A bola está com Sandoval
Este site conversou reservadamente com especialistas qualificados da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e, entre eles, existe a firme convicção que o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, e o próprio diretor-geral Sandoval Feitosa ainda não entenderam direito o jogo que está sendo jogado.
Está claro que, por alguma razão, o ministro e o governo em geral têm tomado atitudes hostis em relação à agência reguladora. Sucessivas vezes, Silveira tem humilhado a agência reguladora do setor elétrico, o que causa muito desconforto ao corpo técnico da Aneel.
No dia 1º de abril, o ministro convocou a diretoria da agência ao seu gabinete, passou um carão em todo mundo, e entregou uma carta, na qual solicitava uma investigação especial sobre a concessionária Enel de São Paulo, sendo que ao fim poderia até perder a concessão. A agência nunca se manifestou sobre o assunto. Simplesmente sentou em cima do assunto.
Em meados de junho, aconteceu aquilo que foi uma verdadeira ofensa do ponto de vista institucional. O presidente da República e o seu ministro de Minas e Energia receberam a diretoria da Enel, na Itália, quando tomaram um cafezinho e aparentemente esqueceram que o próprio ministro havia pedido o enquadradamento da empresa italiana. Não cabe à autoridade do Poder Executivo esse tipo de conversa. É assunto técnico, da órbita da agência reguladora.
Agora, o mundo do setor elétrico é novamente surpreendido com a divulgação de uma carta em que o ministro cobra a agência por algumas decisões. Sua Excelência fala grosso, ameaça a Aneel com intervenção por causa disso e a carta surpreendentemente é vazada, no melhor estilo Silveira. Jornalistas sabem que a parte ofendida jamais vaza nada, pois é tiro no pé. Então, o vazamento se deu no MME.
Dentro da Aneel, existem aqueles que já concluíram que o ministro Alexandre Silveira pode entender de política em Minas Gerais, mas, além de não entender patavina sobre o setor elétrico, também mete os pés pelas mãos quando se trata do relacionamento institucional com os órgãos vinculados como a Aneel. Essas fontes também entendem que o ministro não tem boa memória.
O raciocínio é simples e cristalino. A Enel não mudou nada e a qualidade do seu serviço continua a mesma. Há dois dias, inclusive, a empresa italiana recebeu uma multa, no Ceará, de R$ 28,5 milhões. Não é o problema de São Paulo, pois é outra área de concessão, mas é algo similar: multada por péssima qualidade do serviço oferecido aos consumidores.
A Agência Reguladora do Estado do Ceará (Arce) tacou essa bela multa sem piedade à Enel cearense, devido aos apagões constantes em vários municípios. A Enel não tem o costume de pagar as multas e prefere judicializar. É um direito da empresa, mas demonstra a sua estratégia de ação.
Dentro da Aneel, alguns técnicos não entendem bem o que está acontecendo e criticam reservadamente o comportamento do diretor-geral da agência, Sandoval Feitosa, que apanha direto do MME e não faz absolutamente nada.
Essas fontes acreditam que Sandoval não precisa brigar com o ministro através da imprensa, mas, nesse contexto de conflito, bastaria à Aneel aplicar um mata-leão no ministro de Minas e Energia e no próprio governo, respondendo ao seu ofício de 1º de abril e dizendo apenas que, sim, a Enel São Paulo não tem salvação e o jeito é a empresa perder a sua concessão.
Este site não torce pelo quanto pior, melhor, mas concorda que a decisão de responder ao ministro dessa forma seria uma atitude que o deixaria politicamente em péssima situação.
Imaginem: o Poder Executivo quer resolver de outro jeito a situação da Enel no Brasil. Aí, vem a agência reguladora do setor elétrico e diz o seguinte: por isto e aquilo, é uma empresa que não tem idoneidade e, atendendo ao ofício tal do ministro de Minas e Energia, a agência concorda com o fim da concessão.
De fato, o ministro acenou com a perda da caducidade, só que depois, para a sua própria surpresa, a situação mudou, na famosa reunião da Itália, em que o presidente Lula atropelou não só a Aneel, mas, também, o seu ministro. Sabe-se lá o que foi conversado entre Lula, diretores da Enel e Silveira, mas, qualquer que tenha sido a conclusão do encontro, certamente não foi na linha da caducidade da concessão. Não é o estilo Lula. O presidente é chegado a um entendimento, a uma negociação entre as partes, algo herdado das lutas sindicais.
Ou seja, gente próxima de Sandoval entende que a bola está com a Aneel e a agência — que não é governo, mas, sim, um órgão do Estado — não estaria sabendo jogar, apanhando desnecessariamente de um ministro que não sabe se relacionar com os órgãos vinculados ao seu ministério. Aliás, não é privilégio da Aneel. Basta olhar para as indicações feitas na CCEE e ONS, onde Sua Excelência também meteu os pés pelas mãos.
A situação está desse jeito no relacionamento entre a Aneel e o MME, de vaca não reconhecer bezerro. Só que, nesse raciocínio, a bola está com o diretor Sandoval, que, por alguma razão, não quer chutar.