Um apagão de sensatez
O ex-senador Alexandre Silveira tem se mostrado um bom ministro de Minas e Energia. Durante os seus 100 primeiros dias de governo, suportou estoicamente a sacanagem aberta feita pelos seus companheiros do partido majoritário da coalizão de governo. Era inacreditável. Dia sim e outro também uns petistas de alto coturno só pensavam em prejudicar Silveira.
Este não acusou ninguém publicamente, ficou de bico calado, sofrendo o pão que o diabo amassou. Sequer podia indicar os seus subalternos.
Os ortodoxos do PT estavam inquietos. Não deixavam o novo ministro em paz, pois sonhavam em colocar os seus próprios companheiros de partido no MME ou então pensavam em, dessa forma, trazer Silveira para a rédea curta. Coisas da política mesquinha, de gente que pensa pequeno.
Mineiro, cuidadoso, Silveira soube dar a volta por cima. E toca o MME, hoje, de uma forma que o “Paranoá Energia” classifica como correta. Não se teve notícia, até agora, que o ministro tenha feito alguma maluquice nestes oito meses de gestão. Mas, nesta terça-feira, 15 de agosto, o ministro Alexandre Silveira deu uma boa escorregada.
Ele até que começou bem o dia. Estava em Assunção, em missão oficial na comitiva do presidente da República. Assim que soube do apagão, pegou um avião imediatamente e voltou para casa, para acompanhar o problema de perto.
Foi uma decisão mais do que certa e sobretudo responsável. Afinal, o ONS indicava uma perda de carga da ordem de 16 mil megawatts, afetando vários estados em todas as regiões do País. Era um senhor apagão, que a própria Aneel classificou como de grande porte.
Mais para o final da tarde, o apagão produziu um pequeno milagre. O ministro, que tinha relutância em conversar com jornalistas de uma forma mais civilizada, entendeu que era um momento diferente e recebeu os profissionais da imprensa, em Brasília, para dar uma entrevista com a dignidade que a mídia merece. Levou oito meses para entender que jornalistas não mordem.
Estava todo mundo sentadinho, no auditório do ministério, perguntando de forma civilizada e o ministro respondendo de forma idem. Até então, o ministro havia optado para falar com a imprensa, em Brasília, ao longo de toda a sua gestão, apenas em horrorosos “quebra queixos”, normalmente ao final de algum evento, todo mundo em pé, aquela confusão, como se Silveira estivesse doido para cair fora rapidamente. Uma espécie de cercadinho do MME.
Ontem, o foco da imprensa na Capital Federal foi obviamente o ministro de Minas e Energia. Todos os veículos de comunicação queriam saber a versão do Governo para os acontecimentos que levaram ao apagão.
A rigor, Silveira não tinha muito o que falar. No momento da entrevista, a carga já havia sido recomposta em praticamente todas as áreas afetadas, faltando talvez uma ou outra localidade no interior.
O ONS pode ser criticado da forma que quiserem (este site mesmo às vezes corneta o Operador), mas o fato que ninguém pode negar é que nessas horas o ONS cresce e sabe o que fazer. É o trabalho dele cuidar da operação do sistema elétrico. E faz isso muito bem. Ele é que tem as informações e dá o comando, simplesmente seguindo os manuais técnicos que se estuda num curso de Engenharia Elétrica. Não é um gabinete na Esplanada dos Ministérios.
Em 1999, no início do segundo Governo FHC, houve um apagão maior do que esse, que praticamente deixou o País às escuras. Foi no início da noite. O então presidente da Eletrobras, que era estatal, estava preso dentro de um elevador. O então ministro de Minas e Energia, Rodolfo Tourinho, que não entendia nada sobre o SEB e estava na Pasta há apenas poucas semanas, compreendeu rapidamente a situação, teve sensibilidade, e foi ao comando do ONS, que funciona no Setor de Indústrias de Brasília. Ficou lá até a situação voltar ao normal.
Tourinho era um tecnocrata. Mas, como todo político, Silveira quis tirar uma beiradinha em cima da opinião pública. E sobre o seu apagão falou o que não precisava. Primeiro, porque o ONS ainda não sabia a razão exata do que havia provocado o apagão. Segundo, porque seria melhor deixar o ONS conduzir o processo. Terceiro, porque, sendo um político, Silveira corria o risco de pisar na bola. E pisou.
Disse algumas barbaridades. Por exemplo: relacionou o apagão à privatização da Eletrobras, o que é totalmente descabido. De onde tirou essa ideia? Não se sabe. Talvez quisesse fazer um agrado a alguém do entorno do presidente Lula, que tem essa convicção prá lá de equivocada.
Fez pior. Possuindo ainda o vício de delegado de polícia do interior de Minas, o que já foi, e nisso não tem qualquer crítica é apenas uma constatação, o ministro enxergou chifre na cabeça de cavalo e insinuou (já tinha feito isso meses atrás, em outro episódio) que poderia ter motivação política no episódio. E afirmou que órgãos policiais do governo federal iam investigar o episódio. Jogou para a plateia.
Isso é grave, até porque, nesta quarta-feira, o ministro da Justiça, que também não perde uma oportunidade para se autopromover, entrou na onda policialesca de Alexandre Silveira. Tudo demagogia.
Quem está no setor elétrico há mais tempo, sabe perfeitamente que essas coisas acontecem de vez em quando. Aqui e em outros países, como Estados Unidos ou Japão, que possuem sistemas elétricos sólidos e bem administrados.
E quem está na política sabe que não existe qualquer mobilização, em qualquer estado, para fazer um estrago como este de terça-feira. Não é um ex-presidente aloprado, que se mostra totalmente perdido desde que perdeu a oportunidade da reeleição, que vai mobilizar alguns jagunços para sair por aí tirando 16 mil megawatts da carga do setor elétrico.
Este site evita entrar em considerações políticas (outros veículos de comunicação fazem isto com mais competência), mas seria interessante que o Governo Federal acordasse para o fato que a eleição passou há muito tempo e que já não estamos em campanha.
Agora é hora simplesmente de governar com competência. E parar de fazer uso político de situações que são apenas técnicas e que não dizem respeito à política ou à polícia.
Houve um apagão no setor elétrico, tudo bem, vamos buscar as causas, aprimorar os processos e evitar que ocorra novamente. É assim que se faz . Não se resolve esse tipo de problema simplesmente manipulando a opinião pública.