Lobby mostra a força em debate sobre GN
Maurício Corrêa, de Brasília —
Diante da iniciativa do Poder Executivo de aprofundar as mudanças no marco legal para o gás natural, as corporações com grande interesse na área estão apostando todas as suas fichas no jogo político que ocorre dentro do Congresso Nacional.
Quem assistiu, nesta quarta-feira, 22 de maio, a sessão pública de debates realizada pela Comissão de Minas e Energia da Câmara dos Deputados, em torno do Projeto de Lei 6407, de 2013, a chamada “Lei do Gás”, não ficou com dúvidas: o lobby continua comendo solto nos bastidores do Legislativo.
É ali que os interesses empresariais estão entrincheirados para não permitir qualquer tipo de avanço em relação ao gás natural. Ninguém quer largar a rapadura em matéria de gás natural, algo, aliás, que já vem acontecendo há alguns anos.
Como a questão já está em discussão há muito tempo, existe até uma elevada convergência em torno da maioria dos temas. Algo estimado em 80%. Mas é exatamente nessa faixa residual dos 20% que o Poder Executivo precisará arbitrar e eventualmente atropelar os interesses empresariais e seus apoios políticos, caso queira algum resultado quanto ao marco institucional do gás. Se o Governo Bolsonaro terá força política para esse tipo de jogada, bom, aí são outros quinhentos, pois se tem algo que já se aprendeu a respeito do atual Governo é que a sua gestão de questões congressuais é uma lástima, quando não um desastre.
Na Comissão de Minas e Energia é fácil perceber como o jogo está sendo jogado. Se aparece alguém na sessão pública e diz que “os contratos precisam ser respeitados” ou que “não adianta correr muito” com as mudanças e, ao contrário, deve-se buscar uma transição “gradual e segura”, o recado é claro: de preferência, é melhor deixar do jeito que está e não mexer em absolutamente nada. Ou seja, se mexer, estraga.
Por outro lado, se o discurso trata de não fazer apenas uma “meia abertura de mercado” e, sim, de uma abertura total, deixando produtores e consumidores de gás natural negociarem livremente os preços, está claro que esse tipo de agente de fato quer algo novo em relação ao gás natural e não mais do mesmo da política medíocre que vem protegendo a Petrobras e as distribuidoras estaduais há décadas.
Paulo Pedrosa, coordenador do Fórum Empresarial que defende o desenvolvimento do mercado de gás natural, pelo menos tem sido coerente. Seja na iniciativa privada, seja no Governo, ele sempre batalhou em favor de um mercado competitivo e moderno, que possa tirar o Brasil da Idade Média em relação ao gás natural.
Como poucos, Pedrosa percebe com muita clareza que a proposta governamental, a ser anunciada em junho, de dar uma nova configuração à questão do gás natural, permitindo o seu pleno desenvolvimento, sem as amarras que o caracterizaram até hoje, é a grande oportunidade para o desenvolvimento econômico do Brasil, e poderá resultar na reindustrialização de vários segmentos que foram perdendo a competitividade com o passar dos anos.
“Hoje, há uma convergência e este é o momento de arbitrar. Há um amadurecimento em relação ao que precisa ser feito e o momento consiste em aproveitar a convergência e estabelecer uma agenda positiva para o País baseada no gás natural”, afirmou Paulo Pedrosa.
Lucien Belmonte, da Abividro, também entende que é preciso colocar um ponto final no encastelamento de alguns agentes econômicos que travam o desenvolvimento do mercado. Segundo Belmonte, existem “privilegiados” que abusam do poder econômico, razão pela qual a ANP e o Cade precisam acelerar o processo de modernização. “É fundamental entender o risco político econômico e econômico de não se fazer”, alertou o superintendente da Abividro.
Reginaldo Medeiros, presidente executivo da associação dos comercializadores de energia, a Abraceel, argumentou que existe um “senso de urgência” para que seja tomada uma decisão. “Tudo já foi discutido”, frisou Medeiros, salientando que foi exatamente a pressão de agentes monopolistas que não permitiu que fosse tomada uma decisão antes.
Luiz Costamilán, do IBP, também percebe com nitidez que o momento significa uma oportunidade única para um novo ciclo de desenvolvimento industrial lastreado no aproveitamento do gás natural. “A palavra-chave é competição”, afirmou, garantindo que todos se beneficiam do novo ciclo. “Não há perdedores”, frisou. “Defendemos a abertura ao longo de toda a cadeia produtiva. Se um elo for interrompido, não existirá competição”, disse o dirigente do IBP, que representa os produtores de gás natural.
Marcelo Mendonça, diretor de Estratégia e Mercado da Abegás, disse que as distribuidoras estaduais de gás canalizado não são contra a abertura do mercado e que a abertura vai acontecer. “É preciso desfazer alguns mitos”, esclareceu. Ele defendeu a harmonização das normas federais e estaduais em relação ao gás natural, mas declarou que a eventual privatização das distribuidoras estaduais é algo que compete exclusivamente aos estados, que, afinal, são os controladores dessas empresas.