Um discurso para Moreira
O ministro de Minas e Energia, Wellington Moreira Franco, tem dito em conversas reservadas, para interlocutores privilegiados, que gostaria de conhecer mais a questão e que, a princípio tem muita simpatia pelo mercado livre de energia elétrica. Apenas há poucos dias como responsável pelo MME, o ministro ainda não percebeu que tem um excelente discurso nas mãos.
Quando foi indicado pelo presidente Michel Temer, o seu nome teve, não se pode negar, uma acolhida fria pelos agentes setoriais, que gostariam de ter visto na Pasta, como sucessor do ministro Fernando Coelho Filho, o então secretário-executivo Paulo Pedrosa. Este representaria a continuidade de uma política que dava certo. Nesse sentido, o nome de Moreira foi uma ducha fria.
Mas é preciso reconhecer, depois dos primeiros dias, que a presença de Moreira no MME pode não ser o fim do mundo. O novo ministro é um ser político por excelência, no sentido aristotélico. Está acostumado, como poucos, a se mover nas entranhas do mundo político, e sabe que existem determinados momentos em que se precisa tomar decisões difíceis, mas históricas, mesmo que gerem alguns conflitos com algumas minorias. O ministro está acostumado com essas decisões.
Agora que assumiu o MME, com o qual ele não tem muita intimidade — o que ele próprio, em um sinal de humildade, reconhece — ele tem condições de tomar uma dessas decisões. Uma delas é a ampliação do mercado livre de energia elétrica, uma questão que pertence 100% ao seu ministério.
O mercado livre de energia elétrica, também conhecido pela sigla ACL, foi criado no início dos anos 2000, como forma de escoar a energia que estava retida pelos geradores, em conseqüência do racionamento de 2001/2002. Desde então, o ACL cresceu e hoje representa cerca de 28 a 30% da energia comercializada no País, beneficiando apenas uma parte da indústria. São os consumidores intensivos e também a média indústria. Quando se utiliza a chamada energia incentivada, agrega-se outros tipos de consumidores, mas o fato concreto é que uma parte significativa da indústria ainda está fora do ACL.
O governo petista discretamente tentou acabar com o mercado livre, mas não conseguiu. Parte expressiva da grande indústria já fazia parte dele e esses caras têm muita força política. Como não conseguia acabar com o ACL, o governo petista tentou sufocá-lo, impedindo que crescesse além dos 30%.
Vários agentes, principalmente os comercializadores, batalham em favor da tese da abertura total do mercado, o que representa uma questão muito relevante e colocaria o Brasil, se efetivado, em condições de igualdade com outros países. É possível que nem todos os consumidores migrariam para o ACL, mas pelo menos seria democraticamente oferecida a opção de serem livres.
É uma tese moderna e civilizada, pois reconhece o direito de escolha dos consumidores de energia elétrica. Com muitos anos de atraso, estes brasileiros, enfim, teriam o mesmo direito que já é reconhecido, por exemplo, aos consumidores dos serviços de telecomunicações.
O Brasil é um país complexo socialmente e os adversários da liberdade total, neste caso, argumentam que ela esbarraria em questões sociais, principalmente em uma certa anarquia urbana que existe em muitas cidades brasileiras. É uma outra tese respeitável.
Entretanto, voltando ao ministro Moreira Franco, ele poderá entrar para a história do setor elétrico brasileiro se resolver empalmar a tese da ampliação do mercado livre. A primeira coisa a fazer seria desengavetar uma proposta encaminhada pelo seu antecessor, que dorme em alguma gaveta na Casa Civil da Presidência da República. A proposta seria enviada para o Congresso, pois depende de algumas decisões de natureza legal.
Neste aspecto, como ex-congressista atuante e figura influente no seu partido, o ministro Moreira Franco poderia batalhar pela tramitação da proposta, que é muito menos polêmica, por exemplo, que a privatização do Sistema Eletrobras. Aliás, será que existe algum congressista na face da Terra que teria coragem de se posicionar contra interesses legítimos dos consumidores? Os congressistas são figuras meio complicadas, mas aparentemente ainda não apareceu um maluco desse tipo, que trabalha contra as suas próprias bases eleitorais.
Esta opinião do editor do site nem de longe pode ser confundida com alguma aula que se queira dar ao ministro de Minas e Energia. Em política, ele não precisa de aulas, pois é professor. Mas este editor também entende que, recentemente ungido como titular de uma Pasta tecnicamente complexa, ele não tem a obrigação de conhecer tudo. Esta opinião, portanto, é uma sugestão que respeitosamente se apresenta ao ministro Moreira Franco.
A bola está na pequena área, implorando para ser chutada para dentro da rede. Compete ao ministro dizer se tem ou não vocação de centro-avante artilheiro.