Enel em SP: kaputt
A palavra “kaputt” no título, em alemão, significa quebrado, destruído, estragado. Algo nesse sentido. Também é o título de um dos mais extraordinários livros escritos no pós-guerra, do italiano Curzio Malaparte. Tem edição brasileira. Quem quiser ler, não perderá tempo. Excelente livro. “Kaputt” é como se poderia sintetizar a gestão da Enel, em São Paulo.
As perguntas abaixo, com uma outra variação, têm sido feitas, nos últimos dias, ao editor do site “Paranoá Energia”:
1. Você tem alguma coisa contra a Itália ou os italianos (a propósito das críticas à Enel, que é uma estatal italiana)?
Resposta: Nada contra a Itália ou os italianos. Acho-os às vezes superlativos, mas bem humorados. Gente boa. Sou de uma família parcialmente com origem no Norte da Itália. Aprecio a cultura italiana e conheço bem o País, no qual já estive algumas vezes. Já falei italiano com razoável fluência, mas perdi o contato com a língua, embora ainda entenda 80% do que se fala num telejornal em língua italiana ou na narrativa de um jogo da Lega Calcio.Tenho duas filhas ítalo-brasileiras e um neto, que ainda é apenas um bebê, mas provavelmente tem direito à nacionalidade italiana. Não conheço as leis de nacionalidade da Itália.
2. Você tem alguma coisa contra o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira?
Resposta: A minha opinião não importa muito, pois sou apenas o editor de um site muito pequeno, sem expressão política. Acho o Alexandre Silveira um ministro como outro qualquer, até um pouco mais esperto (no sentido da agilidade mental). Pessoalmente, não tenho nada contra o ministro. Como já sou um jornalista idoso e raramente saio do meu bairro, prefiro trabalhar pela internet e pelo celular. Se o ministro parar na minha frente, ele não saberá que sou eu, pois nunca nos encontramos. Há anos não coloco os pés no Ministério de Minas e Energia, pois considero um insulto aos jornalistas as restrições que hoje são impostas aos profissionais da mídia que trabalham na Esplanada dos Ministérios. Entrar no edifício é a maior dificuldade. São controles desrespeitosos e absurdos. Como basicamente trabalho com fontes, então a minha ida ao MME não é necessária. Entretanto, é bom deixar claro que não acho muita graça no ministro, não como pessoa, mas como executivo do governo. É um político e tenho alguma desconfiança de políticos. Não dou bola para eles. São egoístas e oportunistas, o que revela um certo desprezo. O titular do MME é inegavelmente mais político do que qualquer outra coisa. É um direito dele. O presidente Lula aparentemente gosta, mas eu preferia que o MME estivesse nas mãos de quem faz menos política e pensa mais nos aspectos técnicos da Pasta, sobre os quais Silveira entende pouco e a sua equipe técnica não ajuda muito, pois ele não soube escolher e optou por várias pessoas em postos-chave que não entendem nada da área. O site discorda de Silveira em quase tudo, mas, neste caso da Aneel, é meio estranho, mas há uma convergência de opiniões. O ministro e este editor acham que a Aneel poderia ter feito melhor e não o fez.
3. Por que você ataca tanto a Aneel e acha que ela também é responsável pelo fracasso da gestão da Enel em São Paulo?
Resposta: Tenho vários amigos na Aneel. Alguns praticamente cresceram dentro da agência reguladora. Na média, é um pessoal sério, preparado, disciplinado e entusiasmado, incluindo os integrantes da diretoria. Isso não significa que eu não possa discordar deles. De vez em quando, alguém da Aneel me liga reclamando de alguma coisa, em off, porém o meu jogo é aberto. O que penso está escrito aqui no site, como estas perguntas e respostas. Há muito tempo, está claro para mim que alguma força misteriosa protege a Enel de São Paulo. Não sei o que possa ser essa força estranha, mas que existe, existe. Todo mundo dentro da Aneel sabe que a gestão da Enel na cidade mais rica do Brasil é uma bosta, mas a empresa continua lá, dando as cartas. A Aneel não faz absolutamente nada. Ontem, timidamente, ameaçou a Enel de assinar um papel para que os italianos percam a concessão. Mas quem lê a nota da Aneel percebe que a agência tem medo de dar um passo à frente.
A nota diz: “…a diretoria da Aneel solicitou que a área de fiscalização intime imediatamente a empresa para apresentar justificativas e proposta de adequação imediata do serviço diante das ocorrências registradas ontem e hoje, de falha na prestação do serviço de distribuição. Como parte do processo de intimação, a proposta será avaliada pela diretoria colegiada da ANEEL e caso a empresa não apresente solução satisfatória e imediata da prestação do serviço, a Agência instaurará processo de recomendação da caducidade da concessão junto ao MME”.
Aneel, me desculpe. Se a área de fiscalização ainda não tem todas as informações que a diretoria quer sobre a Enel, o diretor ou a diretora de Fiscalização já deveriam ter sido demitidos há muito tempo. Então, a diretoria pede à Fiscalização, só agora, que peça uma proposta à Enel, que vai avaliar essa proposta e só depois vai dizer se encaminha ou não a recomendação para que a Enel perca a concessão? Desculpem, diretores da Aneel, mas os senhores estão delirando. Se alguém da Aneel ler essa nota na frente de um prédio de 12 andares no centro velho de São Paulo, que está sem luz desde sexta-feira e onde tem alguém hipertenso que precisa subir 12 andares a pé porque o elevador não funciona, esse alguém da Aneel que ler a nota na portaria vai levar porrada na certa. Também vai levar porrada, se ler a mesma nota na frente de um açougue, onde o proprietário, por falta de energia, perdeu toda a carne estocada. Vai levar porrada se ler a nota para um proprietário de um restaurante a kg, que, hoje, domingo, está fechado, pois perdeu toda a comida refrigerada no estoque. Desculpe novamente, Aneel, mas essa nota é um escárnio. Ninguém em São Paulo suporta mais ouvir falar a palavra Enel e vocês têm responsabilidade nisso. Vocês têm é medo de indicar a perda da caducidade da Enel, pois motivos não faltam, há meses. Vocês aplicaram algumas multas à Enel, ficaram no feijão com arroz. O que ela pagou? Provavelmente nem a metade. Se a Enel hipoteticamente fosse um empreendedor de uma pequena central hidrelétrica do interior de Goiás e o negócio não estivesse em conformidade com alguma coisa escrita no projeto, vocês entrariam matando a pau. Multa, perda da autorização, o cacete. Porque contra os pequenos vocês sabem falar grosso, mas contra os poderosos, como a Enel, vocês afinam. Como é a Enel, você não fazem nada e têm medo de punir. Chega de enrolação, Aneel. Vocês não percebem que a Enel, há meses, perdeu as motivações institucionais para operar e está sem rumo? E vocês, por medo, também foram pelo mesmo turbilhão abaixo, se perderam e também ficaram sem rumo?. Não sabem o que fazer. Estão tão perdidos quanto os italianos. Essa nota burocrática de ontem é tão vergonhosa, que todo mundo deveria pegar o boné e puxar o carro: Enel e Aneel. Como este site já escreveu uma vez, no título do editorial de 22 de março deste ano, Enel e Aneel é uma rima sem solução.