Trump faz o mundo tremer
Não tem nem uma semana que acabou o Governo de Barack Obama e já estamos com saudades dele. É verdade que Donald Trump está fazendo exatamente aquilo que se esperava dele, pois é o que havia prometido aos seus eleitores. Mas muita gente não acreditava que Trump ia abrir a sua caixa de maldades tão cedo assim. Pois é, abriu.
O Governo de Obama teve muitos méritos e mexeu bastante com as profundezas do conservadorismo americano, que, aliás, sempre torceu o nariz porque um negro virou presidente. Uma das contradições da sociedade americana é a difícil convivência que põe em um lado, no mesmo país, a melhor imprensa do mundo, as mais sofisticadas universidades, os cientistas, escritores e pensadores mais esclarecidos e, no outro lado, o atraso misógino e racista de milhões de “rednecks”, um bando de caipiras que formam a base de apoio do 45º presidente americano.
Esse Governo populista de Donald Trump ainda vai criar muita confusão. Começou comprando uma tremenda briga com a maior parte da mídia, que não engole a idiotice e a superficialidade do novo presidente, e entre as suas primeiras medidas executivas está o desmanche de tratados internacionais nos quais Obama levou anos para convencer seus parceiros a assinar.
Numa canetada, Trump aprovou a construção de dois oleodutos polêmicos, que tinham sido suspensos pelo antecessor. Um projeto vai trazer petróleo do Canadá para alimentar refinarias em território americano. O segundo vai atravessar terras indígenas no estado de Dakota do Norte. A língua espanhola foi deletada de sites da Casa Branca. A globalização, cantada em prosa e verso nos últimos 20 anos, foi para o espaço. A chamada “Pax Americana”, que esteve em vigência desde a Segunda Guerra Mundial, também vai virar farelo. Quem poderia dizer que os americanos, tão apegados ao espírito das leis, rasgariam tratados internacionais com tanta facilidade?
Na área internacional, encontram-se os principais perigos quanto à limitada visão de mundo de Donald Trump. O Governo ultra-direitista de Israel, que era tratado a pão e laranja por Barack Obama, já recebeu um sinal de Trump para se apropriar de áreas pertencentes aos palestinos, aumentando assim a tensão na região.
Como se isso não fosse suficiente, Trump acena com a possibilidade de transferir a embaixada dos Estados Unidos de Tel Aviv para Jerusalém, algo que nenhum outro presidente americano teve a coragem de fazer. Jerusalém, afinal, tem a sua parte oriental ocupada militarmente desde a Guerra de 1967 e é ali que os palestinos pretendem constituir a capital do seu sonhado estado. Quem conhece a região sabe perfeitamente que Trump está irresponsavelmente brincando com fogo.
Trump é um perigo e uma ameaça para todo o mundo. Aqui mesmo no Brasil ele conta com admiradores, gente que também morre de saudade da ditadura e que acha que pode resolver alguns problemas nacionais na base da valentia e do porrete. Essa turma ainda vai falar grosso até a eleição do próximo ano, ainda mais turbinada pela gestão de Trump. Também temos os nossos “rednecks” e não são poucos.
A monumental demonstração organizada em muitas cidades americanas, em repúdio a Trump, no dia da sua posse, mostra claramente que a democracia americana terá anos difíceis pela frente. O estilo agressivo e provocador do novo presidente facilita a organização de manifestações contra a sua megalomania.
É difícil imaginar que será diferente. Em situações normais de temperatura e pressão, sabe-se que campanha eleitoral é uma coisa, mas, depois de conhecidos os resultados das urnas, as coisas tendem a ficar um pouco mais tranqüilas. Trump teve essa chance, mas a desperdiçou. Ao contrário, colocou mais lenha na fogueira.
O Brasil é um país de periferia, que não tem saneamento básico, sequer sabe administrar crises de febre amarela e doenças tropicais transmitidas por mosquitos e, em suas penitenciárias, ainda se cortam cabeças de condenados pela Justiça. Não tem muito o que apitar no atual contexto. Não se deve esperar muito da diplomacia brasileira da Era Temer, que é contida e burocrática, com zero de criatividade.
Nada impede o Brasil de ter uma diplomacia atuante e que não tenha medo de denunciar as eventuais barbaridades que Trump venha a cometer, mas isso dificilmente vai acontecer. O Brasil está rigorosamente perdido diante do apetite demonstrado por Trump para criar confusão.
Ainda é muito difícil dizer como reagirão os países mais ativos da arena internacional e de economia mais desenvolvida, como China, Alemanha, Japão, França, etc. Aparentemente há total sintonia, como sempre, entre Inglaterra e Estados Unidos. O fim da Parceria Trans-Pacífico (TPP, em inglês), do Nafta e da globalização certamente afetarão o Brasil, mas em que nível isso ocorrerá ainda é prematuro dizer. Por enquanto, só nos resta olhar pro Céu e pedir para que o Brasil não fique pior do que está.