A Aneel, ano 20
Instituída em 02 de dezembro de 1997, com o propósito de substituir o Departamento Nacional de Águas e Energia Elétrica (DNAEE) e modernizar a regulação do setor elétrico brasileiro, a Aneel lançou nesta segunda-feira, 13 de março, uma campanha institucional para marcar os 20 anos de existência. Este é um bom momento para fazer uma reflexão a respeito do trabalho da agência reguladora.
A autarquia Aneel, vinculada ao Ministério de Minas e Energia, foi criada pela Lei 9427, de 1996, mas o Decreto nº 2.335, que a regulamentou, foi assinado um ano depois e representa efetivamente a data de aniversário da agência.
Esse decreto significou um sopro inovador na época, pois o DNAEE há muito tempo já havia cumprido o seu papel histórico e estava ultrapassado, principalmente porque o departamento estava identificado com um modelo estatal que deixava de existir, abrindo espaço para a iniciativa privada. O Decreto 2335 também foi caracterizado por alguns princípios que desde então simbolizam a atuação da Aneel: autonomia, transparência, diálogo e imparcialidade.
É possível dizer, sim, que a Aneel tem sido uma agência reguladora de sucesso e que persegue os princípios que a criaram. Mas tem uma situação que envolve todo o setor elétrico brasileiro (e portanto a Aneel) que merece uma reflexão especial no ano em que a agência completa 20 anos: é de fato absolutamente necessário ter tanta burocracia para fazer o setor elétrico funcionar?
A Aneel tem o mérito de ser transparente. E é exatamente essa transparência que mostra o tamanho extraordinário da burocracia. Foi a primeira agência a fazer com que as reuniões semanais da diretoria se tornassem públicas e além do mais transmitidas pela internet. Mas quem se der ao trabalho de acompanhar uma dessas reuniões, pessoalmente ou pela internet, vai se espantar com a densidade do cipoal burocrático, que só faz a alegria dos advogados. A Aneel aparentemente não colabora muito para reduzir o peso da burocracia nas suas atividades de rotina.
Há poucos dias, este site colocou esta questão para um especialista em setor elétrico e ele alegou, com certo desconforto, que a burocracia em sistemas elétricos é uma característica mundial e que o Brasil, nesse quesito, não estaria sendo diferente dos demais países. Brincou, ainda, dizendo que esse fenômeno acontece porque no mundo inteiro os especialistas em energia elétrica basicamente estudaram nos mesmos livros.
Verdade ou não, este site discorda e entende que é possível, sim, diminuir a enorme burocracia que trava o setor elétrico brasileiro e da qual a Aneel faz parte. Há um inequívoco exagero na dose da regulamentação. Se isso fosse possível, as empresas do setor elétrico poderiam respirar com um pouco mais de facilidade. Quando se observa a relação de superintendências no organograma da Aneel, vê-se claramente que há muito cacique para pouco índio.
Em favor da Aneel, pode-se argumentar que a burocracia é uma característica de todo o Estado brasileiro. Também é verdade. E a Aneel é, sobretudo, um órgão de Estado. As agências reguladoras, enfim, são instituições de Estado, destinadas a regulamentar, fiscalizar e mediar os eventuais conflitos que existam entre os agentes econômicos e os consumidores.
O excesso de burocracia, entretanto, não invalida o trabalho efetuado pela Aneel, que é uma instituição que se faz respeitar. Como todo aparelho burocrático, às vezes é surpreendida por algum desvio de conduta, o que, no entanto, não é uma característica do seu corpo funcional, qualificado e sério.
Ao longo da sua história de quase 20 anos, a Aneel tem sofrido a interferência do poder político, seja através do contingenciamento orçamentário, seja mediante a ação política direta.
Essa vontade do Governo de controlar a Aneel já aconteceu em outras oportunidades. Inclusive no período do presidente Fernando Henrique, por exemplo, até porque era uma fase de transição do modelo do DNAEE para o modelo de agência, e as pessoas ainda não sabiam direito como proceder. Esses conflitos ficaram claros em 2001, quando o País mergulhou no racionamento de energia elétrica, uma das maiores falhas de gestão do Governo FHC.
Mas, aos trancos e barrancos, mesmo no Governo FHC a Aneel foi evoluindo e encontrando o seu caminho de autonomia. Depois, nos governos do PT — até porque ideologicamente os petistas são contrários à existência das agências — a vontade de controlar a Aneel foi escancarada e não faltou, dentro dos quadros da própria agência, quem fosse subserviente e submetesse a Aneel aos caprichos do Governo.
Hoje, a Aneel tem uma autonomia bastante ampla, mas comenta-se nos bastidores de Brasília que, embora o diretor-geral da agência, Romeu Rufino, tenha mandato até meados do próximo ano, haveria um interesse dissimulado do Ministério de Minas e Energia no sentido de colocar no seu lugar alguém que tenha mais intimidade com aqueles que dão as cartas atualmente no MME. O poder político sempre se sente eclipsado pelo trabalho das agências, pois estas retiram a visibilidade daqueles que gostam de aparecer.
Rufino precisaria renunciar para que isso acontecesse e ele não parece ser o tipo de dirigente que entrega a rapadura com qualquer pressão vinda da Esplanada dos Ministérios. Acostumado a laçar boi na fazenda, Rufino é um técnico duro na queda.
Embora crítico em relação ao trabalho da Aneel, este site reconhece o seu esforço, cumprimenta a agência reguladora pelo lançamento da campanha comemorativa dos 20 anos e se engaja na aspiração coletiva para que o ano de 2017 seja aproveitado para revisitar as atividades da Aneel de forma crítica, de preferência diminuindo a sua enorme burocracia.