Cpamp, o Centrão do setor elétrico
Os eletrocratas que batem ponto na Comissão Permanente para Análise de Metodologias e Programas Computacionais do Setor Elétrico (Cpamp) se reuniram na quinta-feira passada, dia 22 de julho, quando aprovaram o que denominaram “aprimoramentos propostos na cadeia de modelos computacionais utilizados pelo setor elétrico”. Esses eletrocratas não entregam a rapadura. Eles mandam no SEB há décadas e resistem bravamente a qualquer tentativa de modernização.
Houve duas consultas públicas abertas pelo Ministério de Minas e Energia. Em consequência, através de um comunicado ao público, o MME informou que foram recomendadas: (i) a representação do Volume Mínimo Operativo (VminOp) no modelo Decomp por meio da funcionalidade RHE (Restrição Hidráulica de Energia); (ii) a atualização dos níveis do VMinOp com base nas premissas aprovadas pelo Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE) para cálculo dos níveis mínimos da Curva de Referência; (iii) o par de parâmetros CVaR (25,45); e (iv) a continuidade de validação do PAR(p)-A para o ciclo 2021/2022.
Se o coitado do leitor não entendeu patavina, relaxe. Só os eletrocratas entendem essa linguagem em código. Segundo o MME, “entre as principais motivações para os aperfeiçoamentos propostos consta a necessidade identificada de se melhorar a representação da realidade operativa do Sistema Interligado Nacional (SIN) nos modelos, e proporcionar o adequado sinal econômico do PLD e justa alocação dos custos para os diversos segmentos”.
Este site vai tentar traduzir para a língua falada no Brasil o que aconteceu por trás da narrativa deliberadamente hermética do MME. Até o término da CP 109/2021, aberta no período de 02 de junho a 02 de julho, corria tudo muito bem para o lado da Cpamp, a qual acreditava que seria moleza aprovar os critérios de risco para incorporar parâmetros nos modelos computacionais, como a representação do Volume Mínimo Operativo (VminOp) para os reservatórios, a adoção da metodologia PAR(p)-A, em substituição ao PAR(p) responsável pela geração de cenários de vazões e a nova parametrização para o critério de aversão a risco CVaR, que nada mais é do que a percepção do risco do sistema na visão da Cpamp.
Esses critérios se complementam. Assim, os parâmetros de um influem na parametrização dos outros no que diz respeito ao objetivo de se tentar fazer com que os modelos representem mais a realidade física da operação do sistema elétrico. Quando a Cpamp navegava em mar de almirante, ou seja, com tudo calminho e ondas de 1 metro de altura, para aprovar todo esse maluquice tecnocrática engendrada pelo Cepel/ONS, veio a surpresa.
Um professor de uma universidade carioca deu uma olhada sem compromisso no material produzido pelo Cepel e descobriu um erro na programação da nova metodologia PAR(p)-A. O famoso estagiário do ONS aparentemente agora estava trabalhando em dobradinha com um estagiário do Cepel. Tocou horror na burocracia do setor elétrico.
Às pressas parou tudo. A Cpamp convocou uma consulta pública extraordinária, a MME 111/2021, com prazo curtíssimo para entrega das contribuições, para viabilizar a aprovação de outra parametrização em substituição a que estava sendo aprovada.
Simplesmente se passou um pano nessa lambança, a Cpamp voltou atrás e decidiu manter intacto os parâmetros do CVaR vigentes, a título do compromisso com a previsibilidade, transparência e a participação dos agentes. Esse discurso é uma lorota da melhor qualidade, estilo Rolando Lero.
Como não vai mudar nada por enquanto, o sistema elétrico simplesmente será obrigado a conviver com as tradicionais distorções desses modelos computacionais, que de vez em quando enlouquecem os agentes que operam no setor. Na linguagem da Cpamp, com o elevado volume de geração térmica fora da ordem de mérito (GFOM), o aumento do deslocamento hidráulico correspondente (GFS), a sinalização inadequada de escassez e garantia física (GF). Situações, enfim, que estão a alguns anos-luz de distância de uma eficiente e correta realidade operativa.
Em bom português, caro leitor, o que vai acontecer é o seguinte: prepare o bolso. O sistema continuará sendo operado de modo que o consumidor será convocado a pagar fortunas em encargos.
Curiosamente, embora todas estas coisas sejam claras para os que habitam o planeta da energia elétrica, houve quem teve a cara de pau de comemorar a decisão da Cpamp, alegando que foi uma grande vitória do mercado. Grande equívoco. Não houve vitória alguma do mercado. A Cpamp foi apenas flagrada com a calça na mão e a bunda de fora, pois estava caminhando para aprovar uma proposta inconsistente sob o ponto de vista técnico. O MME recuou, pois não havia outra coisa a fazer, e apenas transferiu aquilo que pretende alterar para 2022.