Começo preocupante
A indicação de Márcio Félix Carvalho Bezerra, secretário de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis para a secretaria-executiva do Ministério de Minas e Energia, no lugar de Paulo Pedrosa, mostra um início preocupante para a gestão Moreira Franco, que efetivamente começa nesta terça-feira, 10 de abril.
Não que Félix, que é um especialista na área de petróleo, não possa se sair bem como secretário-executivo. Ocorre que, em pouquíssimas oportunidades, como agora, o MME teve no seu alto escalão duas pessoas que não entendem nada de energia elétrica. O ministro fez carreira na vida política. Félix tem a sua história profissional vinculada às áreas de petróleo e gás.
Aparentemente, essa decisão de indicar Félix confirma algo que vinha sendo falado em Brasília nos últimos dias: a prioridade do atual ministro será tentar recuperar a indústria de óleo e gás no seu reduto eleitoral, que é o Estado do Rio de Janeiro. Em termos práticos, o setor elétrico, que é a jóia da coroa do MME, acaba de ser rifado.
É impressionante como os políticos brasileiros (de várias épocas, de todos os partidos) não conseguem perceber a importância do MME como vetor de desenvolvimento econômico e tendem a indicar figuras despreparadas para ocupá-lo, como se fosse uma Pasta de terceira categoria. Basta dar uma olhada na galeria dos ex-ministros, para observar que não há exagero no que está sendo destacado.
Olhando retroativamente só para o chamado período da redemocratização, pós-ditadura militar, a lista de despreparados que ocuparam o MME é enorme: Edison Lobão, Dilma Rousseff, José Jorge, Rodolpho Tourinho, Alexis Stepanenko e Vicente Cavalcanti Filho. Também não se pode desprezar alguns que, mesmo sendo do ramo, não eram lá uma Brastemp e, ao contrário, se destacavam pela mediocridade técnica.
O ex-ministro Fernando Coelho Filho escapou por pouco dessa lista, pois também não tinha qualquer intimidade com o SEB. Mas pelo menos teve o bom senso de confiar em pessoas que conheciam e saiu com uma nota razoável ao final da sua gestão.
Agora, Moreira Franco engrossa a lista. E ainda indica para a secretaria-executiva alguém que também desconhece o setor elétrico. Se houvesse no Brasil um Ministério do Petróleo, Félix até seria um nome razoável, pois reúne conhecimento e experiência. Entretanto, em relação à energia elétrica, a sua intimidade limita-se ao interruptor de acender e apagar a luz. É possível que tenhamos problema pela frente.
Alguém poderá lembrar que José Serra não é da carreira da Saúde e, mesmo assim, foi um ótimo ministro da Pasta. É possível acontecer, porém é um fenômeno raro. Moreira Franco, por um desses milagres, poderá ser, ao final, um excelente ministro. Mas, pelo histórico, não é algo que provavelmente vai acontecer. Moreira Franco é um figurinha carimbada da política brasileira há muito tempo.
Ao contrário, é uma má notícia para o Brasil e lembra um pouco a gestão de Rodolpho Tourinho, que era até um especialista razoavelmente competente na área fiscal e financeira, mas que não sabia nadinha de energia elétrica. Teve a infelicidade de ter como secretário-executivo um diplomata de carreira, Hélio Vitor Ramos, que também não sabia nada. Juntou o nada com o nada, só podia dar nada.
Na estrutura do MME na época, a pessoa que mais conhecia o setor elétrico era Benedito Carraro, secretário nacional de Energia, que estava no terceiro escalão. Com Tourinho e o diplomata dando as cartas e embora Carraro tenha se esforçado muito para não deixar a peteca cair, não deu outra coisa: o Brasil acabou no racionamento de 2001/2002.
Quando a crise de suprimento se agravou, Tourinho foi demitido. Indicado para suceder Tourinho e segurar a barra do racionamento, José Jorge — que era um muito simpático senador de Pernambuco, mas um neófito em energia elétrica, virou uma espécie de “Rainha da Inglaterra”. No meio de toda aquela magnífica crise de falta de energia, quem mandava e desmandava era Pedro Parente, ministro-coordenador da Câmara de Gestão da Crise de Energia Elétrica.
Nessa condição, Parente foi um extraordinário ministro de Energia. O racionamento foi um monumental exemplo de incompetência do Governo FHC, mas a gestão da crise foi fantástica, um dos momentos mais eficientes do setor público brasileiro, em todas as épocas.
O principal problema a ser resolvido hoje, no MME, não é a implementação do novo modelo do setor elétrico (que amplia o mercado livre) e tampouco a privatização do Sistema Eletrobras. São duas iniciativas muito importantes, mas o mais prioritário para os agentes é resolver um problemão chamado risco hidrológico, conhecido pela sigla em inglês GSF.
Há meses, o mercado de energia está literalmente travado e a dupla Coelho-Pedrosa não conseguiu resolver a situação. Quem compra não paga e quem vende não recebe. Noutras palavras, o dinheiro não muda de mãos, graças a uma série de liminares que impedem o livre funcionamento do mercado. Provavelmente, nem Moreira Franco e nem Márcio Félix sabem o que significa o GSF. Terão que ouvir a opinião de alguém. Aí é que mora o perigo, até porque o MME perdeu não apenas o secretário-executivo Paulo Pedrosa, mas também o presidente da EPE, Luiz Barroso, que era o principal planejador da Pasta e igualmente renunciou ao cargo. Existe uma expectativa que outros funcionários qualificados da gestão anterior também deixarão o MME e voltarão aos seus órgãos de origem.
O fato concreto é que ao arranjar uma cadeira de ministro para o seu colega de partido, o presidente Temer apenas demonstrou o pouco apreço que tem pelo setor elétrico brasileiro. O jeito é relaxar, esperar pelas próximas eleições e torcer para que o próximo presidente da República não seja outro despreparado. Que ele tenha condições para entender o que significa o MME para o País e que coloque no seu comando alguém com competência e que esteja em condições de saber o que vai fazer na Pasta.