Militares aparelham o MME
A indicação de um general da reserva para ocupar a presidência da Petrobras — o primeiro militar a dirigir a empresa desde 1989 — não representa um fato isolado. Na gestão do presidente Jair Bolsonaro, os civis pouca importância têm na estrutura do Ministério de Minas e Energia, que, hoje, atravessa um forte processo de militarização, o que não ocorreu nem mesmo na época da ditadura militar. O destaque vai para muitos oficiais superiores da Marinha de Guerra, o segmento de origem do ministro Bento Albuquerque, que é um almirante de Esquadra.
Na estrutura direta do MME, Albuquerque discretamente aparelhou a Pasta com militares da ativa ou da reserva, cercando-se principalmente de antigos companheiros da Armada. Seu chefe de Gabinete é José Roberto Bueno Junior, um oficial superior da Marinha. O assessor especial do ministro é Alan Sampaio Santos, um oficial superior do Exército.
Roberto Pinheiro Klein Junior, outro oficial superior da Marinha, é o chefe da Assessoria Especial de Acompanhamento de Políticas, Estratégias e Desempenho Setoriais. Klein tem como assessor técnico João de Amorim Litaiff Junior, outro oficial da Armada.
O chefe da Assessoria Parlamentar do MME (cargo que um dia foi do atual ministro, mas na Pasta da Marinha) é Pedro Hugo Teixeira de Oliveira Junior, o qual naturalmente vem da Marinha, onde tem a qualificação de oficial. A Subsecretaria de Planejamento, Orçamento e Administração tem como titular outro oficial da Armada, Hélio Mourinho Garcia Junior.
Na Petrobras, que brevemente deverá receber o general Joaquim Silva e Luna como presidente executivo, a presidência do Conselho de Administração já é ocupada pelo almirante de Esquadra Eduardo Bacellar Leal Ferreira, que, inclusive, já foi até mesmo o comandante da Marinha. Na Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), o diretor-geral é o contra-almirante Rodolfo Henrique de Sabóia.
Entretanto, é na parte brasileira da diretoria da binacional Itaipu que a militarização nos altos quadros dirigentes assume a sua maior expressão.
Já foi noticiado que o general Luna e Silva será substituído por outro general, João Francisco Ferreira. Também são militares: Paulo Roberto da Silva Xavier, diretor-administrativo (oficial superior da Marinha); Anatalício Risden Junior, um vice-almirante, que ocupa a diretoria financeira; e Luiz Felipe Kraemer Carbonell, um general de Divisão do Exército, que é o diretor de Coordenação da UHE Itaipu. Além deles, outro oficial superior da Marinha, Célio Faria Junior, integra o Conselho de Administração da binacional.
No dia 26 de janeiro, quando foi anunciada a renúncia de Wilson Ferreira Junior na presidência executiva da holding Eletrobras, este editor escreveu que aquela notícia poderia representar um mau sinal em relação aos projetos em andamento no Congresso Nacional, de interesse direto do setor elétrico brasileiro. Notadamente, a proposta de modernização do SEB e de privatização da própria Eletrobras.
O mote poderia ser repetido agora. A saída de Roberto Castello Branco da presidência da Petrobras pode igualmente ser um mau sinal, porque afinal o presidente Bolsonaro aparentemente resolveu conduzir a política de combustíveis de acordo com o que desejam os caminhoneiros, que constituem uma força expressiva dos seus seguidores. Sai a racionalidade, entra o populismo.
Pode também ser um mau sinal pois representaria o abandono total de uma visão liberal que o então candidato Bolsonaro apresentou durante a sua campanha na eleição para presidente da República. Vendeu uma coisa e está entregando outra.
Qualquer criança da escola fundamental sabe que os militares não são exatamente liberais quando se fala em economia. Ao contrário, eles gostam muito do modelo econômico que prevaleceu durante o governo do presidente Geisel, quando o Estado se intrometia em tudo e dava as cartas.
Nesse contexto, a substituição de Castello Branco pelo general Silva e Luna, na Petrobras, e a substituição deste pelo general Ferreira, na binacional Itaipu, revelam claramente que o governo já não tem qualquer preocupação em camuflar a ostensiva militarização do setor energético brasileiro.
Assim, não causará espanto a este site se outro oficial superior das Forças Armadas for indicado para o lugar de Wilson Ferreira Junior na presidência executiva da Eletrobras. De certo modo, o Brasil está seguindo o modelo chavista, de infiltrar a administração pública com oficiais das Forças Armadas.
Um dos mais renomados especialistas do setor elétrico brasileiro, que, aliás, nunca escondeu a sua admiração pelo presidente Jair Bolsonaro, espantou-se com tantos militares ocupando funções estratégicas que historicamente foram desempenhadas por civis, na estrutura do Ministério de Minas e Energia.
Com uma ponta de ironia, comentou para este site:
“Diziam que os governos do PT eram aparelhados pelos quadros do partido ou de outras siglas da coligação de esquerda. Agora, também temos o MME totalmente aparelhado, só que pelo pessoal que usa uniforme. Não mudou muita coisa. Saiu o pessoal de vermelho e entrou o pessoal de branco ou verde oliva. Tem muita gente batendo continência no MME”.