CCEE quer fundo para inadimplência no MCP
Maurício Corrêa, de Brasília —
A Câmara de Comercialização da Energia Elétrica (CCEE) apresentou finalmente a revisão da proposta que altera as salvaguardas financeiras para que os agentes possam atuar no Mercado de Curto Prazo (MCP). É um tema que tira o sono de muita gente no mercado, devido aos impactos diretos que existem tanto nos custos quanto nos riscos das operações. A proposta sugere a criação de um fundo de liquidação custeado pelos próprios agentes.
Este site apurou que a conselheira Roseane Santos, da CCEE, teve uma reunião com 170 representantes de agentes que operam no mercado, todos da Abraceel, que foi a primeira associação a se reunir com a Câmara para tratar do assunto.
Em um relatório distribuído aos seus associados, nesta sexta-feira, 21 de janeiro, a que o “Paranoá Energia” teve acesso, a associação — citando o que teria sido dito pela conselheira da CCEE — assinalou que as premissas adotadas para o novo modelo de salvaguardas levaram em conta cinco premissas básicas:
1. blindagem de 100% do MCP, seguindo práticas do mercado financeiro e dos mercados internacionais;
2. sustentabilidade, mediante a exigência de aporte de garantias, mas preservando a competitividade e a liquidez do mercado, pois não se pretende engessar as negociações;
3. defaulters-pay, pois não querem dar um sinal econômico equivocado, de socializar o risco dos maus pagadores (no mercado, o mecanismo de Defaulter-Pay é utilizado no cálculo da repartição de perdas nas clearings houses, quando ocorrem casos de insolvência de operadores);
4. monitoramento prudencial, que serve para exigir garantias proporcionais ao risco de cada agente;
5. e finalmente um período de transição para que os agentes possam se adequar às novas exigências.
Nesse contexto, segundo ainda o relatório da Abraceel, a CCEE sugere um mecanismo em cascata com seis camadas a serem acionadas, que vão desde a pré-constituição de garantias para dois meses, até a criação de um fundo de liquidação custeado pelos agentes.
As “seis camadas” seriam as seguintes:
1} A garantia individual pré-constituída para comercializadores, geradores e consumidores livres seria o valor equivalente ao risco potencial associado a duas liquidações do MCP. No caso das distribuidoras, a garantia seria a média das exposições negativas dos últimos 12 meses. Na hipótese de não aporte das garantias pelo agente ou aporte insuficiente, as próximas etapas seriam acionadas.
2) Fundo de liquidação, que consistiria em parcelas fixa e variável do agente inadimplente. Propõe-se que a parcela fixa seja definida em função da proporção do volume médio de energia contabilizada na CCEE por um determinado período. Já a parcela variável seria proporcional ao risco que o agente agrega ao sistema, ou seja, os agentes que desejarem assumir riscos maiores deverão constituir garantias maiores para suportar seus contratos. “Nesse aspecto, Rose destacou que se faz necessário avaliar os resultados do monitoramento prudencial, para que o período e outros aspectos sejam definidos com assertividade”, cita o relatório da associação dos comercializadores.
3) Corte de contratos com as contrapartes do agente inadimplente. Seguirá o procedimento atual.
4) Fundo de liquidação, parcela da CCEE: advinda de porcentagem das penalidades aplicadas pela CCEE e eventual sobra orçamentária da Câmara.
5) Fundo de liquidação, parcela fixa e variável dos demais agentes.
6) Loss sharing: rateio dos valores ainda remanescentes de inadimplência entre os agentes credores, na proporção dos respectivos créditos. É o compartilhamento dos prejuízos entre os agentes de acordo com o montante do crédito que cada um tem num caso de inadimplência de algum operador do mercado.
Segundo o relatório da Abraceel, a conselheira Roseane Santos informou que a Nota Técnica preparada pela CCEE já está em poder da Aneel e que ambos (Câmara e agência reguladora) estão trabalhando em conjunto neste assunto. Ela tem a expectativa que a NT de monitoramento prudencial talvez possa ser colocada em consulta pública no mês de fevereiro próximo, antes de se iniciar a discussão das garantias financeiras.
Houve alguns questionamentos por parte dos associados da Abraceel. Por exemplo: foi dito pelos participantes que a proposta é bastante complexa frente ao baixo nível de inadimplência do MCP. Surgiu também a dúvida se a metodologia exigiria o pré-registro de contratos.
Citado no relatório, o vice-presidente de Energia da Abraceel, Alexandre Lopes, levantou preocupação com o tamanho que o fundo pode atingir, podendo ser eventualmente usado para um fim alheio ao seu propósito.
Uma discussão relevante, considerando o cenário próximo de abertura do mercado, foi o questionamento quanto a posição da CCEE em relação aos consumidores que devem lidar com a nova obrigação. A CCEE, segundo o relatório, teria respondido que não vê a proposta como complexa para o consumidor e, além disso, no cenário de abertura, o consumidor não deveria estar diretamente representado na CCEE, mas, sim, através do chamado comercializador varejista, ponderou Alexandre Viana, consultor da Thymos contratado pela Câmara.