Economia brasileira deve sofrer com a guerra
A invasão da Ucrânia pela Rússia deve reforçar o quadro de estagflação no Brasil – ou seja, aumento da inflação com queda na atividade. E o efeito deve ser imediato, segundo economistas.
Armando Castelar, pesquisador associado da FGV/Ibre, diz que haverá reflexos nos preços de petróleo, combustíveis, trigo, pão e alimentos, que devem subir ainda mais. Nas suas contas, a projeção para inflação deste ano deve passar dos atuais 6% para um intervalo entre 6,2% e 6,3%. A previsão de crescimento do PIB, por sua vez, que era de 0,6%, deve recuar para algo entre 0,3% e 0,4%.
Castelar lembra que o resultado acima do esperado da prévia da inflação deste mês indica que talvez o Banco Central tenha de ir além do patamar de 12,25% para a taxa básica de juros (Selic). Com o conflito na Ucrânia, acrescenta, essa tendência ganha força. “Possivelmente, além da reunião (do Comitê de Política Monetária) de março e de maio, vai ter de subir juros em junho ”
Na avaliação do economista e consultor Alexandre Schwartsman, o conflito entre Rússia e Ucrânia afeta produtos importados pelo Brasil, como petróleo, gás e trigo. Além disso, destaca ele, a pressão de alta do dólar também tem um efeito inflacionário. Ontem, a moeda americana subiu 2,02% ante o real. O dólar vinha experimentando nos últimos dias um movimento de baixa e chegou a cair abaixo de R$ 5,00.
Para Castelar, a primeira reação a choques deste tipo, tanto por parte de investidores do mercado financeiro como da economia real, é segurar os planos e aguardar. Esse tipo de choque também amplia a aversão ao risco e fortalece as aplicações em títulos americanos, considerados mais seguros.
Castelar frisa que o padrão histórico observado em choques provocados por conflitos internacionais mostra que eles são críticos num primeiro momento e, gradativamente, há uma acomodação. A tendência é de que fundamentos econômicos prevaleçam.
Diplomacia
Como o Brasil irá se posicionar na diplomacia com os EUA, China e Europa por causa da mudança na geopolítica mundial é o ponto crucial a ser acompanhado, na opinião do economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale. Dependendo da nova configuração, ela pode ter impacto nos investimentos no País.
Bruno Imaizumi, economista da LCA Consultores, alerta que o conflito pode piorar também o fluxo das cadeias globais, que estava afetado por causa da pandemia. Já a economista Zeina Latif, consultora econômica, diz que os impactos do ponto de vista financeiro ainda são incertos. Para ela, desde que o conflito não atinja maiores proporções, não será fator de volatilidade de curto prazo para o Brasil, exceto a pressão inflacionária.
A economista da Tendências, Alessandra Ribeiro, lembra ainda de uma questão setorial que pode afetar a economia nacional, que é a importação de fertilizantes da Rússia. Outro ponto, diz ela, é avaliar o impacto das sanções à Rússia na economia mundial, o que, sem dúvida, tem reflexo na atividade interna.
Guerra derruba bolsas
A invasão da Ucrânia pela Rússia trouxe tensão nesta quinta, 24, aos mercados globais, com a queda das Bolsas e o temor de uma disparada dos preços do petróleo. Ao longo do dia, no entanto, depois de o presidente americano Joe Biden ter anunciado uma série de sanções aos russos, os investidores se acalmaram um pouco. Por aqui, a B3 fechou em queda de 0,37%, depois de recuar mais 2% durante a manhã. Na direção inversa, o dólar subiu 2,02%, cotado a R$ 5,10.
As incertezas em relação ao conflito levaram os investidores a correr para ativos mais seguros, como os títulos do Tesouro americano e o dólar, deixando um rastro de prejuízos nos índices acionários dos principais mercados mundiais. O índice Dax, da Alemanha, fechou em queda de 3,96%; o Pcac, de Paris, recuou 3,83%; e o FTSE, de Londres, 3,88%. Na Rússia, a Bolsa de Moscou chegou a cair 40% na retomada dos negócios, suspensos de madrugada.
Em Nova York, as Bolsas oscilaram bastante e, como no resto do mundo, tiveram quedas expressivas no início da manhã. O cenário mudou depois do pronunciamento de Biden: os índices reagiram e fecharam em terreno positivo. O Dow Jones subiu 0,28%, enquanto o Nasdaq avançou 3,34%. O S&P 500, no entanto, não teve tempo para mudar a direção e caiu 1,49%.
As sanções atingem bancos russos e adicionam novos nomes de membros da elite próximos ao Kremlin. Os alvos de bloqueio dos americanos somam US$ 1 trilhão em ativos. Além disso, os Estados Unidos anunciaram sanções ao comércio exterior, que corta a venda de produtos de alta tecnologia para a Rússia.
Petróleo
Outra medida que ajudou a acalmar os ânimos do mercado foi a promessa de Biden de liberar as reservas americanas de petróleo, caso haja necessidade. A resposta do mercado foi imediata. As cotações, que haviam batido US$ 105 o barril durante o dia, caíram novamente abaixo de US$ 100. A medida reduz a pressão adicional sobre os preços da energia e dissipa temores sobre o impacto que a disparada do petróleo teria sobre a inflação e a política monetária global.
No Brasil, o Banco Central também tentou minimizar o nervosismo do mercado. A autoridade monetária disse que o Comitê de Estabilidade Financeira está atento “à evolução recente do cenário” e está preparado para atuar “minimizando eventual contaminação sobre os preços dos ativos locais”, como o câmbio.