A Europa numa sinuca de bico
É compreensível que, faltando menos de um mês para as próximas eleições, os brasileiros estejam emocionalmente ligados ao que se passa no próprio País. Mas vale a pena acompanhar um pouco o que acontece na Europa, em termos energéticos, o que fatalmente vai impactar o mundo político de todo o planeta.
De acordo com uma definição recente do “The Wall Street Journal”, o pior cenário da crise energética se aproxima da Europa, a passos largos, com a chegada do inverno.
Está acontecendo algo na Europa que não se pode negar, embora algumas pessoas finjam que não estão entendo o processo. O fato é que a Europa está em guerra contra a Rússia. É uma guerra de procuração, em que os países da Otan armam pesadamente a Ucrânia, que por sua vez enfrenta a Rússia. Este texto não vai entrar no mérito da guerra, quem está certo, quem está errado.
Só que a Europa depende da energia (petróleo, gás natural e em alguns países de energia elétrica) que vem da Rússia. Agora, a Rússia resolveu endurecer o jogo, falou grosso e anunciou que não tem mais gás para a Europa. Simplesmente fechou a torneira. Já se esperava que os russos usariam a sua preciosa energia como arma de guerra.
O petróleo já está sendo direcionado para a Índia e China. E o temido inverno está chegando. Provavelmente a Europa passará frio, pois não haverá gás em volume suficiente nos estoques europeus para aquecer as residências.
A Rússia também anunciou que só voltará a fornecer gás natural para a Europa quando as sanções contra Moscou forem suspensas. Então, é uma crise extraordinária, histórica, que poderá levar a várias consequências. Uma delas já está na mesa, que é um forte aumento da inflação na Europa, com risco de uma recessão tremenda na economia, aumento do desemprego, etc.
Ou seja, a Europa está numa sinuca de bico. Alguns países têm a inflação mais alta em 40 anos. Não é o melhor dos mundos no momento. Ou mantém a aliança militar atlântica com os Estados Unidos ou abre o bico, racha a Otan e sabe-se lá o que vai acontecer. Os russos, que ainda não usaram a força máxima contra a Ucrânia, apenas olham de longe, friamente, como sempre fizeram. São mestres nisso, nesse olhar glacial.
Atrás dos russos, garantindo firme apoio a Moscou, estão os chineses, cuja paciência ninguém pode ignorar. Lógico, é um país com 5 mil anos de História e já viu de tudo. Já foi rico, já foi pobre, é rico de novo e daqui a pouco será a maior economia da Terra, o que angustia os americanos.
Também não se pode negar que há uma crise de lideranças na Europa e nos Estados Unidos. Goste-se ou não de Putin, é um dirigente que como poucos reúne enorme experiência política. Recuperou o prestígio da Rússia e tem apoio político interno. Firmou uma sólida aliança com a China.
Serguei Lavrov, o astuto e experiente ministro das Relações Exteriores da Rússia, é de longe o mais competente do mundo na sua função. Quando se compara Lavrov, que é esperto como poucos, com uma mocinha tímida que exerce função semelhante na Alemanha, dá pena. Ninguém no Brasil nem sabe os nomes dos chanceleres da Inglaterra (bem, o governo está assumindo hoje), da França ou da Itália. Nos Estados Unidos, o secretário de Estado também é um zero a esquerda.
A guerra já se arrasta há mais de seis meses e a Europa está cansada dela. Diminuiu as remessas de armas para a Ucrânia e só mantém o apoio aos nacionalistas de Kiev por força da aliança militar com os Estados Unidos na Otan. As sanções impostas pelos americanos acabaram representando um tiro no pé dos europeus, que estão pagando o preço político e econômico de não rachar a Otan. A Rússia joga com o tempo a seu favor.
Nesse contexto, os brasileiros ignoram, mas algumas vozes já começam a surgir a respeito de fissuras no mundo político da Ucrânia, o que pode representar uma luz no fim do túnel em relação ao fim da guerra.
Recentemente, o prefeito de Odessa, no Mar Negro, pediu aos russos que não bombardeassem a cidade e ao mesmo tempo teceu severas críticas à condução da guerra por Zelensky e seu grupo militarista. Nem todo mundo concorda com ela dentro da Ucrânia, onde razoável parte da população é pró-Rússia.
Afinal, são países que têm a mesma origem. Historicamente, a Rússia atual era conhecida como a Grande Rússia e a Ucrânia era a Pequena Rússia, sem contar que durante o período soviético a Ucrânia foi parte importante da antiga URSS. Muitos líderes políticos e militares da era soviética eram de origem ucraniana.
É possível que as lideranças ucranianas estejam procurando um nome em condições de dialogar com os russos. Não seria surpresa caso Zelensky receba uma mala preta cheia de dinheiro, uma carta de agradecimentos pelos serviços prestados e termine os seus dias como dono de um restaurante de comida ucraniana em Miami. Muita riqueza foi destruída em toda a Europa nestes seis meses e para muita gente está na hora de começar a recuperar o que se perdeu.