Aneel e Enel. Rima sem solução
Aneel e Enel. É uma rima, mas não tem sido uma solução.
O que mais impressiona na lambança que é o atendimento aos consumidores pela concessionária Enel, em São Paulo, não é a falta de jeito da empresa italiana para o negócio. Ela já saiu correndo de Goiás e o serviço de distribuição no Rio é outra calamidade. Já é velha conhecida.
Na realidade, o que chama a atenção é o extraordinário e inexplicável silêncio da Agência Nacional de Energia Elétrica. Simplesmente não fala nada, não faz nada. Ninguém vem a público para tratar do assunto de forma direta, sem as voltas diplomáticas que a Aneel sempre dá, como se tivesse medo de ofender alguém.
Cada um tem um estilo. Na visão deste site, já está passando da hora de alguém da Aneel botar a cara na frente da TV e dizer em bom português: “Chega, Enel, vocês estão fora do negócio. Boa viagem de volta para Roma”.
Ora, a missão da Aneel é clara: “proporcionar condições favoráveis para que o mercado de energia elétrica se desenvolva com equilíbrio entre os agentes e em benefício da sociedade”. O propósito também é claro: “garantir o fornecimento de energia elétrica a todos os consumidores”.
Bem, não é exatamente o que vem acontecendo na área de concessão da Enel, em São Paulo, cujos consumidores não conhecem outra coisa a não ser o estresse decorrente da falta de energia. E o que faz a nossa agência reguladora? Por enquanto, nada. É como se o problema sequer existisse. Semanas atrás, aplicou uma multa, uma boa multa, mas não deu mais o ar da graça, como se multas resolvessem alguma coisa neste nosso grande e maravilhoso País. Existem “N” condições recursais e esses concessionários raramente pagam alguma coisa.
O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, já se posicionou. Quando o capítulo atual das atrapalhadas da Enel começou (esse troço vem rolando hás muito tempo, como se fosse uma novela), ele soltou logo um comunicado, dizendo que a concessionária não tem mais condições de operar. E a diretoria da Aneel? O que fez? Curiosamente nada.
Os diretores da Aneel são boas pessoas, agradáveis, qualificadas e responsáveis. Têm seus mandatos garantidos por lei, o que é algo muito positivo. Mas, neste caso específico da Aneel, mostram uma atitude passiva muito estranha, como se esperassem alguma força cósmica, vinda dos cantões do Universo, que vai resolver o problema da Enel em São Paulo. Não vai acontecer isso. A empresa está totalmente desmoralizada e ninguém acredita mais nela. A cada dia pipoca um problema em algum lugar da maior cidade do País.
É possível que a diretoria da Aneel não tenha feito nada porque seus diretores, nas últimas semanas, têm tido uma ampla agenda internacional e ficaram distantes dos temas locais. Compreensível.
A agenda do diretor-geral da Aneel, Sandoval Feitosa, mostra que, de 25 de fevereiro a 06 de março, ele estava participando de um evento chamado “Distributech International 2024”, nos Estados Unidos.
O diretor Fernando Mosna, segundo a agenda, foi à Índia, entre 12 e 16 de março, para o “India Smart Utility Week 2024”. Viagem curta. Talvez tenha apenas feito uma conferência.
Seu colega de diretoria Ricardo Tili também fez uso do passaporte, mas foi à sempre agradável Barcelona, para o “Mobile World Congress 2024”, entre 25 de fevereiro de 1º de março. Foi um evento sobre conectividade, não sobre energia elétrica, embora haja uma ligação. Engana-se quem acha que Tili ficou apenas passeando nas Ramblas ou conhecendo a arquitetura de Antoni Gaudi. Nada disso. Trabalhou duro.
Dos cinco diretores da agência reguladora, apenas dois (Hélvio Guerra e Agnes da Costa) não foram agregar novos conhecimentos no exterior. Ficaram por aqui mesmo, ralando em muitas reuniões, conforme mostram suas agendas. Posssivelmente foram “escalados” para tomar conta da casa, enquanto os demais diretores estavam fora do País.
Enquanto os diretores da Aneel estão lá fora, trabalhando exaustivamente nesses eventos e sofrendo horrores com as diferenças de fuso horário, distância das famílias, estresse de vôos, etc, os consumidores de São Paulo estão sofrendo com a tal da Enel. É apenas mero detalhe.
Alguns consumidores de São Paulo têm ligado para o site Paranoá Energia, manifestando o seu descontentamento e amargura. O quadro, aliás, não poderia ser outro. Todos eles acabam numa mesma pergunta: por que as autoridades (MME e Aneel) não fazem nada e deixam os consumidores sofrerem desse jeito? O site não tem resposta.
Um desses tristes consumidores disse para o Paranoá Energia que consultou advogados e que a Aneel, tem, sim, condições para dar uma satisfação à plebe rude. Segundo essa pessoa foi informada por um advogado, a agência reguladora só não pode fazer chover em São Paulo.
Mas pode aplicar um caminhão de penalidades à concessionária Enel pelo fato de não estar cumprindo a finalidade básica contratual, que é atender bem aos consumidores de São Paulo.
Isso passa por multas pesadas proporcionais à Receita Operacional Líquida e advertências, mas vai muito mais além, como embargar obras, impedimento de participar em eventuais licitações, etc. A Aneel também pode fazer o contrato de concessão simplesmente caducar.
Essa é uma questão muito relevante na situação atual da Enel em São Paulo. Bastaria à Aneel provar que a Enel perdeu a capacidade de operar e ponto final. Fácil de fazer. Seria decretada a intervenção na concessionária, para garantir que a população (bem ou mal) continue a ser atendida. Haveria um interventor indicado pelo Poder Concedente (o Governo Federal) e a vida seguiria em frente, com escolha de outro concessionário, meses depois, dentro do processo legal.
Essa “contribuição” de um simples consumidor mostra várias coisas: primeiro, as pessoas estão percebendo a inexplicável atitude da Aneel frente ao problema; segundo, que os consumidores querem definições imediatas e estão cheios de blá-blá-blá; e terceiro, que há opções na mesa, que não são tomadas sabe-se lá porque.
Este site não quer colocar ninguém no paredón, mas também não quer ficar neutro nessa história, em respeito aos consumidores/leitores que pedem explicações pelo telefone. O jornalismo, nestes casos, pode fazer pouco, mas pode expor as questões. E o Paranoá Energia não se nega a fazê-lo.