Chega de embromation
A área empresarial do setor elétrico botou pressão no ONS e exigiu (embora formalmente a linguagem tenha sido mais educada) imediatas melhorias no mecanismo de divulgação utilizado pelo Operador em relação às informações que impactam a formação dos preços. Na verdade ninguém aguenta mais tantos remendos na formatação dos preços.
Essa história é mais velha do que andar para a frente e tem sido uma constante na relação entre os agentes e o Operador. A origem de tudo é o compromisso histórico que os dirigentes do SEB têm com a formação de preços baseados em modelos matemáticos. Engenheiros são conservadores e não gostam de alterar as coisas que estejam funcionando, mesmo que estejam funcionando mal.
Daqui uns tempos, haverá novo deslize por parte do ONS, os agentes vão reclamar, o Operador vai garantir que não vai acontecer novamente e todos nós já sabemos como essa história prossegue. Até parece conversa de marido que chega bêbado em casa todas as noites, até morrer de cirrose. A esposa, coitada, cansou de ouvir que aquela garrafa de pinga era a última.
Este site apurou que esses avanços no processo de formação de preços foram discutidos com dirigentes da associação dos comercializadores, a Abraceel, no dia 04 de maio. O Operador, com humildade, reconheceu que era necessário melhorar e pediu à associação que indicasse o que poderia ser feito, de imediato, para aumentar a transparência, a isonomia e a previsibilidade em relação aos preços. São três questões fundamentais para os agentes de comercialização.
É importante deixar bem claro que este site reconhece a qualidade técnica do trabalho do Operador. O Paranoá Energia defende a sua fusão com a CCEE, mas por outro motivo, não porque seja incompetente. Apenas por uma questão de governança inadequada.
Ao contrário do que se poderia pensar, o pessoal do ONS tem muita qualificação. Só que trabalha dentro de um modelo que, por ser matemático, muita gente acha que é moderno. É um equívoco. Ao contrário, é atrasado e gera muitos problemas. Seria muito mais fácil deixar que compradores e vendedores se entendessem diretamente em relação aos preços, mas o Operador entende que não.
Seus magníficos engenheiros acreditam que os números podem tudo, quando na realidade o mercado é algo muito mais sutil e dispensa totalmente as complexas fórmulas matemáticas que são conhecidas apenas pelos magos do ONS. Este é unicamente o seu problema, na visão deste site. Os excelentes técnicos que trabalham no ONS podem entender bastante de matemática ou de engenharia, mas convenhamos, já está mais do que passando da hora de compreenderem e reconhecerem que não entendem nadinha de mercado. Isso é outro departamento.
O mais lamentável em tudo isso é que essa visão distorcida, tecnocrática, em relação ao mercado, não é apenas do ONS e atravessa todo o setor elétrico. Ela está presente na Aneel, na CCEE e, não é brincadeira senhores, até mesmo no coração do sistema, que é o Ministério de Minas e Energia. Por isso, não é sem motivo que tem gente querendo acabar com o MME, como mostra a manchete deste site. De repente, pode ser uma ideia interessante.
Uma vez a Abraceel pediu pessoalmente ao ministro de Minas e Energia que designasse um integrante de sua equipe direta para ser interlocutor da associação nas questões de mercado. Feliz, o então ministro prontamente atendeu o pedido. E designou um cidadão que dava até pena. Ele não sabia absolutamente nada sobre o mercado de energia elétrica, da mesma forma que o então secretário-executivo, que era o seu chefe, e o próprio ministro. A história não é uma piada. Seria cômico, se não fosse trágico. Estamos falando da alta cúpula do MME, há pouquíssimos anos. Não mudou muito. Na cúpula do MME, hoje, também existem aqueles que desconhecem como funciona o mercado.
É por isso que o mercado no Brasil avança em soluços. Tem enorme potencial, mas infelizmente sub-aproveitado. Diversas pesquisas mostram que os consumidores gostariam de contratar diretamente a sua energia. Mas isso significaria tirar o poder de burocratas que há décadas sentam sobre o setor elétrico e impedem o seu avanço.
É tudo tão desanimador que a Abraceel já trabalha com nova data. Na visão dos comercializadores, o mercado brasileiro de energia elétrica talvez possa estar totalmente livre por volta de… 2027.
Isso, na melhor das hipóteses. Se o Congresso deixar, se os engenheiros do Operador deixarem, se os escritórios de advogados que lucram milhões com a judicialização de tudo também deixarem. Se os próprios agentes perderem o medo e saírem do comodismo.
Não é preciso ter medo para afrontar o sistema. O mundo avançou porque ao longo da História as pessoas não tiveram medo para bater de frente com a burocracia. Só que, no setor elétrico brasileiro, existe uma situação estranha, em que a burocracia paira ameaçadoramente sobre os agentes, desde a privatização, e tudo fica congelado na hora de enfrentar o sistema.
Ei, SEB, acorda. Ei, associações empresariais do setor elétrico, acordem.
Está na hora de chutar o balde e construir um modelo que seja bom e eficiente para o País e barato para os consumidores. Não podemos indefinidamente continuar a ter a energia elétrica mais barata do mundo e a conta de luz mais cara. É lógico que está tudo muito errado e já está passando da hora de jogar o modelo dos anos 90 na lata do lixo. Chega de embromation.