do segundo mandato na Aneel.
Na condição de superintendente da Aneel, aproximou-se da então ministra de Minas e Energia, Dilma Rousseff, que o requisitava eventualmente para participar de algumas reuniões no MME. Ele acredita que dessa relação surgiram as circunstâncias políticas que o levaram à diretoria colegiada da Aneel.
“Nunca fui petista e o meu relacionamento com a então ministra Dilma sempre foi técnico. Mas é preciso reconhecer que só virei diretor da Aneel por causa da Dilma, que pode ter todos os defeitos do mundo, mas seguramente não é racista. Apesar de tudo que eu já tinha feito, acho que não seria diretor da Aneel sem a Dilma. Ela sempre teve enorme respeito por mim”, declarou.
Embora discreto para falar sobre o tema, racismo é algo que o preocupa desde muito jovem. Ele conta, por exemplo, que, já no Exército, foi estudar na casa de uns amigos, na avenida Oswaldo Cruz (que liga os bairros do Flamengo e Botafogo, então um endereço nobre no Rio). “Sem cerimônia, o porteiro me fez entrar pela porta de serviço. Um cafuso como eu — mestiço de negro com índia — estava proibido, pelos padrões da época, de entrar pela porta principal do edifício”, comentou.
Edvaldo diz que se assustou, no dia da posse do Governo Temer, quando viu pela televisão apenas homens brancos em volta de uma grande mesa. “Sou daqueles que acham que o Ministério tem que ser composto por pessoas competentes. É provável que o Presidente da República também pense assim. Se não há negro no governo, a conclusão é que os negros são incompetentes. É uma questão simbólica e o novo Governo não soube compreender isso. Não havia nem há um negro, não havia uma mulher sequer. Ainda temos que avançar muito para atingir padrões de outras sociedades em relação às questões raciais e de gênero”, disse.
Ele lembrou que nos Estados Unidos, onde a questão racial ainda é muito complicada, faz-se um esforço grande para que a sociedade fique mais integrada. “Então, lá, você tem ou teve um presidente negro, o Barack Obama; um chefe do Estado Maior negro, o general Colin Powell; e uma secretária de Estado negra, como Condeleezza Rice; ou a procuradora geral Loretta Lynch, cujo cargo equivale ao de ministra da Justiça. Isto é impensável entre nós. Vai demorar uma eternidade para que tenhamos algo parecido aqui no Brasil”, filosofou.
Edvaldo Santana lembra que, já ocupando a função de diretor da Aneel e passageiro eventual de classe executiva, teve que ouvir a delicada observação de funcionários de aeroportos, às vezes negros, explicando que a fila da classe econômica era outra. No próprio MME, onde ia quase todos os dias nos tempos da Aneel, no início não deixavam que entrasse pela porta privativa por onde entram o ministro, convidados e funcionários graduados, e que precisava dirigir-se à entrada principal.
“Se eu fosse branco, não precisaria dar todas as explicações que tive que dar ao longo da vida. O Brasil é um ótimo país, mas nessa questão racial ainda estamos muito atrasados. E o pior de tudo é que estamos atravessando hoje uma maré conservadora, que pode fazer com que ocorra um retrocesso nas lutas pela igualdade racial”, comentou com este site.
Hoje um consultor renomado do setor elétrico, Edvaldo Santana divide a semana basicamente entre Brasília, onde mora oficialmente, Belo Horizonte, Rio de Janeiro e São Paulo. Ele fica tão pouco tempo na Capital Federal, que o seu carro, um jipe Tucson com dois anos de licenciamento, tem apenas 5 mil km rodados.
Edvaldo criou o blog “Papo de Energia” em março deste ano. “Como professor aposentado da UFSC, percebi que teria uma dificuldade para publicar os meus trabalhos. Então, o blog, que sequer tem patrocinadores, foi criado principalmente para divulgar os meus conhecimentos”. Ele diz que está satisfeito com o retorno de audiência obtido com o blog, cuja característica básica é a independência.
