O mercado elétrico tem seus segredos
Maurício Corrêa, de Brasília —
Quem ficou parado e apostou todas as fichas na abertura do mercado brasileiro de energia elétrica, em 2023, depois de um tremendo fracasso, por parte do mercado, no ano passado, ficou preocupado depois da reunião do Fórum das Associações do Setor Elétrico (Fase) com o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, no último dia 24 de março, na sexta-feira da semana passada.
Este site apurou que, depois de uma apresentação sobre o mercado livre e suas perspectivas, feitas pelo presidente da Abraceel, Rodrigo Ferreira, o ministro não cravou um apoio firme e apaixonado ao ML, como se cansou de fazer o seu antecessor, Adolfo Sachsida.
Ao contrário, ficou em cima do muro. Não foi contra e nem a favor e, no estilo mineiro de ser, disse que as decisões que favorecem determinado segmento prejudicam outros. E, nesse contexto, ele tem a responsabilidade de arbitrar a questão, vai buscar o diálogo e o consenso entre os agentes, mas que não vai fugir da atribuição de tomar uma decisão. Ou seja, a liberdade total do mercado, como quer a Abraceel, subiu no telhado.
O próprio relatório semanal da Abraceel aos seus associados (agora 106), que normalmente é pródigo em otimismo, mostrou um pouco dessa desconfiança da parte dos agentes do mercado. Quem entende alguma coisa sobre a linguagem utilizada na comunicação dos comercializadores, percebe que o relatório foi pessimista:
“O ministro Alexandre Silveira ressaltou que tem compromisso com o diálogo para construir as soluções convergentes para o futuro sustentável do setor, que a previsibilidade e a segurança jurídica serão princípios no processo decisório e que a diretriz é não adotar nenhuma mudança brusca de rumos no mercado, buscando harmonia com as instituições e agentes. O foco, segundo ele, está na industrialização, conteúdo nacional, licenciamento, consumidores mais vulneráveis. O ministro explicou que os primeiros 80 dias diante da pasta foram aproveitados para conhecer os temas conduzidos pelo MME e que está “muito entusiasmado com as oportunidades”. Disse ainda que há grande alinhamento com as visões do presidente da República, que foi ao MME e participou da última reunião do CNPE. Silveira considera que o CNPE é o fórum adequado para decisão das políticas públicas. Quanto à relação do MME com o Congresso Nacional, que deve deliberar sobre o PL 414/2021, Alexandre Silveira fez questão de apontar a experiência pregressa no Poder Legislativo e mencionou que há “oportunidades para PL 414 e modernização”. Ressaltou que a política pública é feita em conjunto pelo MME com o Parlamento e informou que está buscando trabalhar mais próximo dos órgãos reguladores”.
Quem esperava de Silveira uma declaração enfática de apoio à abertura do mercado, saiu frustrado. Não foi uma surpresa para este site, pois o ministro de Minas e Energia, nestes quase 100 dias de Governo, tenta se mostrar absolutamente articulado com o Palácio do Planalto e quem conhece um pouco sobre a liturgia do Poder, em Brasília, sabe que o PT não acha qualquer graça nessa história de ampliar o ML até os consumidores residenciais, como era a proposta original dos anos 90.
Enquanto tudo isso está acontecendo, paradoxalmente entre alguns comercializadores que têm mais musculatura para operar no mercado não faz qualquer diferença se o PL 414 for aprovado ou não. Esses agentes estão trabalhando a todo vapor, incorporando consumidores de baixo consumo, mas que ainda estão distantes da baixa renda, e que queiram participar do mecanismo denominado como “energia compartilhada”.
Esses agentes nem querem fazer muito barulho, pois, através da verticalilzação, descobriram o caminho das pedras. Investiram pesadamente na geração de energia renovável própria e transferem todos os benefícios para os clientes. Não perdem tempo com o PL 414 e nem com o choro de todos os dias da Abraceel.
Na visão desses agentes, o mercado tem as suas leis próprias de atuação e há brechas legais em que se pode operar e ganhar dinheiro, sem entrar na discussão se o mercado livre será ampliado ou não. Para esses grupos, essa discussão não existe, pois o mercado já foi ampliado e hoje se divide em duas partes: entram na energia compartilhada da geração distribuída os consumidores da classe média para cima, que dispõem de informação e sabem onde buscar energia mais barata, e permanecem no mercado cativo os consumidores dos segmentos mais carentes de informação da classe média para baixo, que não têm acesso à informação e nem opção, a não ser pagar a conta salgada das distribuidoras.