Queijo suíço do ONS faz consumidor cativo perder R$ 630 mi
A Câmara de Comercialização de Energia Elétrica – CCEE – não perdeu tempo. Obedeceu imediatamente à determinação da Aneel e já republicou os valores do Preço de Liquidação das Diferenças – PLD de todas as semanas de novembro de 2016 e das 1ª, 2ª e 3ª semanas de dezembro de 2016 de todos os patamares e de todos os submercados. Assim, houve um pronto atendimento ao disposto no Despacho Aneel nº 3.280, de 14 de dezembro de 2016.
Os agentes também refizeram suas contas e concluíram que as divergências entre a agência reguladora e o operador do sistema deverão representar para os consumidores cativos algo em torno de R$ 110 milhões. Se for acrescentado o custo com a bandeira amarela, que já foi aplicada porque o valor do PLD era mais alto, soma-se mais R$ 520 milhões ao custo . No total, o gasto dos consumidores sobe espetacularmente para R$ 630 milhões.
Nada mal para um País que está andando de lado e que carrega uma crise que atinge a todos, principalmente os menos favorecidos. Enquanto o presidente Michel Temer tenta desesperadamente reerguer a economia e junta os cacos para ver se sobra um dinheirinho a mais no bolso do consumidor, a Aneel se limita à ortodoxia, sapeca sem piedade uma decisão no ONS e obriga a CCEE a recalcular o valor do PLD. No final, sobra para os consumidores cativos, que pagam a conta.
Está mais do que claro que faltou sensibilidade política à Aneel, embora a aplicação da lei talvez esteja correta. Entre os agentes de comercialização, existe uma bola dividida. No final da tarde desta quinta, 15 de dezembro, a associação dos comercializadores, a Abraceel, realizou uma reunião telefônica do seu Conselho de Administração, aberta à participação dos representantes das empresas associadas, para discutir o tema “republicação do PLD”. Este site apurou que cinco conselheiros da associação votaram contra a republicação e três votaram a favor.
Dessa forma, ficou inalterada a posição histórica majoritária da Abraceel, contra a republicação. Para a associação, é uma questão de princípio não alterar peças jurídicas perfeitas como contratos. Vamos imaginar o comercializador que vendeu energia em novembro. Ele emitiu uma nota fiscal e recolheu os impostos. Agora, vem a Aneel e diz que o valor do PLD é menor. Está formada a confusão, lembrando que o Estado já embolsou a sua grana na forma de um imposto mais alto do que aquele que deveria ter sido. Em um forte período recessivo como agora, que se arrasta há meses, de fato não é agradável ver o Estado metendo a mão peluda no bolso das pessoas ou das empresas e cobrando mais impostos do que o necessário.
Outro segmento que não gostou nadinha da decisão da Aneel foi a distribuição. Afinal, as concessionárias de distribuição têm energia sobrando na prateleira, por conta da recessão econômica. E podem liquidar essa energia ao valor do PLD. Como o PLD caiu, automaticamente derrubou a receita das distribuidoras com a eventual liquidação da energia sobrecontratada.
Na próxima semana, dirigentes das concessionárias de distribuição terão uma reunião na Aneel e pretendem incluir o assunto na pauta. A Aneel considerou o recálculo como necessário devido à revisão do processo de previsão de carga por parte do Operador Nacional do Sistema – ONS, em razão de inconsistências encontradas nas informações prestadas pelos agentes; duplicidade devida à representação de conjunto de usinas e de usinas individualizadas; duplicidade de nome; e inconsistências pontuais, caracterizados como erro segundo o Despacho nº 3.280/2016 da Aneel.
Segundo a CCEE, o PLD original para a região Sudeste, em novembro, foi de R$ 218,98 o MWhora. O revisto ficou em R$ 166,05 e a diferença se situou em R$ 52,93. Para o diretor de uma comercializadora, “é extremamente injusto, no momento em que o País está derretendo, a Aneel aplicar uma correção desse tipo no PLD, penalizando ainda mais os consumidores cativos, que estão, afinal, carregando a crise nas costas”.
Embora se respeite o papel histórico da Aneel, também é bom lembrar que, dessa forma, a agência, numa simples canetada de um superintendente, está transferindo somas enormes de dinheiro para aqueles grupos que estão com obras em atraso, normalmente uma estatal ou uma empresa de economia mista que tem uma empresa estatal como acionista relevante. É a sociedade, através dos consumidores cativos, mais uma vez financiando uma empresa estatal que não tem sido boa gestora dos seus recursos.
E, da mesma forma que não se pode pedir aos agentes públicos — no caso a Aneel — para fechar os olhos e não aplicar as leis, também é necessário ressaltar que um dos papéis da agência reguladora consiste em defender os consumidores. Se a agência está aplicando decisões que, ao contrário, punem os consumidores, então alguma coisa está muito errada e precisa ser revista com urgência. Talvez já esteja passando da hora de rever todas essas inconsistências, pois os consumidores não aguentam mais ficar pagando as contas em decorrência da utilização de modelos computacionais mais furados do que queijos suíços.