Conversa para boi dormir
Parece brincadeira, mas o todo poderoso Governo Federal aparentemente está com medo de uma manifestação de meia-dúzia de pobres coitados manipulados pelos chamados movimentos sociais e sindicatos, que, na última terça-feira, 12 de janeiro, ocuparam a entrada privativa do Ministério de Minas e Energia, para protestar contra a privatização da Celg. Pelo menos é o que disse o presidente da Eletrobras, José da Costa Carvalho Neto, nesta quinta-feira, 14 de janeiro, durante a cerimônia de inauguração de um parque eólico no Piauí, segundo relato do site “Canal Energia”.
O presidente da Eletrobras é um executivo honrado e muito respeitado no mercado. Tem inclusive a admiração pessoal do editor do site “Paranoá Energia”. Mas a sua preocupação externada no Piauí não passa de uma conversa para boi dormir, pois já passou da hora de a Eletrobras ficar bancando essas distribuidoras falidas. Pode protestar quem quiser, mas pouco importa, neste momento do campeonato, a opinião dos movimentos sociais ou dos sindicatos. Está na hora de passar essas empresas para a frente, isto é, caso alguém tenha interesse em assumir as pesadas dívidas e passar a controlar tais empresas.
As empresas (Celg — de Goiás, Amazonas Energia e os filhotes do ramo de distribuição da Eletrobras nos Estados do Acre, Alagoas, Piauí, Rondônia e Roraima) são diferentes, têm situações peculiares, mas, basicamente, o receituário é um só. Ao longo dos anos foram pessimamente administradas pelos governos estaduais, chegaram ao fundo do poço e só não faliram oficialmente porque isto significaria deixar as respectivas populações sem energia. De forma responsável, o Governo Federal acabou assumindo o controle e a gestão dessas empresas, para não deixar o problema se agravar ainda mais.
Passar para a Eletrobras não era o melhor dos mundos, mas este site concorda que foi uma atitude correta. Agora, está na hora — já está passando da hora — de transferir essas distribuidoras para outros empreendedores, para que novos controladores possam dar continuidade ao plano de saneamento dessas empresas, de modo que elas possam melhorar o atendimento aos seus clientes sem a necessidade de se amparar no combalido Tesouro Nacional.
É possível que, em um processo licitatório, algumas dessas empresas talvez nem sejam transferidas para a iniciativa privada, tamanha a calamidade em que se encontram. No total, a própria Eletrobras julgava, ao final do ano passado, que só em 2016 seria necessário canalizar cerca de R$ 3,3 bilhões para essas empresas. Nem a Eletrobras tem esse dinheiro e nem o Tesouro Nacional, pois a época das vacas gordas acabou em definitivo.
Algumas dessas empresas são naturalmente viáveis. Vale lembrar aqui o caso emblemático da Cemar, do Maranhão, cuja concessão foi devolvida à Aneel há alguns anos, depois que o controlador estrangeiro se cansou de jogar dinheiro na empresa. A Aneel em seguida vendeu a empresa por R$ 1,00 para um novo controlador, que assumiu as dívidas, saneou a empresa e hoje a Cemar é considerada um modelo de gestão.
Na realidade, essa discussão em torno das distribuidoras controladas pela Eletrobras é um pouco bizantina e apenas mostra o atraso do Brasil em determinadas situações. O exemplo mais chocante é a jóia da coroa das estatais, a Petrobras, que caminha aceleradamente para um estado semi-falimentar, se é que já não está lá. É lógico que a Petrobras provavelmente não vai falir sob o ponto de vista oficial. Mas tecnicamente ela está quebrada, pois o seu gestor, o Estado, não é dos mais competentes. Apesar disso, ainda existe muita gente que acredita verdadeiramente que a Petrobras deva continuar sob controle societário do Estado.
Além disso, as distribuidoras controladas pela Eletrobras lembram um pouco os chamados bancos estaduais, que durante anos foram usados pelos governadores como uma espécie de poder emissor paralelo ao da Casa da Moeda. O sistema de bancos estaduais quebrou espetacularmente e foi necessária muita vontade política para transferir a maior parte deles para a iniciativa privada, não apenas para estancar um dos focos da inflação dos anos 80, como também para encerrar aquele festival de maracutaias contábeis bancárias.
Então, Senhores, não há razão para se preocupar com a privatização dessas distribuidoras. O que o MME e a Eletrobras têm que fazer é não dar bola para os movimentos sociais e sindicais, É natural que eles protestem, pois a privatização é contrária ao que pensam ideologicamente. Protestar faz parte da democracia. Entretanto, isto não significa que se deva paralisar o processo de privatização dessas empresas. Como há amparo legal e se trata apenas de decisão política, mãos à obra, pois a sociedade não suporta mais sustentar estatais ineficientes e deficitárias. Chega de ficar jogando dinheiro da sociedade pela janela.