EPE quer organizar fórum para discutir “fracking”
Maurício Corrêa, do Rio de Janeiro —
Enfim, depois de longo silêncio por parte das autoridades, um técnico de alto nível do Governo Federal emitiu uma opinião sobre o “fracking”, a polêmica tecnologia que permite extrair gás natural do subsolo. O presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Luiz Augusto Barroso, disse nesta segunda-feira para um grupo de jornalistas que, no momento, o Governo não realiza estudos sobre o uso dessa tecnologia, mas que seria importante realizar um fórum amplo de discussões, para que todas as partes interessadas tivessem a oportunidade para manifestar as suas opiniões sobre o tema.
Utilizado em larga escala nos Estados Unidos, o “fracking” (“fraturamento hidráulico) é combatido pelos grupos ambientalistas sob o argumento que, ao introduzir muitos produtos químicos misturados com água, sob forte pressão, no subsolo, para provocar fissuras e extrair o gás, a qualidade dos aquíferos fica comprometida, em prejuízo para a saúde humana, dos animais e da produção agrícola, praticamente inutilizando as terras onde são realizadas as perfurações.
Barroso explicou que a EPE tem competência legal, como empresa de pesquisa energética, para também desenvolver estudos que possam subsidiar o Governo Federal (o seu único cliente, por sinal) na tomada de decisões referentes a petróleo e gás. Ele reconhece que existe um problema de comunicação sobre o “fracking”, cuja discussão, no momento, estaria ainda no campo da emoção e não da razão. Por isso, um debate público seria talvez a melhor solução para se chegar a uma correta avaliação técnica sobre o assunto. Ele lembrou que alguns estados, como o Paraná, já adotou uma legislação que impede a aplicação do “fracking” no seu território.
“Na EPE, estamos sendo muito cautelosos, pois há muita controvérsia”, disse Barroso, frisando que a relação entre a energia e o meio ambiente se torna cada vez mais complexa, em um mundo no qual alguns países inclusive buscam a descarbonização total. O presidente da EPE, entretanto, também ressaltou que a matriz energética brasileira ainda tem muita qualidade e que muitos países certamente gostariam de chegar, em 2050, com um nível de matriz que o Brasil já conta em 2017, fortemente suportada por energias renováveis.
Em seu comentário, Barroso inclusive fez referência ao documentário “Gasland”, de 2010, dirigido pelo documentarista Josh Fox, que expôs as consequências em áreas rurais dos Estados Unidos seriamente afetadas pela extração de gás natural através da utilização do “fracking”. “Gasland” ganhou um Oscar na categoria “Melhor Documentário de Longa Metragem”, além de um Emmy na categoria “Melhor Direção para Programa de Não-Ficção”.
A referência de Luiz Barroso à restrição do “fracking” no estado do Paraná praticamente coincidiu com uma grande manifestação realizada no dia 06 passado, em frente à Catedral do Divino Espírito Santo, na cidade de Umuarama, Noroeste do Paraná, quando mais de 3 mil pessoas participaram de uma denominada “Grande Vigília pela Criação e pelos Refugiados Climáticos”. O movimento foi organizado pelas organizações Coesus (Coalizão anti-Fracking, que conta com forte apoio da Igreja católica) e pela 350.org, uma ONG que trabalha contra o “fracking” a nível mundial.
“Inspirados pela Encíclica Laudato Si e pelos ensinamentos do Papa Francisco, mulheres e homens, crianças e jovens estiveram unidos em oração para pedir que governos, igrejas, universidades, indústrias e outras instituições desinvistam de projetos ligados a combustíveis fósseis, e promovam ações efetivas para cuidar da Casa Comum. Nós estamos mostrando às pessoas a destruição que a indústria dos combustíveis fósseis causa com as emissões de gases que agravam o aquecimento global e como ela está colocando em risco a existência da vida neste planeta. Unidos, podemos corrigir a rota e exigir dos governantes que abandonem imediatamente os combustíveis fósseis e trilhem o caminho das energias renováveis”, afirmou Nicole Figueiredo de Oliveira, diretora da 350.org para o Brasil e América Latina.
A ação em Umuarama foi parte da Mobilização Global pelo Desinvestimento, promovida pela 350.org Brasil e América Latina em parceria com a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), representada pela Diocese de Umuarama, Cáritas Paraná e a Coalizão Não Fracking Brasil pelo Clima, Água e Vida (Coesus).
Até o dia 13 de maio, segundo Nicole Oliveira, serão realizadas mais de 130 ações em diversos países nos seis continentes. O objetivo é expor publicamente a responsabilidade da indústria dos combustíveis fósseis no aquecimento global, que por sua vez intensifica as mudanças climáticas, e lembrar que, com união, as populações podem exercer influência sobre a tomada de decisão nos diversos setores da sociedade.
Luiz Barroso fez uma referência “en passant” ao “fracking”, quando questionado por um repórter durante uma apresentação feita na EPE para um grupo de jornalistas convidados pela GIZ, agência alemã para a cooperação técnica e desenvolvimento sustentável, para conhecer aspectos relacionados com a aplicação da energia renovável e projetos nesse campo apoiados pelo Governo da Alemanha no Brasil. Ele fez uma apresentação institucional sobre a EPE e depois se colocou à disposição para perguntas feitas pelos jornalistas.
O repórter viaja a convite da Deutsche Gesellschaft für Internationale Zusammenarbeit (GIZ) GmbH, agência alemã para a cooperação técnica e desenvolvimento sustentável.