“Muita gente tem interesse no setor elétrico, não apenas os profissionais que trabalham na área. Com o blog é possível perceber claramente com o setor é visto pelas pessoas que trabalham em outras áreas. O setor elétrico é relativamente fechado e de certa forma constitui um mundo à parte. Com o blog, consigo sair um pouco dessa caixa”, declarou. No blog, ele escreve sobre assuntos diversos que afetam o setor elétrico: formação de preços, contratos, risco hidrológico, geração, transmissão, mercado livre, etc. Conta que, recentemente, uma associação do setor lhe pediu para publicar alguns artigos do blog que interessassem aos associados. Respondeu que publicar alguns artigos era a mesma coisa que censurar os demais, o que não admitia.
Amante do cinema, ele e Luísa vão quase todos os sábados à tarde assistir um bom filme. Também gosta de assistir shows de música popular brasileira. Criado na beira do mar, em Aracajú, e tendo vivido muitos anos em Florianópolis, não dispensa uma praia, quando vai a Santa Catarina visitar os filhos e a neta. Dos tempos da caserna, ainda tem o hábito de praticar exercícios físicos e corre cerca de uma hora praticamente todos os dias.
Quando perguntado como o setor elétrico brasileiro sairá da crise atual, Edvaldo já tem uma resposta na ponta da língua. Na sua visão, o SEB sempre conviveu com a crise. “Pelo menos é o que vi ao longo de quatro décadas”.
Nos anos 70, houve uma forte expansão da geração e transmissão, quando o setor se caracterizava por custos marginais decrescentes. Na década de 80, foi uma inadimplência generalizada. “Desde então, o setor jamais se recuperou totalmente. Temos convivido com períodos curtos de estabilidade e períodos longos de instabilidade”.
No Governo do presidente Fernando Henrique, veio o racionamento. Em 2007, já no Governo do presidente Lula, começou uma crise regulatória enorme, que até hoje tem suas consequências. Ele lembrou que, no início do Governo do PT, em 2003, o Instituto Ilumina — que reunia técnicos ligados ao petismo — fez uma proposta de setor elétrico que parecia mais uma ata do Politburo da antiga União Soviética. “O viés era totalmente contra o mercado”. Logo depois, quando formalizou aquilo que foi denominado de “Modelo Dilma”, a Lei 10.848 era um amontoado de 15 páginas em que não aparecia a palavra mercado em uma única linha sequer. “O próprio MAE teve que mudar de nome e passou a se chamar Câmara de Comercialização, pois mercado virou palavrão no Governo do PT”.
Para Edvaldo, hoje, é muito fácil falar mal do Governo do PT, mas, na sua visão, o empresariado também tem a sua grande fatia de responsabilidade. Na época do racionamento de 2001, por exemplo, ele entendia que as associações empresariais do setor elétrico foram fundamentais para as negociações que levaram ao fim do impasse e à assinatura do Acordo Geral do Setor Elétrico.
Mas, hoje, na sua avaliação, algumas associações estão, casuisticamente alinhadas com o Governo, qualquer governo. “Da boca para fora, elas defendem a autonomia da Aneel. Mas, quando perdem alguma causa dentro da agência, correm para o MME para reclamar. Que autonomia é essa afinal”?, indaga.
Para o ex-diretor da Aneel, hoje também existe uma proliferação de associações no setor elétrico. “Já são mais de 20. Acho que cada segmento quer um leilão para chamar de seu”, ironizou. Na sua visão, no médio prazo, o que significaria em torno de uns três anos, haverá uma consolidação das associações, pois “do jeito que está não dá para ficar. Todo mundo percebe que tem muita associação para pouco setor elétrico”, acrescentou, salientando que essa consolidação poderá ocorrer por segmentos, surgindo uma associação de geradores, uma do mercado livre, uma de distribuidores e transmissores. “Tem muita associação que vai ficar pelo meio do caminho e será incorporada num grupo maior, não tenho dúvidas”.
