Mercado reage mal à eleição na CCEE
Maurício Corrêa, de Brasília —
Os associados da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) decidiram reeleger Rui Altieri para a presidência do Conselho de Administração e também escolheram a advogada Roseane Santos para ocupar uma das cadeiras no Conselho. Veja uma matéria à parte neste site.
O “Paranoá Energia” não vai entrar no mérito das duas indicações. Ambas foram legítimas e o “Paranoá Energia” deseja sucesso aos dois conselheiros. Que saibam tomar decisões corretas em favor do desenvolvimento do mercado de energia elétrica no Brasil.
Entretanto, a eleição na CCEE, se não foi ilegítima, também não foi totalmente normal. No caso de Altieri, trata-se de uma indicação do Poder Executivo, que foi apenas acatada pelos associados. Mas, no caso de Roseana Santos, ocorreram algumas situações que devem induzir todo o setor elétrico brasileiro a profundas reflexões.
Este site conversou com alguns dirigentes do mercado. Para começar, chegou ao conhecimento deste site que o Ministério de Minas e Energia, talvez à revelia do próprio ministro Bento Albuquerque, que não parece ser o tipo de homem público que se envolve nessas maracutaias, operou sem qualquer tentativa de encobrimento a favor da candidata Roseana Santos. Aliás, não apenas técnicos qualificados próximos ao ministro Bento, mas, também, dirigentes da Aneel, da Petrobras e até mesmo da Eletrobras.
Se o Estatuto Social da CCEE tivesse outra redação, não teria sido problema. Mas, como a vaga da agora conselheira Roseana Santos é pertencente ao mercado, não resta dúvidas que houve uma interferência indevida do MME e seus satélites no processo. Eles teriam saído por aí pedindo votos ao telefone, usando toda a pressão e poder de persuasão que a área institucional tem a seu favor.
Um dirigente empresarial estava no início desta quinta-feira muito bravo com o Governo. Como alegou, de que adianta o ministro Bento organizar uma reunião denominada “Diálogo” com a área empresarial se os seus principais auxiliares se dedicam de corpo e alma à indicação de um candidato na CCEE exatamente para a vaga que caberia ao mercado decidir?
A segunda reflexão é a respeito da atuação das associações empresariais do setor elétrico nesse processo. Ao que tudo indica, as associações estão totalmente fora de sintonia com as suas respectivas bases. Ou então existe muito traíra nessa história. Não seria uma novidade, pois a traição já comeu solta em outros episódios semelhantes envolvendo coisas do setor elétrico, que costuma ser extremamente permeável às iniciativas políticas do Governo. Qualquer governo.
Conforme antecipado por este site, no final de março, as associações empresariais já haviam detectado uma interferência indevida da secretária-executiva do MME, Marizete Dadald, e do diretor-geral da Aneel, André Pepitone, em favor de Roseana Santos.
O mercado queria claramente que o escolhido fosse Marcelo Loureiro, um especialista que trabalha como assessor da Abiape e muito ligado ao presidente do Fórum das Associações Empresariais do Setor Elétrico (Fase), Mário Menel.
Constatada a ação de bastidores de Marizete e Pepitone, foi assinado um documento conjunto denominado “Manifestação”, há cerca de um mês, deixando claro que o mercado queria um técnico para a vaga de Roberto Castro e não apenas uma advogada. O documento não citava nomes, porém para quem sabe ler pingo é letra.
“É esperado que o mercado de energia elétrica enfrente grandes desafios nos próximos anos, associados à CP 33, solução da questão do GSF e outras medidas. Nessa esteira, estão previstas diversas alterações na formação de preços (preços horários e oferta de preços), na organização dos mercados, que terão impacto em toda a Área de Gestão de Mercado, somando-se às atuais responsabilidades”, mencionava a tal “Manifestação”, assinalando ainda que “dadas tais características, merece ser enaltecida a importância de se ter no Conselho da CCEE, em especial na Área de Gestão de Mercado, Conselheiro com formação e experiência compatíveis, para que não só as responsabilidades atuais continuem sendo aprimoradas, mas também para que as modernizações vindouras sejam realizadas de forma fluída e a mitigar conflitos e prejuízos desnecessários. Nesse sentido, as Associações signatárias defendem e recomendam um perfil técnico para a posição do Conselheiro de Gestão de Mercado atualmente exercida pelo Roberto Castro”.
O documento foi subscrito pelas associações Apine, Anace, Abragel, Abrage, Abiape, Abrace, Abraceel e Abradee, que divulgaram o texto entre seus associados. Na hora da votação, nesta quinta-feira, surpreendentemente Roseana teve 73,07% dos votos, Loureiro 24,21% e ainda houve 2,73% de abstenções.
Ao que tudo indica, as associações estão trabalhando em uma freqüência e seus associados em outra. Ou então não sabem fazer política. Um sinal amarelo já havia sido dado, há poucas semanas, na assembléia que escolheu os conselheiros da Abraceel, quando o mais votado foi o representante da Petrobras, uma empresa que nunca morreu de amores pelo mercado livre de energia elétrica.
“Esse resultado da CCEE mostra que existe uma espécie de esquizofrenia no mercado de energia. As associações pregam uma coisa e seus associados querem outra. Penso que cada uma das oito associações que assinou o documento precisa fazer uma profunda reflexão, pois tem coisa errada aí. Inclusive traição”, comentou um especialista, que preferiu não ter o nome citado nesta matéria.