Indígenas argentinos alertam para fracking
Da Redação, de Brasília (com apoio do Instituto ClimaInfo) —
A formação geológica de Vaca Muerta, na Província de Neuquén, na Patagônia argentina, é a segunda maior reserva de gás de xisto do mundo e a quarta maior reserva de óleo de xisto. Esses compostos, no entanto, só podem ser extraídos de forma não convencional por meio da técnica conhecida como “fracking” (fraturamento hidráulico), que perfura a terra de forma incisiva com a ajuda de produtos químicos. Os impactos dessa exploração são uma tragédia para os argentinos dessa região, em especial para os povos originários, como os Mapuche. Mesmo assim, um forte lobby empresarial tenta implementar essa técnica no Maranhão.
O “fracking” é proibido em vários países, incluindo França, Alemanha e Reino Unido. No Brasil, o Paraná foi o primeiro estado a proibir essa técnica, acompanhando a decisão de várias de suas cidades que já tinham banido a exploração em nível municipal. Em 2019, Santa Catarina também aprovou uma lei anti-“fracking”.
Em visita à Argentina em fevereiro, o governo brasileiro sinalizou que pode financiar um gasoduto que vai viabilizar uma maior exploração do potencial de Vaca Muerta, escoando o gás até centros de consumo em Buenos Aires, Rosário ou mesmo no Brasil. A obra seria realizada com recursos do Banco Nacional de Desenvolvimento (BNDES) — a instituição nega. Se isso acontecer, os impactos ambientais observados atualmente se agravarão consideravelmente, e o governo brasileiro marcará um novo descompasso com seus compromissos sob o Acordo de Paris.
Por isso, representantes dos Mapuches estarão no Brasil para participar do encontro da sociedade civil Boas Energias Maranhão, em São Luís, no próximo final de semana, em 21 e 22 de abril. Eles vão apelar à sociedade brasileira para que não financie a ampliação do projeto de Vaca Muerta e alertar sobre o impacto do fraturamento hidráulico. Além do Maranhão, há projetos que ameaçam os estados de Mato Grosso do Sul, Tocantins e Piauí.
“Não é possível ignorar que as empresas que o praticam estão proibidas por lei de realizar “fracking” nos territórios de seus próprios países”, afirma Fernando Eliseo Barraza, indígena Mapuche e que falará no evento. Ele destaca que é importante o Estado brasileiro barrar o avanço do “fracking” em todas as suas regiões.
Para o indígena, o desenvolvimento do “fracking” em Vaca Muerta configura racismo ambiental. “É a negação da existência da população originária que já existia. Em decorrência da própria atividade poluidora e perigosa, a população envolvida no ecocídio é obrigada a abandonar parte de seu território caso faça fronteira com o extrativismo, senão a totalidade. A falta de aplicação dos direitos de moradia comunitária sancionados por leis nacionais e tratados internacionais (como o 169 da OIT) também favorece a sessão de terras cadastradas como ‘fiscais’ para as petrolíferas, condenando aqueles que as habitam e habitaram ancestralmente”.
Em Vaca Muerta, várias petroleiras internacionais, como Total, Chevron e Shell, participam da extração, mas Barraza argumenta que falta remediação. “Nenhuma empresa operadora na formação se comprometeu, desde o início da atividade, a remediar ambientalmente os territórios devastados. Nenhum de seus estudos de recuperação após o impacto ambiental calculado – estudos que são realizados por eles mesmos para apresentar arquivos técnicos ao Estado – são cumpridos ou respeitados”, afirmou.
Entre os impactos ambientais destacados pelo indígena estão a escassez de água potável e envenenamento dos lençóis freáticos, a piora nos quadros de saúde da população local, causada pela contaminação por metais pesados e poluição do ar, levando inclusive a aumento da taxa de abortos, além de terremotos induzidos pelo homem.
“Temos o sonho de que ao levarmos nosso testemunho vivencial sobre o que esse ecocídio está gerando, dispare o alerta e com ele o trabalho consciente em busca de uma militância mais ativa contra o fracking”, finaliza Barraza.