Em 20 de novembro de 2012, Edvaldo Santana publicou um artigo no jornal “Valor Econômico”, com críticas à então MP 579, e curiosamente recebeu telefonemas estranhos de dirigentes de associações, que reclamaram do seu posicionamento, sob o argumento que aquela não era uma hora adequada para criticar o Governo.
“As associações precisam superar isso tudo. Ainda dentro da Aneel, fiquei perplexo quando fui chamado um dia para uma reunião cujo objetivo era quase que homologar um nome para presidente de uma associação do setor elétrico. Os conselheiros da associação queriam ouvir a opinião do regulador. Como se quer construir um ambiente no mundo dos negócios com tanta submissão? Simplesmente impossível. É lógico que isso precisa ser revisto”, continuou.
Para o consultor Edvaldo Santana, o futuro do setor elétrico brasileiro vai depender de muita coisa. Na sua visão, nos próximos 30 meses não haverá tempo suficiente para encontrar soluções adequadas para os graves problemas atuais.
No seu entendimento, por exemplo, é quase uma brincadeira continuar formando preços por modelos computacionais imprecisos, conforme se faz ainda hoje, herdando um mecanismo que já vem de muitos anos. “Não tem mais qualquer sentido isso”. Ele também defende a abertura do mercado livre de energia elétrica, mas se preocupa com as enormes resistências que existem quando se toca no assunto. “O Brasil está muito atrasado nessa área do mercado livre”.
Para Edvaldo, seria fundamental também voltar à compra descentralizada de energia por parte das distribuidoras, como acontecia até 2004. “Se o governo quer acabar com as excludentes de responsabilidade, sub e sobrecontratação, basta descentralizar os leilões. Cada distribuidora faz o seu”.
São tantos os problemas, que ele acredita que a melhor maneira de sair da crise seria “zerar o jogo”. Com isso, ele quer dizer que o MME deveria contratar uma consultoria internacional e reestruturar o setor elétrico novamente, como fez há 20 anos. “Precisamos de um novo Projeto Reseb. O setor elétrico tem tantos remendos, que qualquer coisa que se faça hoje será apenas um paliativo. O nosso modelo hoje é uma espécie de espantalho, que só existe aqui. Então, tem alguma coisa errada”.
Um desses fantasmas, por exemplo, é a MP 579 (hoje Lei 12.783). “É um dos grandes erros históricos cometidos no setor elétrico brasileiro. O pior de tudo é que outros erros eram passíveis de serem corrigidos. Mas a legislação atual faz com que seja praticamente impossível corrigir o mecanismo das cotas. Temos que ir convivendo com esse monstro jurídico. Talvez poderíamos pensar numa alternativa de permitir que as usinas cujas concessões ainda vão vencer, que possam vender no ACL ou no ACR, de acordo com as suas próprias conveniências, desde que se pague um pedágio para a modicidade das tarifas”.
Para Edvaldo, a equipe atual do MME tem “boas ideias”, mas o problema é tão grande, que não se resolve em pouco tempo. “É uma ilusão acreditar que em poucos meses o MME vai corrigir as graves dificuldades que atingem o setor elétrico. Além disso, o MME não tem isenção suficiente para alterar de forma profunda. O governo, afinal, é dono de empresas. Por isso, penso que seria indispensável contratar uma consultoria internacional, para escaparmos da interferência política”.
Edvaldo tem muita saudade da UFSC e da Aneel. Sua saída da universidade o deixou frustrado, pois se aposentou como professor titular e não estava dando aulas, o que mais gosta de fazer. Da Aneel, lembra muito mais do período em que era superintendente. Seus dois últimos anos como diretor – 2012 e 2013 – representaram um enorme retrocesso, com a Agência perdendo sua independência, sendo usada politicamente para elaborar a MP 579/2012. “Era como se eu tivesse jogado no lixo todo meu período anterior na Aneel, por isso minha mensagem de despedida tinha o título de Tempo Perdido”, concluiu.