Alemanha fracassa na energia. Direita cresce
Matéria recente do jornal alemão “Bild” oferece uma reflexão interessante para o resto do planeta, inclusive para o Brasil. Mostra como o planejamento equivocado pode comprometer um país. Afinal, a Alemanha hoje depende necessariamente de eletricidade importada para movimentar a sua poderosa economia.
E o mais contraditório é que a Alemanha de fato fechou todas as suas centrais nucleares e quer dar lições ao resto do mundo sobre práticas de energia verde, mas agora, sem alternativa, fica comprando energia elétrica gerada por centrais nucleares francesas ou então por termelétricas a carvão da República Tcheca. A carvão, por mais incrível que pareça.
É verdade que o país tem investido fortemente em energias renováveis, mas elas não têm sido suficientes para suprir as necessidades energéticas alemãs. Esse é um dado a se estudar, no Brasil, onde existem pessoas que acreditam que podemos dispensar o uso do parque térmico atual, principalmente das usinas a gás natural.
Este site nem mencionou ainda outro gargalo da política energética alemã. Durante anos, o país construiu uma política externa voltada para uma convivência pacífica com a Rússia e isso gerou o aproveitamento dos recursos energéticos baratos russos que chegavam à Alemanha através de gasodutos.
Com a guerra na Ucrânia e o total alinhamento da Alemanha à política imposta pela Otan (leia-se Estados Unidos), os alemães perderam o acesso à energia barata vinda da Rússia e se transformaram nos maiores clientes do GNL produzido nos Estados Unidos, que obviamente chega aos portos alemães por um preço muito mais elevado.
É fácil imaginar como fica a composição de custos de um gás natural extraído no estado da Loisiana, que vira GNL, é colocado num navio especialmente construído para esse tipo de transporte. O navio atravessa o Atlântico, chega num porto alemão e o GNL é regaseificado para distribuição na Alemanha. Haja grana para pagar isso tudo. As petroleiras russas Gazprom e Rosneft foram estatizadas na Alemanha para cuidar desse negócio.
Lá, como cá, quem paga o preço por tudo isso logicamente são os consumidores, na condição de contribuintes, através do Tesouro alemão, que deve estar mais furado do que queijo suíço. Desnecessário ressaltar que, nas próximas eleições alemãs, a questão da energia seguramente vai pegar fogo entre os eleitores. O que já explica, nas pesquisas, a explosão de apoio à extrema direita, representada pelo partido AfD, que é crítico das políticas praticadas pela ineficiente coalizão entre os socialistas e os verdes.
Uma pesquisa recente, comentada pela DW no mês passado, mostra que, com os socialistas em queda e os verdes em desgaste, a preferência dos eleitores continua cada vez mais olhando à direita. Nem todos apoiam a plataforma do AfD, partido fortemente nacionalista, mas os eleitores alemães hoje estão preocupados com as questões de migração (65%), política energética (47%), política externa (25%) e inflação (23%). Tirando o primeiro item, todo o resto está interligado.
Na eleição federal de 2021, os socialistas alcançaram 25,74% das cadeiras no Bundestag, o Parlamento alemão. A coalizão CDU-CSU, que representa a direita clássica, ficou com 24,07% e os verdes, que acabaram montando a coalizão de governo com os socialistas, ganharam 14,75% das cadeiras. Os liberais, um partido muito tradicional da política alemã, tiveram 11,46% e o AfD, que é uma espécie de nova direita, conseguiu apenas 10,34%.
Só que nas últimas pesquisas, turbinado pelos desastres de gestão da atual coalizão de governo, inclusive na área de energia, o AfD está esfregando as mãos de ansiedade em relação à eleição federal prevista para 2025, com base em pesquisas recentes em três estados importantes que terão eleições em 2024 e que poderão ser uma espécie de fiel da balança.
As pesquisas mostram 28% de tendência atual em favor do AfD na Turíngia, 32% na Saxônia e 23% em Brandemburgo (neste caso, um empate com o CDU). Para um partido que teve apenas 10% em 2021 as perspectivas são muito boas. O SPD (socialistas) está descendo a ladeira, do mesmo modo, aliás, que o seu homólogo espanhol, o PSOE. Na Espanha, na próxima eleição, as pesquisas mostram muita força, na próxima eleição, para uma eventual coalizão entre o PP, que é a direita clássica, e o Vox, que é muito parecido com o AfD alemão.
Política energética isoladamente não ganha uma eleição, mas mostra que pode ter muita influência na preferência de quem vota. O PSDB que o diga, pois grande parte da sua derrota histórica, em 2002, com certeza surgiu em consequência dos desastres gerados pelo racionamento de 2001/2002, levando o PT ao Poder.
Quem se der ao trabalho de consultar a página do AfD na internet vai se espantar com o discurso. Bolsonaro perto deles é uma freira franciscana.